Classificam-se como queijo de minas artesanal os produtos com leite cru e pingo – fermento natural que literalmente pinga da massa durante o processo de fabricação. Outra característica comum desse modo de fazer, registrado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) como patrimônio cultural brasileiro, é o uso da salga seca (adiciona-se o sal por cima do queijo já enformado). “Minas Gerais é reconhecido por essa tradição milenar. São anos e anos passando de pai pra filho o modo de fazer que continua artesanal e nas mãos de pequenos produtores”, destaca o superintendente técnico da Federação da Agricultura do Estado de Minas Gerais (Faemg), Altino Rodrigues Neto.
Há sete regiões do estado oficialmente reconhecidas como produtoras de queijo de minas artesanal: Araxá, Campos das Vertentes, Canastra, Cerrado, Serra do Salitre, Serro e Triângulo Mineiro. “Cada uma tem sua forma particular de produzir.
Para que o público perceba todas essas diferenças, sete chefs prepararão no festival receitas com os queijos de cada uma das regiões produtoras. Edson Puiati será o representante do Serro. “Antes, os queijos de lá tinham uma característica mais frescal, agora aparecem maturados, inclusive com fungos e ácaros da região, o que provoca sabores diferentes”, conta. Isso, aliás, não é exclusividade do Serro. Produtores de todo o estado estão investindo em técnicas de maturação e já reivindicam mudanças na legislação para regulamentar essa nova forma de fabricação. Segundo a Faemg, será apresentada no evento uma revisão da Lei Nº 20.549, de 2012, que regulamenta a produção de queijo minas artesanal. O documento ainda será submetido a consulta pública.
SUBSTITUIÇÃO
Puiati levará para o festival polpetas de carne de porco com fondue de polenta branca. O queijo do Serro aparece no recheio da carne e se mistura ao fubá de milho branco. “Assim, você consegue perceber duas nuances do queijo, o meia cura mais suave no fondue, que derrete facilmente e dá a liga necessária para aglutinar o fubá, e o curado com sabor mais marcante no recheio”, detalha. Defensor dos produtos locais, o chef vem observando o movimento de substituir queijos tradicionais, como parmesão, que geralmente eram importados, por queijos mineiros maturados. Da entrada à sobremesa, eles podem agregar sabores incríveis às receitas.
Já Flávio Trombino, do restaurante Xapuri, tem a missão de apresentar o queijo da Serra da Canastra.
Polpetas suínas com fondue de polenta branca
300g de carne de porco (lombo ou pernil) moída; 60g de bacon moído; sal; pimenta-de-macaco moída; óleo para fritura; 50g de alho frito; 100g de queijo do Serro curado; 100g de fubá de milho branco; 300ml de caldo de carne; 200g de queijo tipo requeijão; 200g de queijo do Serro meia cura
Modo de fazer
Misture a carne de porco moída com sal e pimenta a gosto. Faça uma massa homogênea. Modele as polpetas colocando um pedaço do queijo no centro. Frite em óleo quente ou asse e reserve. Prepare a polenta, dissolva o fubá branco na água fria e acrescente ao caldo fervente.
Resgate histórico
Por muito tempo, o queijo maturado, que era comum na época em que as mercadorias faziam longas viagens para chegar à mesa, ficou esquecido em Minas Gerais. “Com o aumento do consumo, os queijeiros, que são os intermediários, passaram a frequentar as fazendas de três em três dias e os produtores viam a facilidade de receber o dinheiro à vista. Dessa forma, a cultura maturação foi se perdendo e o próprio consumidor se acostumou com o queijo fresco”, justifica o analista da unidade de agronegócios do Sebrae Minas Ricardo Boscaro. A realidade começa a mudar diante da valorização de produtos diferenciados, que levam as queijarias a uma volta ao passado.
Há três anos, o Sebrae Minas desenvolve um projeto na Serra da Canastra com o objetivo de valorizar a identidade e a origem do queijo produzido na região. No início, a maioria dos produtores vendiam queijo fresco. “De la pra cá, vários saíram da venda para intermediários e passaram a vender diretamente para lojistas e chefs, beneficiando-se de uma valorização enorme. Quanto mais maturado, mais o produto ganha sabor e identidade”, conta Boscaro. O trabalho, que começou no ano passado na região do Serro, deve chegar a todas as áreas produtoras.
Para o analista do Sebrae Minas, as premiações também ajudam a valorizar o queijo de minas artesanal e incentivam os produtores a investir mais na produção. Guilherme Ferreira, da fazenda Estâncias Capim Canastra, foi o primeiro a ganhar medalha na competição internacional Mondial du Fromage de Tours, na França, em 2015. O queijo dele ficou com a prata na categoria massa prensada não cozida de leite cru de vaca. No mês passado, o queijo de Marli Leite, produtora de Sacramento, saiu deste mesmo campeonato com um prêmio duplo ouro. Minas ainda conquistou uma medalha de ouro, sete de prata e três de bronze. “Em resumo, temos milhares de produtores de qualidade. Cada vez que eles forem premiados, mais pessoas vão trocar os queijos importados pelos locais”, atesta o chef Edson Puiati.
Serviço
1º Festival do Queijo Minas Artesanal
Local: Serraria Souza Pinto (Avenida Assis Chateaubriand, 809, Centro)
Horários: sexta-feira, das 19 às 23h; sábado, das 12 às 22h; domingo, das 10 às 18h Ingressos: R$ 10 (inteira)
ou R$ 5 (meia)
Os chefs e as receitas
Triângulo Mineiro
Eduardo Maya Sanduíche com linguiça recheada
Serra do Salitre
Mario Santiago e Lucas Parizzi
(A Pão de Queijaria)
Pão de queijo Serra do Salitre recheado com costelinha de porco ao molho de goiabada defumada e crocante de queijo
Araxá
Jaime Solares (A Borracharia)Dadinhos de tapioca com queijo de minas artesanal e mel silvestre
Cerrado
Guilherme Melo (Hermengarda) Abóbora caburé recheada com carne de sol e queijo artesanal
Campo das Vertentes
Caetano Sobrinho (A Favorita) Nhoque de batata com ragu de galinha caipira e fondutta de queijo minas