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De volta ao Brasil holandês

Lenine lança o DVD 'The bridge: Lenine & Martin Fondse live at Bimhuis'

Projeto com o maestro de Amsterdã, que rearranjou os sucessos do pernambucano, durou três anos

Larissa Lins
O brasileiro Lenine se juntou a Martin Fondse Orchestra para reinventar suas composições - Foto: Arlindo Camacho/divulgação

Aos cantores de baladas populares que se apresentam acompanhados de orquestra se atribui, muitas vezes, o epíteto de crooner. É assim que Lenine se refere a si mesmo, como um crooner, diante do projeto The bridge: Lenine & Martin Fondse live at Bimhuis, que será lançado em CD e DVD este mês pela Coqueiro Verde. O pernambucano não quer protagonismo, mas reinvenção. No repertório do álbum, gravado na Holanda, ele dá nova vida às antigas canções Paciência, Leão do Norte, Jack soul brasileiro e Hoje eu quero sair só. Transforma, ainda, faixas do último disco autoral, Carbono (2015). Dá às próprias letras sonoridade diferente e, nelas, se refaz.

The bridge sintetiza, sob direção de Flora Pimentel e Gustavo Tolhuizen, três anos da trajetória partilhada entre o músico pernambucano e o maestro holandês. É ponte. “Para onde ela leva não interessa muito, contanto que ligue alguma coisa a outra.
O melhor de tudo é saber que o que faço pode ter função de ponte. De comunicação, de consonância, de coletivo. Saber que, independentemente do lugar onde estou e de onde vim, a música que faço dialoga com qualquer parte do planeta. Essa é a ponte mais bacana”, diz Lenine.

Cumprida a missão de aproximar dois pontos distintos no globo, a coprodução do Canal Brasil e do selo de Lenine, Casa 9, não anuncia, necessariamente, uma nova turnê. Ela materializa as experiências vividas pela dupla – acompanhada da Martin Fondse Orchestra – em shows no Brasil, Holanda, Áustria, Alemanha, Portugal e nos Estados Unidos.

CALDO Apresentados pelo produtor cultural Wim Westerveld, diretor do festival holandês Music Meeting, Lenine e Martin precisaram de modestos 15 minutos para decidir que trabalhariam juntos. Dos três anos seguintes sobre os palcos, extraíram The bridge. “Wim previu tudo isso, de alguma forma. Ele falou para Martin que nosso encontro daria um caldo, por assim dizer. E temos um débito eterno para com ele”, lembra o compositor. À vontade com a parceria, estimulado pelo desejo pungente de se reinventar, Lenine deixou a cargo de Martin todos os arranjos. “Divirta-se, Martin. Faça para você se divertir. Que eu me divirto também” – foi como o brasileiro depositou suas canções sob as batutas do maestro holandês.
E ele as revigorou.

The bridge: Lenine & Martin Fondse live at Bimhuis não tem previsão de shows. É fim, não princípio. “Esse projeto nasce com a função de tornar físico algo que já existe, que já existiu. Esse não é o início de uma turnê. Isso o difere, em muitos aspectos, de todos os processos que normalmente envolvem a gravação de um CD ou DVD”, explica Lenine, satisfeito com a compilação das próprias memórias no Velho Continente. Os barcos, estúdios, palcos e sons europeus. Sobretudo, sua fusão com a bagagem brasileira do cantor.

Repertório
» 1. Abertura: Maurício de Nassau Bridge (Martin Fondse)
» 2. A ponte (Lenine e Lula Queiroga)
» 3. A rede (Lenine e Lula Queiroga); Eendracht Bridge (Martin Fondse)
» 4.
Chão (Lenine e Lula Queiroga); Loopbrug Bridge (Martin Fondse)
» 5. O universo na cabeça do alfinete (Lenine e Lula Queiroga)
» 6. O dia em que faremos contato (Lenine e Bráulio Tavares); Ravelin Bridge (Martin Fondse)
» 7. Paciência (Lenine e Dudu Falcão); Rio-Niterói Bridge (Martin Fondse)
» 8. Hoje eu quero sair só (Lenine, Mu Chebabi e Caxa Aragão); Iran Foot Bridge (Martin Fondse)
» 9. Miragem do porto (Lenine e Bráulio Tavares)
» 10. Relampiano (Lenine e Paulinho Moska); Tyne Bridge (Martin Fondse)
» 11. A causa e o pó (Lenine e João Cavalcanti)
» 12. Martelo bigorna (Lenine); Golden Gate Bridge (Martin Fondse)
» 13. Rosebud – O verbo e a verba (Lenine e Lula Queiroga)
» 14. Leão do Norte (Lenine e Paulo César Pinheiro)
» 15. O silêncio das estrelas (Lenine e Dudu Falcão); Stargate Bridge (Martin Fondse)
» 16. Jack soul brasileiro (Lenine); Vecchio Bridge (Martin Fondse)
» 17. Do it (Lenine e Ivan Santos); Rock Bridge (Martin Fondse)

>> O ESTÚDIO
“O Bimhuis, templo do jazz. Quando a gente estava começando a parceria e íamos tocar no Music Meeting, realizamos encontros e ensaios em Amsterdã. E Martin, de maneira muito bacana, generosa e parceira, me apresentou à cidade por um viés diferente, de barco. Então, conheci Amsterdã pelos canais, andando de barco com ele. Passamos junto do Bimhuis, próximos ao estúdio, e ele disse: ‘Ainda vamos tocar juntos aqui’. Então ele, de alguma maneira, previu isso aí. E foi bacana termos podido tocar lá, termos capturado o concerto e tornado material o nosso encontro, justamente nessa casa que ele idealizou para tocar comigo.”

