Johnny Hooker encerra turnê em BH com show performático e político, mas com amor

Cantor pernambucano diz a que veio e critica a pretensão dos que querem 'dar respostas simples para coisas muito complexas'

por Redação EM Cultura 12/01/2017 09:00

LEANDRO COURI/EM/D.A.PRESS
Para Hooker, show na Virada Cultural de BH foi um dos mais marcantes da turnê. (foto: LEANDRO COURI/EM/D.A.PRESS)

Indiferente ao receio popular em torno de uma sexta-feira 13, o cantor e compositor pernambucano Johnny Hooker enxerga a data pelo prisma da cabala, como um ''fechamento de ciclo''. O ciclo em questão é a turnê do disco Eu vou fazer uma macumba pra te amarrar, maldito!, lançado em 2015, que agora tem seu ato final.

''Para as últimas apresentações dessa turnê, escolhemos as cidades em que os shows foram mais emocionantes'', diz o cantor de 29 anos, que está há um ano e meio na estrada com o show. Foram duas passagens de Macumba por Belo Horizonte – uma delas durante a Virada Cultural de 2016, que ele classifica como “marcante”. “É um público pelo qual tenho muito respeito e carinho, e a troca é sempre intensa.”

No palco não haverá novidades. O show percorre o repertório do disco, incluindo os principais sucessos da carreira de Hooker, como Volta, Amor marginal, Segunda chance e Alma sebosa, em performance teatral marcada por danças e interações com o público, que costuma ter as letras das músicas na ponta da língua. “O show é como uma peça. Ele conta uma história. Está de acordo com a narrativa do próprio álbum”, cujo início é marcado pelo desespero e segue uma odisseia de superação para terminar em carnaval.

As referências de Johnny Hooker, um apaixonado por cultura popular, serão destiladas durante a apresentação. De Ney Matogrosso a Reginaldo Rossi, passando por Michelle Melo e Cazuza, essa mistura é sintetizada por frevo, samba, rock e brega de ''cabaré-beira-de-estrada''. “Brega para mim é uma cultura pop. A minha música tem algo de bolero ou brega, mas a minha estética é pop. Em 2016, 5 milhões de pessoas ouviram minhas músicas no Spotify. Isso para mim são números de música pop. Não cabe mais dizer que é alternativo, que atende ao gosto de um determinado estrato social, da galera de humanas'', afirma, comparando sua estética com as cantoras sertanejas que bombaram em 2016.

Suas canções poderiam, facilmente, figurar na cena cantada por Maiara & Maraisa na música 10%. Sua relação com a música sertaneja, inclusive, ficou mais estreita no ano passado. Além de ter se apaixonado pelas ''divas'' do sertanejo, Johnny regravou a canção Pense em mim — originalmente na voz da dupla Leandro & Leonardo — para a trilha sonora da minissérie Justiça, da Rede Globo, que ganhou uma interpretação burlesca.



PERFORMANCE

O show, além de performático, mobiliza públicos diversos, mas concentra os LGBT, que se veem espelhados em um artista de notoriedade nacional e foi um dos precursores dessa leva de cantores que trabalham com a androginia e a fluidez de gênero dentro e fora dos palcos, como Liniker, Jaloo, Felipe Catto e até mesmo Karol Conka. No entanto, Johnny esclarece que a questão é muito maior do que um homem usando batom diante de um público apaixonado. ''Essa questão do gênero, ou do não gênero, é ultramarquetizada. A mídia pega isso e estabelece uma série de padrões para um discurso que está lutando contra isso'', pondera. ''A geração de agora é mais livre em relação ao gênero. As pessoas estão se permitindo provocar. E, além do mais, a questão é muito maior do que ter ou não ter gênero, homem ou mulher''. E, evocando o inclassificável Tom Zé, declara: ''Eu não estou aqui para explicar, estou aqui para confundir. Na minha arte, acho muito mais interessante provocar, e não explicar''.

Hooker avalia que o Brasil e o mundo vivem uma onda conservadora ''caretérrima''. ''São tempos ultrapolitizados e polarizados. As pessoas querem respostas simples, sim ou não. As coisas são muito mais elaboradas que isso'', diz. Porém, como artista, ele defende que nem todas as questões precisam de respostas. O importante é incomodar, constranger. ''Na arte, para mim, as respostas não são tão simples. Essa ascensão do fascismo, dos radicalismos, do liberalismo de direita, essas ideologias oferecem respostas muito simples para coisas muito complexas.'' Como bom rebelde, ele acredita que a resposta está, sim, à esquerda. ''Vejo a esquerda oferecendo respostas complexas, à altura das questões. O outro lado idiotiza as massas. Às vezes, o que oferece respostas simples para perguntas complexas não está mais próximo da verdade ou de uma saída inteligente.''

 

A partir disso entende-se o porquê da miscelânea artística que é Johnny Hooker. Ele poupa esforços para ser polêmico e sabe de sua importância, usando sua posição e visibilidade para dar destaque a questões políticas, sem perder a ternura. ''A minha música faz resistência a um certo tipo de pensamento, mas é uma resistência afetiva. Algo que conversa muito com 'Amar sem Temer'. Isso tudo usa a política com amor.''

 

E a luta continua! A turnê de despedida de Macumba segue até março, nas principais capitais do país. Depois disso, Hooker pretende lançar o DVD do show, gravado em Recife. Ainda em 2017, os fãs serão agraciados com o lançamento do segundo disco de estúdio do cantor, sob o nome provisório de Corpo fechado. “Este próximo álbum vai ser mais caloroso, mais dramático, mais tropical, dançante, afetivo. Como uma colagem de memórias. É como se ver em um espelho estilhaçado e ir juntando os seus pedaços. É um coração aberto, bem latino.'' O resultado, diz o cantor, será uma mistura da calmaria de Carnaval transcendental, de Caetano Veloso, com o soul de David Bowie em Young americans.

A FESTA CONTINUA
O show de Johnny Hooker será dentro da festa Divina Maravilhosa, que escala artistas que dialogam com a temática de gênero e diversidade. A badalação continua com o show da banda Madimboo, formada por Artur Dantas (vocal e programações), Felipe Rodrigues (guitarra) e Tiago Duarte (bateria), integrantes da banda base de Hooker. Com um EP na bagagem, a banda faz um ''eletrônico tropical, na tentativa de trazer o calor do Recife em vários recortes, algo bem dadaísta'', comenta o cantor. A noite vai ser encerrada pelos DJs Confusa e Prima, integrantes do coletivo Toda Deseo.


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