Nem tudo era mangue: Diversidade marcou o rock pernambucano dos anos de 1990

Depois das comemorações pelos 20 anos dos primeiros discos de Mundo Livre S/A e Nação Zumbi, chegou a hora de relembrar outras bandas que lançaram seus trabalhos na mesma época ou na sequência

por Julio Cavani 27/04/2015 09:37

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Yellow
Primeiro disco da Jorge Cabeleira completa duas décadas em 2015 (foto: Yellow)
No ano passado, as bandas Mundo Livre S/A e Nação Zumbi foram bastante celebradas por causa das comemorações dos aniversários de duas décadas de seus primeiros discos, Samba esquema noise e Da Lama ao caos, lançados em 1994. Na época, contudo, elas não estavam sozinhas. Os dois grupos faziam parte de uma "cena musical" que revelou outros talentos direta ou indiretamente ligados ao Movimento Mangue. A partir de 1995, começaram a ser lançados novos álbuns, que também merecem ser resgatados 20 anos depois. Alguns deles viraram clássicos e impulsionaram carreiras que continuam até hoje, enquanto outros parecem ter ficado restritos àquele momento.

Além de Mundo Livre e Nação, quais seriam os nomes de maior destaque daquele período?

Algumas bandas alcançaram projeção nacional, com clipes e músicas nas paradas de sucessos e premiações de emissoras de rádio e TV nacionais, como ocorreu com Paulo Francis Vai pro Céu (premiada na MTV em 1998 com Perdidos no Espaço) e Jorge Cabeleira e o Dia em que Seremos Todos Inúteis (presente entre as dez mais tocadas da Transamérica em 1995 com Carolina).

Outras tiveram discos lançados por gravadoras multinacionais, como Eddie, Sheik Tosado, Devotos, Querosene Jacaré e Faces do Subúrbio, além da própria Jorge Cabeleira. Assinar esse tipo de contrato proporcionava gravações em estúdios de última geração com produtores consagrados (no Brasil ou no exterior), financiamentos de videoclipes, prensagem industrial e esquema de distribuição dos CDs para lojas e rádios, entre outras vantagens (e algumas desvantagens, como a cessão de direitos autorais dos fonogramas e a falta de controle sobre tiragens e relançamentos).

Há ainda aquelas que nem existem mais, mas cujos integrantes continuaram no ramo da música e conseguiram evoluir com projetos importantes. É o caso da banda Sheik Tosado, que revelou o cantor China, além de Lara Hanouska (com Stela Campos), Dreadful Boys (Missionário José e Felipe Vieira), Chão e Chinelo (Caçapa, Niltinho e Maciel Salu) e Comadre Fulozinha (Karina Buhr, Isaar e Alessandra Leão).

Festivais como Abril Pro Rock e Rec Beat e casas de shows (extintas) como Soparia, Pocoloco, Bar do Grego, Francis Drinks e Moritzstadt, entre outras, eram alguns dos principais palcos para essas bandas (além de espaços como a Galeria Joana d'Arc e a Academia Arte Viva). O Festival de Inverno de Garanhuns ainda estava no começo. Havia também eventos mais esporádicos, como um concurso de bandas promovido pelo governo na Torre Malakoff (na campanha Viva a Nota) e o Mercado Pop, que chegou a ocorrer no prédio onde hoje funciona o Paço Alfândega.

Atualmente, é difícil ter acesso aos discos, fitas cassete e videoclipes produzidos por essas bandas. Os melhores arquivos são as coleções pessoais dos próprios músicos, de produtores ou de amigos, que às vezes postam esse material na internet. Alguns álbuns dependem do interesse das gravadoras para serem relançados, pois já estão esgotados não ganharam novas tiragens.

Parte desses músicos não sentia identificação com o Movimento Mangue, apesar de tocarem nos mesmos palcos e festivais que os mangueboys, assim como algumas dessas bandas não tocavam rock.


Eddie
Dos primeiros integrantes da Eddie, o único que permanece na formação até hoje é o vocalista e guitarrista Fábio Trummer, que vivenciou todas as fases da banda e participou dos seis álbuns (o mais recente será lançado no próximo dia 4 de maio). Apesar de ter produzido o disco Sonic mambo (1998) com gravadora norte-americana Roadrunner, o grupo alcançou uma maior consagração quando assumiu a independência a partir do lançamento de Original Olinda style (2002). Shows lotados e animados, em diversas capitais do Brasil, atualmente são comuns na rotina dos olindenses. Karina Buhr cantou e tocou percussão na Eddie antes de formar a Comadre Fulozinha e de seguir carreira solo, assim como Roger Man e Berna Vieira antes da Bonsucesso Samba Clube.

 

 

 

Jorge Cabeleira
O primeiro disco da banda Jorge Cabeleira e o Dia em que Seremos Todos Inúteis foi lançado há duas décadas, em 1995, pelo selo Chaos da gravadora Sony Music. Influenciados pela cultura psicodélica nordestina da década de 1970, eles combinam elementos do rock pesado com gêneros como o baião. A música Carolina chegou a entrar em paradas de sucesso na MTV e em rádios de alcance nacional como a Transamérica. O álbum original não está mais disponível em lojas, mas todas as faixas foram relançadas na coletânea Trazendo luzes eternas (2014), que reúne também canções novas e músicas do CD Alugam-se asas para o carnaval (2001). Eles continuam em atividade.