>> A TRANSFORMAÇÃO
“A cada projeto que a gente faz, a gente retorna diferente para si mesmo. E tudo em que você toca lhe toca também. Então, cada novo projeto o estimula a pensar diferente, a se por em outros lugares, a se jogar. E, sobretudo, a busca toda é por aqueles momentos num concerto em que você está ali, pleno, e tudo acontece, você toca todo mundo, toca a alma de todo mundo. Estamos todos perseguindo isso. Nem sempre acontece. Mas essa é a busca. É por isso que faço tantos projetos, por isso que estou sempre querendo conhecer músicos novos, testar coisas novas, novas formas, novos caminhos.”

>> OS MÚSICOS
“Eu é que fui o escolhido, eu fui crooner da orquestra. A orquestra já existe há muito tempo, tem uma autoralidade por causa do Martin Fondse. E por isso é a Martin Fondse Orchestra. E esse ambiente sonoro que o Martin tem à disposição dele é muito bacana. São dois violinos, um cello e um contrabaixo, uma bateria. E um naipe muito interessante de sopros, mas que abrange muitos outros instrumentos. Além dele, como pianista, que ainda toca outras coisas. Tem um relevo sonoro muito característico dele. Toda a equação de descobrir repertório, tudo era em função dessa assinatura sonora que a Martin Fondse Orchestra tem. Só entrei ali com as canções. E disposto a me jogar naquele conceito musical. E foi isso que aconteceu.”

>> OS ARRANJOS
“Os diversos arranjos couberam todos ao Martin. Só fui cobaia na experimentação dele e na adaptação que ele fez das minhas canções para o universo sonoro da orquestra dele. Estava lá praticamente como crooner das minhas composições, evidentemente. Teve essa coisa da confiança, de dizer: ‘Divirta-se, Martin. Faça para você se divertir que eu me divirto também’. Foi isso. Os arranjos são todos dele. As escolhas das canções nós fizemos juntos. Mas já nesse processo de escolha, a gente estava pinçando canções que na gravação original continham elementos sonoros que poderíamos explorar dentro daquela orquestra. Teve um período em que ficamos bem próximos, trabalhando juntos. Depois, ele simplesmente me mostrava tudo quando já bem adiantado.”

>> AS CANÇÕES
“É um registro diferente das minhas canções. Dá orgulho por ter a paternidade dessas canções, perceber que elas transitam por universos tão diferentes e continuam as mesmas canções. Isso é o melhor da coisa. Reafirmar esse repertório é muito bacana, dá frescor às canções. E elas ganham novas dimensões, graças a essas novas roupagens que a gente fez.”

>> AS REFERÊNCIAS
“Poderia citar vários nomes, compartimentar minhas influências a ponto de segmentá-las dentro do universo do jazz. O Miles Davis é uma grande referência. No rock, o Frank Zappa, outra grande referência. Mas música não precisa de referência, é simplesmente música. E quando você está junto com uma turma fazendo música, é esse coletivo que define o que é música. E como ela é feita. No caso do The bridge, por mais que tenha os arranjos do Martin, por mais que tenha as minhas canções, só quando nos encontramos pela primeira vez isso se materializa, isso se dá no coletivo. Isso é o mais bacana de tudo.”

>> O NOVO
“O lugar em que estamos é diferente de todos onde já estivemos antes. Sempre. Ou, pelo menos, eu me engano pensando que é isso. Tento burlar essa coisa da repetição. Procuro nunca repetir nada. Estou sempre procurando outros estímulos para tentar burlar justamente isso, a repetição. Se não, como eu poderia seguir cantando a música Paciência infinitas vezes da mesma maneira, minha gente.? É muito difícil. E entendo, para cada uma das pessoas que tem identificação profunda com a canção Paciência, por exemplo, por que elas não se cansam de pedir. Elas dizem: toca Paciência... E tenho toda paciência de tocar Paciência outra vez.”

A orquestra
A Martin Fondse Orchestra é conduzida pelo maestro Martin Fondse, diretor artístico da Dutch National Youth Jazz Orchestra, premiado com o Edison Award (melhor álbum de jazz de 2012). A Martin Fondse é formada por artistas de diferentes nacionalidades: o alemão Dirk-Peter Kölsch (bateria); os holandeses Eric van der Westen (baixo), Mete Erker (saxofone e clarone), Vera van der Bie e Herman van Haaren (violino) e Irma Kort (oboé); o dinamarquês Soren Siegumfeldt (sax-tenor); e a norueguesa Annie Tangberg (violoncelo). Martin rege o grupo ao piano.

THE BRIDGE: LENINE & MARTIN
FONDSE LIVE AT BIMHUIS

CD e DVD
Coqueiro Verde
R$ 24,90.