Musica

Biografia revela um Freddie Mercury reservado, inseguro e cruel

Nas pesquisas para o livro, Laura Jackson concluiu: Mercury, apesar de bem humorado, era capaz de cometer crueldades em nome do estrelato

Rebeca Oliveira

Farrokh Pluto Bulsara. O nome de origem indiana não soa familiar ao público. Trocando pela alcunha artística de Freddie Mercury, a situação se inverte por completo. Uma das figuras mais emblemáticas do rock mundial, o líder da banda Queen era dono de personalidade carregada de dualidades. Quem o assistia nos palcos encontrava um frontman seguro, excêntrico e cheio de energia. Longe deles, havia um homem reservado, inseguro e, se necessário, cruel.


Fascinada pela genialidade do cantor, a escritora escocesa Laura Jackson se debruçou sobre a vida e a carreira de Freddie Mercury. Baseada em conversas com amigos e músicos que convivem com o astro, construiu a narrativa da obra homônima lançada esse mês no Brasil pela editora Record. Com diversas fotos, o trunfo da publicação reside na narrativa concisa e que, em poucas páginas, transporta o leitor à intimidade do cantor.

“Propus-me a capturar a essência dele como homem e mapear as fases cruciais, os momentos mais importantes de sua vida”, explica a autora em entrevista ao Correio. Do início conturbado do Queen, quando sofreu críticas pesadas devido ao ecletismo musical, até a morte, em 1991, vítima de Aids.

Freddie não é o primeiro astro a ser perfilado por Jackson. Ao longo das duas décadas de carreira, a escocesa ficou conhecida pela literatura musical. Bon Jovi, Steven Tyler e Bono Vox já foram tema de livros dela. No entanto, reserva ao recém-lançado livro um apreço considerável: “Freddie foi, em um sentido verdadeiro, um homem fascinante, com inúmeras facetas de sua personalidade. De certa forma, ele nasceu para o sucesso. Ele nunca conseguiria ter uma vida normal”.

Jackson era adolescente quando surpreendeu-se com o clipe de Bohemian rhapsody. Depois de assistir a uma entrevista de um “insolente” Mercury numa emissora de tevê britânica, ela sentiu a necessidade de conhecer sobre o homem por trás do mito.

Das conversas com quem conviveu com o músico — como Bruce Dickinson, Tim Rice e Zandra Rhodes — surgem revelações sobre a tumultuada vida de Mercury, hoje representado por Adam Lambert no Queen, que se apresenta no Brasil no Rock In Rio, a ser realizado em setembro.

Mercury e o Queen foram uma das primeiras grandes bandas internacionais a visitar o Brasil quando estavam no auge da fama. O primeiro show foi em 1981, no Estádio do Morumbi, em São Paulo. Quatro anos depois, retornam para a apresentação catártica no Rock In Rio, quando se apresentaram para 250 mil pessoas. Foi quando Love of my life e We are the champions foram entoadas em coro, como ares de culto religioso.

A obra revela, ainda, a relação entre Freddie e Mary Austin, com quem o músico foi casado e se relacionou por anos. Embora fosse homossexual declarado, o músico nunca escondeu reconhecer apenas ela como o grande amor da sua vida. A amizade com Barbara Valentin também ganha importante registro.

Jackson conta, também, sobre o último parceiro de Mercury, Jim Hutton, que ficou ao lado dele até a morte. “Freddie amou muito Jim Hutton, acredito nisso, mas Freddie não era fiel a ele. Apesar disso, Hutton firmemente ficou com o cantor durante toda a sua doença, até o fim”, comenta a escritora.

Duas perguntas / Laura Jackson

Qual a característica mais marcante de Freddie Mercury?
Freddie teve uma existência energética, mas ele tinha uma personalidade avassaladora que nem sempre lhe favorecia. Ele podia ser cruel, espontaneamente, em algumas ocasiões. Foi fascinante para ouvir lembranças de todos os amigos, sejam elas agradáveis ou não. Logo no início das minhas entrevistas, eu descobri que interiormente Freddie era um jovem revoltado. Por trás da extravagância, quando ele estava lutando para ser alguém no meio musical, ficava enfurecido por ainda não ser uma estrela. Para Freddie, o estrelato era seu. Por direito.

Se surpreendeu com algum fato da vida do cantor, tão superexposta na mídia?
Os aspectos ocultos da Mercury são as mais interessantes. O mesmo homem que escorria confiança tinha uma necessidade vulnerável para aceitação. Mais tarde, como uma estrela, ele seria publicamente ousado e escandaloso mas em particular ele era um homem refinado e culto. Na juventude (Freddie nasceu em Stone Town, na ilha Zanzibar, hoje território da Tanzânia, na África), ficou fascinado com um caleidoscópio de gêneros musicais que disparou sua imaginação febril. Quando chegou à Grã-Bretanha, ainda estudante, mergulhou numa cena musical que já estava estabelecida. Sua unidade implacável para formar ou participar de uma banda tornou inevitável que ele iria romper esse cenário, o que, até então, era um negócio difícil.

Freddie Mercury

De Laura Jackson. Tradução de Waldéa Barcellos. Record, 308 páginas. Preço médio: R$ 45.