Musica

Samba da quadra atrai público jovem a comunidade na região centro-sul

Público de diversas regiões da capital frequenta a Escola de Samba Cidade Jardim. Evento ajuda a financiar o carnaval e outros projetos do local

Ana Clara Brant

Integração entre o público, música de qualidade e segurança são destaques do evento. Jovens da comunidade não pagam para entrar
O asfalto descobriu o morro. Mais especificamente, a Vila Santa Maria, o primeiro conjunto habitacional popular construído na capital, que fica próximo ao Hospital Luxemburgo, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte. Há pelo menos um ano, a quadra da Escola de Samba Cidade Jardim se tornou um point da cidade, e depois da reforma, que está completando três meses, se consolidou como um centro de cultura e ferveção. “O trabalho só tem aumentado, as pessoas estão cada vez mais vindo e nos descobrindo, principalmente agora com a reforma, que trouxe mais segurança e conforto para os frequentadores. Tem coisa melhor do que o morro? Não tem! Por isso está todo mundo vindo para cá”, celebra o presidente da agremiação, Alexandre Lee Costa, morador da região e filho do fundador da escola, Jairo Pereira da Costa.

 

O espaço está com uma identidade visual nova, idealizada pelos artistas da galeria virtual Quarto Amado, banheiros ampliados e uma nova escada de acesso. Deverá ganhar mais oficinas, como lembra Alexandre Brandão, o Xandão, diretor administrativo do local. “Além de levar entretenimento, a gente pensa no bem-estar da nossa população. São os eventos aqui, especialmente o de sábado, o Samba da quadra, que bancam as nossas atividades, como o próprio carnaval, as oficinas de balé, dança afro, capoeira, percussão, jiu-jítsu, entre outras. Além das festas da comunidade, como batizados e casamentos. Aqui não é uma casa de show, mas uma casa de cultura, um quilombo urbano”, define.


Os cursos gratuitos têm revelado talentos no Conjunto Santa Maria, como os amigos André Luiz Pereira, de 20 anos, Davidson Luiz Honorato, Jordan Faria e Lucas Gomes da Cruz, todos de 17. O quarteto usufrui das oficinas, especialmente as de música, e vez por outra toca na quadra. “Já participei de muitas oficinas e, além de aproveitar as festas, de vez em quando dou uma canja. Acho essa iniciativa de abrir a quadra pra cidade muito legal. É bom que as pessoas que nunca estiveram aqui podem conhecer e ver como é o morro. E todo mundo aqui recebe superbem e gosta”, comenta Davidson. Já Lucas comemora o fato de não precisar nem sair de casa para se divertir. “E o melhor é que temos livre acesso. O pessoal que mora aqui não paga”, destaca.

"As pessoas têm a ideia de que aqui só tem tráfico e violência, mas viram que o morro é muito mais do que isso", Alexandre Lee Costa, presidente da Escola de Samba Cidade Jardim
Mas apesar de a população local ser a grande beneficiada, quem tem aproveitado bastante os eventos no espaço é gente que nunca havia posto os pés numa favela. A grande maioria do público está na faixa entre 22 e 35 anos e é de classe média ou classe média alta. “Na verdade, isso não é uma novidade, porque na época do meu pai, lá pelos anos 1980 e 1990, que foi assessor de deputado, a gente recebia político, empresário. A novidade é a juventude estar vindo”, observa o presidente Alexandre Costa.

O grupo de amigos liderado pelo administrador Gustavo Kummel, de 33,  tem batido o ponto no Samba da quadra, o evento mais popular do lugar. E ele ressalta que para a sua faixa de idade não tem programa melhor em Belo Horizonte. “Tem música boa e de qualidade, gente bonita e não tem tanta meninada. E sem falar que é supertranquilo com relação à segurança”, diz. O amigo, o advogado Michael Hubner, de 30, conta que quando foi ao samba pela primeira vez achou a proposta diferente, pelo fato de ser dentro de uma favela, mas que não tem do que se queixar. E acredita que acabou virando moda. “BH tem muito disso, de modismo. Começa a fazer sucesso, então muita gente descobre. Mas nada que não é bom continua. Aqui é ótimo”, atesta.

