Geddel estudou com Renato Russo e era chamado de 'suíno' pelos colegas

Fato está registrado em 'O filho da revolução', biografia do cantor que ganhou reedição este ano; livro conta que Russo chegou a vetar a participação do político em trabalho de grupo

por Estado de Minas 21/11/2016 16:52
Uma curiosidade na biografia do ministro Geddel Vieira Lima: na adolescência, ele foi colega de sala de aula de ninguém menos que Renato Russo. Muito antes, claro, de o vocalista da Legião Urbana ficar conhecido nacionalmente. Os dois estudaram em uma mesma escola particular de Brasília, o colégio Marista, na Asa Sul, na primeira metade dos anos 1970. O fato foi revelado na biografia Renato Russo – O filho da revolução, lançada em 2009 pela Agir e que ganhou mês passado uma nova edição, revista e ampliada, da Editora Planeta. O autor da biografia, o jornalista Carlos Marcelo, é o atual diretor de redação do Estado de Minas. No trecho, incluído no segundo capítulo da biografia, fica evidente que eles não chegavam a ser amigos e havia uma certa animosidade da parte de Renato, filho de um funcionário graduado do Banco do Brasil, em relação a Geddel, filho de um político baiano. Renato inclusive chegou a vetar a participação do futuro ministro em um trabalho de grupo. Confira, abaixo, o trecho de “Renato Russo – o filho da revolução” que cita o encontro dos adolescentes Geddel Vieira Lima e Renato Manfredini Junior.

Confira:

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A turma do Colégio Marista tem que preparar apresentação relacionada à música. De imediato, Renato avisa:

— O tema do meu grupo vai ser a história do rock.

Rigoroso na hora de selecionar os colegas de grupo, ele convida Maria Inês Serra e mais dois ou três felizardos que se mostraram dispostos a executar a tarefa como ele planejaria. Tinha gostado de trabalhar com Inês em uma pesquisa sobre cantigas de roda — o esforço alheio representava fator decisivo para a escolha. Deixa claro (a ponto de despertar antipatia e criar fama de chato) que não carregaria ninguém nas costas. Apesar dos pedidos de colegas como Geddel Quadros Vieira Lima para entrar no seu grupo pela garantia de notas altas na avaliação final. Filho do político baiano Afrísio Vieira Lima, o gordinho Geddel era um dos palhaços da turma. Chegava no colégio dirigindo um Opala verde, o que despertava atenção das meninas e a inveja dos meninos — que davam o troco chamando-o de “Suíno”. Tinha sempre uma piada na ponta da língua; as matérias, nem sempre.

— Eu vou ser político!

O jeitão expansivo garantia popularidade entre os colegas, mas não unanimidade. “Ele é in-su-por-tá-vel!”, justifica Renato para Maria Inês, dividindo as sílabas de forma enfática, ao sentenciar a proibição da entrada de Geddel em seu grupo.
A preparação do trabalho consome semanas. A pesquisa, concentrada no acervo guardado por Renato em seu quarto, inclui o detalhamento de aspectos controversos da biografia de ídolos do rock. Ao estudar a trágica trajetória de Janis Joplin e Jimi Hendrix, Renato comenta com Inês:

— Como é que pode alguém se drogar para fazer música?

As tardes de pesquisa, porém, não resultam apenas em fonte de inquietação sobre os destinos erráticos das estrelas do rock. Na parte mais divertida da preparação do trabalho, Inês observa o amigo escolher um disco, colocá-lo na vitrola e iniciar o show particular. Renato canta junto, faz solos imaginários de guitarra, dedilha violão, imita os artistas que se revezam no toca-discos. Reproduz o falsete de Elton John. “And I think it’s gonna be a long, long time...”, dubla o refrão de “Rocket Man”, do cantor e pianista inglês. Também capricha no tom grave da voz para imitar Elvis Presley — sem êxito. A amiga achou que estava escutando Jerry Adriani.

Mesmo sem a parte da dublagem, estrategicamente esquecida na 303 Sul, Renato e Inês recebem nota máxima pelo trabalho. Mais: são convidados a bisar a apresentação, dessa vez no auditório do Marista, diante de alunos de outras turmas do segundo grau. Além da explanação verbal, proporcionam aos colegas uma experiência audiovisual. Coladas em cartolinas, fotografias de ídolos do rock (selecionadas do acervo particular do líder do grupo) são exibidas enquanto o auditório é sacudido por trechos de clássicos do gênero, cuidadosamente pinçados e gravados em fitas cassete. Para aumentar a dramaticidade, Renato faz questão de resumir em frases de efeito, pronunciadas em tom incisivo, os pontos-chave das ideias defendidas no trabalho. Terminada a apresentação, começa o debate. Uma das colegas critica o rock e defende a MPB como porta-voz dos anseios da juventude brasileira. Diante do auditório lotado, Renato rebate:

— O rock é um movimento musical que revolucionou a música popular porque é o único gênero feito por jovens e para os jovens. Por isso, se tornou sinônimo de rebeldia.

Aplausos dos colegas e dos professores. Graças à convicção e ao conhecimento de rock, Renato passa com louvor no primeiro teste de popularidade diante de uma audiência imprevisível.


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Trecho de “Renato Russo- O filho da Revolução” (Planeta), de Carlos Marcelo  

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