Portunhol sem clichês. É a língua musical que une o gaúcho Arthur de Faria e o argentino Omar Gammarco no disco Música menor. Cantautores, compositores de trilhas sonoras para TV, teatro e cinema, além de produtores e instrumentistas de dotes variados, os dois se conhecem há mais de 10 anos e, há três, resolveram começar a trabalhar juntos num material que foi virando um álbum de 10 faixas, lançado aos poucos, com vídeos na internet.
Radialista, autor de uma recente biografia de Elis Regina (Elis: uma biografia musical, Arquipélago, 2015), que vinha apresentando em capítulos pela rede e saiu em livro no ano passado, e de uma pesquisa preciosa sobre a música gaúcha, Arthur é formado em jornalismo, mas sua ocupação de maior prazer é a música. Merecem destaque os álbuns de seu inquieto e complexo Arthur de Faria e seu Conjunto, com títulos sugestivos como Música pra bater pezinho, Música para ouvir sentado e, em preparação, o Música pra bater de frente. De Cida Moreira a Fernanda Takai, são muitos os intérpretes e autores que cruzaram estradas com Arthur. O mais recente, o vocalista do Vanguart, Hélio Flanders, que deve a ele parte do sucesso da produção de seu primeiro disco solo, um dos mais elogiados de 2015.
Com quatro álbuns individuais lançados desde 2001, o portenho Omar Gammarco tem um estilo que combina sem pudores com o do gaúcho. Basta ver a descrição de sua música feita pela imprensa argentina: “Evocativa, melancólica, festiva, irônica e muito original em seus climas”. Apresentados pelo produtor argentino Carlos Villalba, que enxergou a óbvia conexão de obras e personagens, ambos se sentiram tão à vontade para trabalhar juntos que algumas melodias com ritmos brasileiros do disco foram compostas por Omar e algumas argentinas, por Arthur.
Como fosse o lado B (ou uma extensão) do encontro dos hitmakers Fito Paez e Moska feito no passado, Música menor é um álbum de artista fora do grande círculo, mais prestigiados por circuitos restritos e privilegiados.
Estabelecidos os objetivos musicais e poéticos, segue uma sucessão, sempre com parte em português e parte em castelhano, de tango, maracatu, balada, rock argentino, valsa brasileira, baguala e otras cositas que servem bem a sensibilidades dos dois países. Gravado entre Buenos Aires e Porto Alegre, com músicos daqui e de lá, tem entre os destaques a cantora argentina Liliana Herrero, o bandoneonista Martin Sued e a cantora e percussionista pernambucana Alessandra Leão. Com base instrumental de André Paz (baixo, theremin e coro) e Fernando Pezão (bateria e meia-lua), Omar fica com violões e guitarras e Arthur, com piano e acordeão. O resultado sonoro é ao mesmo tempo regional e universal, doméstico e cosmopolita. Não no sentido de homogeneidade, mas no caminho de um mundo que busca a diversidade e polifonia..