 

 

 

Mestre Ambrósio
A banda Mestre Ambrósio, que trouxe novos olhares e ouvidos para a cultura popular, oficialmente acabou depois do terceiro disco, mas seus integrantes continuam dedicados à música. Siba tem desenvolvido diversos projetos musicais, como a Fuloresta do Samba, o Azougue Vapor (ambos com músicos da Zona da Mata Norte) e o disco solo Avante (o próximo, De baile solto, será lançado em junho e já está em pré-venda). Helder Vasconcelos atualmente trabalha com projetos híbridos entre dança e música. Eder O Rocha aprofundou os estudos com percussão, lançou discos e fundou a escola Prego Batido em São Paulo. O baixista Mazinho Lima (velho Maza) lançou o primeiro disco solo em 2013. Sérgio Cassiano também já lançou dois discos (o último foi Água, de 2013), além de ser professor do Conservatório Pernambucano. O percussionista Maurício Badé toca no grupo Afroelectro e já colaborou com artistas como Criolo, Angra e Céu. Todos também continuam bastante ligados ao folclore e participam de agremiações.

 

 

 

Devotos
Fundada na década de 1980, com dez discos lançados, a Devotos continua com os mesmos integrantes e permanece no bairro de sempre: o Alto José do Pinho. Ao longo dos anos, o grupo tornou-se um dos maiores nomes do punk rock e do hard core no Brasil, com um estilo próprio que desafia gêneros convencionais. Cannibal, Celo e Neilton ainda têm outros projetos paralelos, em bandas como Café Preto, B.U. e com músicos como Lirinha. O primeiro disco, Agora tá valendo, foi lançado pela gravadora BMG (selo Plug), com produção de Lúcio Maia (Naçaõ Zumbi).

 

 

 

Faces do Subúrbio
Mesmo com a diminuição nas atividades da Faces do Subúrbio, os rapper Zé Brown e Tiger ainda estão entre os cantores mais "considerados" do movimento hip hop pernambucano, seja em carreiras solo ou em projetos especiais. O DJ KSB tem tocado com Galo de Souza (além de discotecar em festas). O baterista Garnizé e o baixista Marcelo Massacre moram no Rio de Janeiro, ainda diretamente envolvidos com música. O guitarrista Oni toca na banda recifense Fator Zulu. A Faces já foi indicada ao Grammy Latino e teve dois discos lançados pela gravadora MZA Universal.

 

 

 

Sheik Tosado
Antes da carreira solo e da banda Del Rey, o cantor China foi revelado como vocalista da Sheik Tosado, que fazia hard core com elementos regionais. O único disco do grupo foi lançado em 1999 pela gravadora Trama e chama-se Som de caráter urbano e de salão (título em referência ao frevo).

 

 

 

Dreadful Boys
A Dreadful Boys revelou figuras como Felipe Vieira (atualmente com o projeto Badminton) e Missionário José, que hoje é um produtor musical consagrado (atuante em São Paulo) e baixista da Mombojó (e também um dos fundadores da Bonsucesso Samba Clube).

 

 

 

Paulo Francis Vai Pro Céu
Premiada na MTV em 1998 com o clipe Perdidos no espaço, a banda Paulo Francis Vai Pro Céu não acabou oficialmente, mas está parada há mais de cinco anos (os integrantes dedicam-se a outras profissões). Com apenas um disco lançado (Sasha, 1998), eles ficaram mais conhecidos pelas iconoclastas músicas da fita demo Na cama com Ariano, com letras sarcásticas e politicamente incorretas. A canção Eu queria morar em Beverly Hills chegou a ser gravada pelo cantor gaúcho Wander Wildner e é tocada na abertura do curta-metragem Eletrodoméstica, de Kleber Mendonça Filho.

 

 

 

Lara Hanouska
Lara Hanouska era a antiga banda da cantora Stela Campos, paulista que foi uma peça-chave no movimento mangue e atualmente segue carreira solo em São Paulo (seu último disco, Dumbo, foi lançado em 2013).

 

 

 

Dona Margarida Pereira e os Fulanos
Formada em 1994, a banda DMP e os Fulanos foi a vencedora de um festival em 1997 na Torre Malakoff e, como prêmio, ganhou patrocínio para gravar um dos discos mais perfeccionistas já produzidos em Pernambuco, com influências de rock, hip hop e música eletrônica (Beastie Boys era uma das maiores referências).  Entre os integrantes, passaram músicos como Salvador Santo (atualmente em carreira solo), Jam da Silva (hoje solo), Marcos Buccini (hoje cineasta), DJ Bruno Pedrosa (Café Preto), Igor Medeiros (hoje com Lirinha e Poruu) e Marcelo Gomão (Vamoz).

 

 

 

Querosene Jacaré
A banda Querosene Jacaré, que tinha um rock visceral com forte sotaque nordestino, teve uma primeira fase com o vocalista Ortinho, depois substituído por Alfaia, que também era baixista. O primeiro disco, Você não sabe da missa um terço, foi produzido pela gravadora multinacional Paradoxx. O segundo, Fique peixe, teve distribuição da Sony. Depois de uma interrupção de dez anos (após turnês internacionais), eles voltaram a tocar em 2013 mas em seguida pararam novamente.

 

 

 

Chão e Chinelo
A banda Chão e Chinelo, que só lançou um disco, é uma espécie de parente da Mestre Ambrósio, pois também trazia uma energia jovem para ritmos folclóricos, com elementos de coco, forró e cavalo marinho, com forte presença da rabeca. Entre os integrantes estavam músicos hoje em dia ainda bastante atuantes, como Caçapa, Maciel Salu e Niltinho (Pandeiro do Mestre).

 

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