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Mineiro vencedor do Game Chef 2013 fala de carreira como game designer

Depois de vencer o concurso internacional de criação de jogos, Encho, de 28 anos largou a profissão de publicitário para seguir o sonho de criar jogos

Marcelo Faria


Em setembro de 2013, a vida do então publicitário Vinícius ‘Encho’ Chagas mudaria completamente. O ‘Pulse’, jogo narrativo criado pelo mineiro de 28 anos, foi o vencedor do Game Chef, um concurso internacional de criação de jogos não eletrônicos. Quase instantaneamente, ele recebeu um convite para lançar uma versão impressa do produto. Em menos de um mês, o ‘Pulse’ entrou para a pré-venda, enquanto Encho largou seu emprego em uma agência de publicidade para seguir seu sonho.


Hoje, além do sucesso com seu primeiro jogo, ele acumula experiência com o projeto ‘Versus’ e integra o ‘Capital dos Jogos’, um coletivo belo-horizontino de game design. Encho também é presença frequente na Kobold’s Den, a loja e editora de jogos que publicou o ‘Pulse’.

Inaugurando a seção de games do Portal Uai, conversamos com o game designer sobre a cena de jogos independentes em Minas Gerais, o processo de criação do ‘Pulse’ e os seus próximos passos.

Para conferir a lista de ganhadores do Game Chef, clique aqui


Um dos vários playtests do Pulse, jogo criado por Encho

Portal Uai: Vamos começar falando do Pulse. Em 2013 o jogo foi idealizado, produzido e lançado. Você pode contar um pouco sobre como foi esse processo?


Encho: Criar o jogo para o concurso GameChef foi uma loucura, fiz em uma semana apenas e ainda trabalhando em uma agência de publicidade, sem tempo pra nada. Fiz o jogo durante as madrugadas e finalizei no fim de semana. Quando ganhei o mundial, resolvemos lançar o produto. Saí do emprego pra dedicar 100% e em 20 dias tínhamos o livro final em mãos. Era uma programação apertada porque em outubro a Kobold's Den começava a agenda de produção deles e eu teria que entrar um mês antes pra pegá-los livres.

Portal Uai: Como você explicaria o jogo em poucas linhas para os interessados?

Encho: O Pulse é um jogo de criar histórias em grupo, onde cada um desenha círculos que representam a passagem de tempo para cada elemento no enredo. Os jogadores disputam quem consegue contar a maior parte dos acontecimentos, que no final só se resolve com trabalho em equipe.

Portal Uai: E ele é competitivo como um board game ou colaborativo como um RPG? Tem um vencedor no final?


Encho: Ele é colaborativo e não há um vencedor. Mas há um certo nível de competição natural ao longo do jogo devido às regras que definem quem pode determinar ou não cada parte da história. Nesse caso é mais próximo de um RPG do que um jogo de tabuleiro tradicional.

Portal Uai: Por que você acredita que ele foi tão bem recebido, não só pelos juízes que o escolheram vencedor no Game Chef, mas também pelo público em geral?


Encho: Além do visual, que gera muita curiosidade em quem está assistindo, ele é muito fácil de se aprender. Mesmo que se jogue bastante não há como "ser o melhor em Pulse". Jogadores novatos não se sentem, de forma alguma, intimidados ao jogar com veteranos. Os desenhos criados ao longo da partida parecem confundir, mas para quem está lá dentro é tudo muito simples.

Portal Uai: E as vendas? Ele tá indo bem nesse aspecto?


Encho: Bom, ele foi um grande sucesso considerando as vendas do mercado independente. Foram quase 100 jogos vendidos só no primeiro fim de semana de pré-venda. A gente espera que com o lançamento da versão em inglês role uma nova subida de vendas na versão nacional também.

Portal Uai: Há uma data para a versão em inglês?

Encho: Nos EUA o lançamento oficial será feito na GenCon 2014 em Indianápolis, dia 14 de Agosto.

Portal Uai: Antes de participar do Game Chef você já havia entrado em outras competições de Game Design, certo?