Preço de boate


Já para a dupla Guilherme Lott e André Amaral, ambos de 30 anos, que estavam levando o amigo Rafael Aleixo, de 31, pela primeira vez à quadra, a única queixa é o preço dos ingressos, ainda mais para quem deixa para a última hora. “A gente já vem aqui há algum tempo e percebemos que encareceu. Se comprar na porta fica em torno de R$ 55 só para entrar. É preço de boate. Mas o ambiente é bem bacana. É um lugar despojado”, diz André. Para Guilherme, a grande vantagem do lugar, além de ter gente interessante e uma ótima trilha sonora, é a facilidade de acesso. “Não tem que enfrentar fila ou conhecer o promoter do lugar. É só chegar e entrar”, conta. Já Rafael, que estava indo pela primeira vez, não teve do que reclamar. “A expectativa é das melhores. Todo mundo fala muito bem. Tem música boa, gente bonita. Não pode dar errado.”
Marcos Lima e a noiva, Débora Lamounier, foram escolher uma banda para tocar no casamento
Também estreando no espaço, o casal Débora Lamounier, de 26 , e Marcos Lima, de 28, aproveitou para conhecer o lugar e ainda escolher a banda que vai tocar no casamento deles, marcado para novembro do ano que vem. “Sempre ouvi falar que é um lugar muito animado. É um Rio de Janeiro em BH. Até a energia é parecida. Aquele clima de festa, esta vista linda e dentro do morro. A gente foi super-recomendado e pelo que nossos amigos comentaram é bem tranquilo em relação à segurança, tanto para sair quanto para chegar”, pontuou.

Realmente, a comunidade faz questão de interagir e receber quem vem de fora. E isso começa desde a entrada do morro, antes mesmo de chegar à quadra. “A comunidade faz questão de acolher e além de poder entrar de graça nos eventos, a gente faz uma festa exclusiva todo mês para o pessoal daqui. Mas mesmo nas festas abertas os moradores não se sentem intimidados pelo fato de vir gente mais abastada. Não tem nenhum problema nisso. E o mais legal é que o bairro valorizou. As pessoas têm essa ideia de que aqui só tem tráfico, violência, mas viram que o morro é muito mais do que isso”, frisa Alexandre Costa.

Para o músico Fabinho do Terreiro, que costuma se apresentar no Samba da quadra, o segredo do sucesso do espaço é a resistência e a determinação de sua diretoria. E sem falar no fato de oferecer o legítimo samba de raiz. “Desde que frequento aqui, o público só tem crescido. O pessoal resistiu bravamente e a união provou que é possível manter vivo um sonho. E o resultado é esse aí. Está sempre lotado e não tem opção melhor de diversão”, resume.

Raízes à meia-noite


Uma outra opção de samba na cidade que está conquistando cada vez mais adeptos é o Samba da meia-noite. O evento de sambadores e sambadeiras traz em seus batuques e chulas as heranças, lembranças e vivências ancestrais de uma cultura singular, com origem no Recôncavo Baiano. Por meio da oralidade multirregional tipicamente brasileira, o Samba da meia-noite expressa, com tempero mineiro, a herança deste legado de acordo com a história de cada integrante do grupo. É realizado à meia-noite de sexta-feira, de 15 em 15 dias, debaixo do Viaduto de Santa Tereza. A próxima apresentação será dia 15. Informações no facebook do evento.

King Combo 70

Amanhã à noite, a quadra do GRES Cidade Jardim terá noite de celebração especial. A segunda edição do Soul do Morro, projeto dos DJs Jahnu, Thiagão, Xeréu e Yuga, homenageia um dos ícones da música negra no Brasil: Gerson King Combo. A festa começa às 22h e vai ter as participações de Flávio Renegado, Cubanito (Black Sonora), Zaika dos Santos, DJ Black Josie e, claro, do próprio Gerson King Combo, todos acompanhados pelo groove da banda Bantu Black.
A celebração marca os 70 anos do artista, 50 deles dedicados à música. Ingressos: 1º lote, R$ 25; 2º lote, R$ 30; 3º lote, R$ 40 e 5º lote, R$ 50. Vendas: www.sympla.com e www.facebook.com/souldomorro.

Quadra da Escola de Samba Cidade Jardim
Sábados, Rua do Mercado, 150, Conjunto Santa Maria. Das 16h às 2h. Ingressos: 1º lote, R$ 30 (feminino) e R$ 35 (masculino); 2º lote, R$ 35 (feminino) e R$ 50 (masculino). Dia 22 tem festa E.S.Q.U.E.M.A, com Los Sebosos Postizos, Pequena Morte, Tião Duá e DJ Fael. Informações no site do evento. Capacidade: 1 mil pessoas.