Ao lado de Kiko Dinucci (voz, violão, guitarra e percussão) e Thiago França (saxofone e flauta), ela forma o Metá Metá, grupo paulistano dos mais interessantes e inovadores da cena musical brasileira atualmente.
De fato, ouvir o som do Metá Metá pela primeira vez não é uma experiência qualquer. Não é um som qualquer e já começa, no caso do disco mais recente, com uma faixa – Exu – que chega soar conceitual, experimental. Voz e instrumentos não têm outro compromisso que não impactar. Na sequência, com Oya, o ouvinte entra nos trilhos com estrofes, refrão e letra em português, mas sem que isso signifique estar numa zona de conforto. Ao contrário, da metade para o fim da canção, a banda praticamente entra em transe catártico.
E prossegue demonstrando facetas distintas da própria sonoridade ao longo das outras sete faixas: São Jorge (de suingue irresistível), Man Feriman (mistura boa de guitarra e cantiga para Oxum), Rainha das cabeças (com violão a guiar “cozinha” demolidora), Cobra rasteira (outro balanço delicioso, com cavaquinho), Logun (quantos já encaixaram o cavaquinho assim?), Orunmila (flerte feliz do rock com tudo isso) e Tristeza não (fizeram rock sem guitarra, baixo ou bateria). Verdadeira sessão de descarrego – e em 40 minutos.
REDE
No palco, o trio não terá escolta da banda que o acompanhou na gravação de MetaL MetaL e fará apanhado de músicas deste disco, do anterior (Metá Metá, o de estreia; 2011) e do EP do ano passado, além de antecipar faixas do próximo trabalho, com lançamento previsto para mês que vem. “Ele também é bem pesado, mas as canções têm um outro clima. Ele é todo mais sombrio”, adianta a cantora. O repertório continuará sendo autoral, com várias parcerias entre os três.
Além disso, continua Juçara, Kiko Dinucci emplacará no próximo álbum sua primeira canção com Siba e a de Thiago França com Sergio Machado (o baterista que costuma acompanhar o trio), que terá letra de Rodrigo Campos. Este último colabora, ainda, em outra faixa com o guitarrista do Metá Metá. Essas duas aparições de Campos, cavaquinista, cantor e compositor que é outro destaque da cena paulistana contemporânea, não são mera coincidência, mas a ponta do iceberg.
Juçara, Kiko e Thiago estão conectados aos principais nomes da geração que, a partir de São Paulo, produz música brasileira da melhor qualidade. Além dos artistas já citados, é preciso falar de Rômulo Fróes, Marcelo Cabral, Guilherme Kastrup, Douglas Germano (que assina três músicas de MetaL MetaL com Dinucci), Celso Sim e Clima, entre outros.
Juçara diz que Passo Torto e Metá Metá são “trabalhos irmãos” em função dos integrantes em comum e que essa turma toda é apelidada carinhosamente de “Clube da Encruza”. “Um participa do trabalho do outro. É uma troca intensa e incessante”, explica. É verdade: ao consultar o encarte de Rei vadio – As canções de Nelson Cavaquinho, disco que Fróes lançou há pouco, é possível encontrar os nomes de Marcelo Cabral, Rodrigo Campos, Thiago França e Kiko Dinucci.
CUSTAS
A estética moderna é a assinatura desses artistas em todos os trabalhos de que participam: a música que fazem não deixa de ser acessível, ao mesmo tempo que foge do óbvio. E isso se aplica também às letras, com o disco São Mateus não é um lugar assim tão longe (2009), de Rodrigo Campos, como um dos melhores exemplos do que essa safra de compositores é capaz. Suas crônicas da periferia paulistana são preciosas. Juçara, por sua vez, fez um disco elogiado e desconcertante, Encarnado (2014), praticamente só com guitarras e voz.
Precede este trabalho dela a pesquisa sobre música africana, iniciada há cerca de 10 anos com Kiko Dinucci e depois compartilhada com Thiago França. “Focamos em música africana contemporânea, sobretudo. Congo, Mali, Angola, as guitarras africanas, o jeito de pensar o arranjo por contraponto, frases que se intercalam, que dialogam. Tudo baseado na polifonia e na polirritmia.
A cantora sempre foi fã da Vanguarda Paulista e enxerga semelhança na comparação com o tal Clube da Encruza, apesar de terem surgido em momentos distintos. “Tanto o pessoal da Vanguarda quanto a gente tem de se virar para fazer o som caminhar. Não tem gravadora que banque, não tem jabá, não tem empresário. É tudo ‘às próprias custas S.A.’, como já dizia Itamar Assumpção. Independência e liberdade pra fazer o que achar importante fazer do seu som. Estar à margem do tal do mercado fonográfico nos permite isso.”
Ainda este mês, o Metá Metá embarca para duas apresentações na Alemanha (Dresden e Berlim). Em junho, fará show de lançamento do próximo disco no Circo Voador, no Rio de Janeiro. Três meses depois, retorna à Europa para divulgar o novo repertório por lá.
Metá Metá
SHoje, a partir das 22h, n’A Autêntica (Rua Alagoas, 1.172, Savassi). Ingresso: R$ 40 (na porta). Infomações: (31) 3654-9251 e (31) 99227-1275..