Encho: Sim. Já participei do MotoDev 2007 (jogo mobile), e do Global Game Jam 2010 com um jogo pra Web. Depois disso, em 2012 participei do Faça Você Mesmo, da Secular Games, o meu primeiro para a criação jogos ‘analógicos’ (não-eletrônicos).

Portal Uai: Você se lembra dos projetos?


Encho:
Em 2007 foi o Glutt, um jogo para celular bem casual, em que um cachorro sonhava com ossos caindo do céu e saía voando atrás deles. Na Game Jam de 2010 foi o Caribbean Penguins, um projeto feito em 48 horas com uma equipe de quatro outros designers, todo mundo criando e produzindo ao mesmo tempo. O jogo é sobre um grupo de pinguins que precisa se manter unido para não congelar. E no FVM de 2012 foi o Cortex, um RPG de mesa em que os jogadores se tornam invasores de sonhos, baseado em filmes como ‘A Origem’, ‘Matrix’ e 'A Cela’.

Portal Uai: E, finalmente, em 2013, foi o Pulse, no Game Chef. Primeiro você venceu a etapa brasileira, certo?


Encho: Isso, em maio saiu o resultado do brasileiro. E aí tive que fazer às pressas a tradução pra inglês para ele entrar na etapa internacional.

Portal Uai: Nessa época você já pensava em lançá-lo pra valer?


Encho: Pelo contrário, estava decidido em deixá-lo gratuito na internet. Só depois do título mundial é que fui convencido por amigos e pelo pessoal da Capital dos Jogos de que o Pulse poderia ser o carro chefe de uma onda de novos jogos. E isso se provou ser verdade logo que anunciamos a pré-venda do jogo.

Portal Uai: Você contou que, na época, ainda trabalhava em uma agência. A vitória no concurso mundial foi o que te encorajou a largar um trabalho 'normal' e entrar com tudo no game design?

Encho:
A vitória e a proposta da Kobold's Den de lançar o livro. Minha chefe entendeu bem e apoiou meu projeto, facilitando minha saída.

Portal Uai: E você já tinha uma carreira com publicidade…

Encho: Meu primeiro emprego na área acho que foi em 2004, mas eu trabalhava desde os 17 como freelancer em webdesigner. Então, 10 anos e mais dois de frilas…

Portal Uai: O tempo todo você atuou como webdesigner?

Encho: Comecei como webdesigner e em 2006 passei pra criação. Fazia ilustração, design gráfico e web. Depois, de 2008 até 2009, foi só programação. Voltei para ilustração e gráfico por mais dois anos e o resto foi finalmente com design gráfico e web.

Portal Uai: Agora, com o sucesso do Pulse, você está totalmente focado em game design. Existem outros projetos engatilhados?


Encho: Isso! Estou produzindo o Hex, que é um jogo de RPG baseado em cores e a psicologia por trás delas, que deve ser lançado pela Kobold's Den em algum momento de 2014. E o Versus, que é uma disputa com o Rafael Rocha, da Secular Games, em que cada um deve fazer um jogo por mês até o final do ano.

Portal Uai: Me explica melhor o Versus. Como funciona?

Encho: Os dois queriam aumentar a produtividade esse ano, então nos desafiamos a criar, cada um, um jogo por mês. Estamos utilizando a ferramenta Patreon para quem quiser nos ajudar financeiramente. A cada jogo publicado, o Patreon cobra dos financiadores, algo como um mecenato moderno. Porém, todos os jogos são abertos para todo mundo. Quem ajuda, tem acesso a algumas informações sobre bastidores e versões especiais impressas dos jogos.

Portal Uai: Legal. E isso é tudo por enquanto? Você vai para a Campus Party buscar investidores para os jogos?


Encho: Não somente isso... Estou indo para a Campus Party para falar sobre nossos jogos e o Versus, mas também para conversar com blogueiros e outros formadores de opinião sobre nossa iniciativa de discussão e criação de jogos. O mercado de RPG no Brasil há muito tempo está travado, relançando títulos antigos ou novas versões de projetos clássicos; iniciativas como a nossa têm grande potencial. Tem muito acontecendo lá fora e não chega aqui justamente por falta de recursos. Pois, interesse do público, nós já descobrimos que existe sim.