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Após deixar Inhotim, Rodrigo Moura assume setor de arte brasileira do MASP

Curador mineiro quer priorizar áreas pouco valorizadas e criar pontes com o mundo. Ele diz faltar a Minas Gerais museu de arte que mobilize acervos dispersos

Walter Sebastião
O mineiro Rodrigo Moura, que assumiu curadoria do setor de arte brasileira do MASP - Foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press
O mineiro Rodrigo Moura, de 40 anos, é o curador do setor de arte brasileira do Museu de Arte de São Paulo (Masp), um dos mais importantes museus brasileiros. Há duas semanas, passou a integrar equipe dirigida por Adriano Pedrosa, curador geral do Masp, formada por Julieta Gonzalez (arte moderna e contemporânea), Luciano Migliacci (arte europeia) e Rosângela Rennó (fotografia). O momento, explica, é de conhecer a equipe, o museu, as pesquisas e andamento e colaborar no programa da importante instituição, cuja forte identidade foi se apagando com o tempo. “O Masp não é um museu tradicional. A história dele, em diversos aspectos, coloca em tensão o antigo e o novo, de um modo que não se encontra em outros lugares”, elogia. O Masp, criado por Assis Chateaubriand em 1947, tem uma das coleções mais importantes de arte europeia fora da Europa.

“Estou feliz por trabalhar em museu que tem história progressista”, conta Rodrigo Moura, lembrando de inovações na museografia, ações buscando relações intensas com a sociedade, mostras pioneiras, no Brasil, dedicadas à fotografia, design e arte popular. “O Masp oferece possibilidade de cruzarmos a arte brasileira com o realizado em outras partes do mundo”, observa o curador. Ele não esconde que gostaria de ter atenção com artistas como Lorenzato, José Antônio, Artur Pereira, Maria Auxiliadora, Véio, Zé Bezerra, Maria Lira, entre outros, cujas obras, “por hábito viciado, chamamos de arte popular”.
As primeiras atividades serão cuidar de atividades já em andamento: as exposições de Agostinho Batista de Freitas (1927-1997), Portinari popular e um seminário sobre cultura indígena. Todas as ações estão inseridas em programa que, com base no acervo da instituição, sonham coleção mais plural, múltipla e diversa.

“O desejo é abrir e adensar o debate sobre arte brasileira, trazendo, de maneira mais orgânica, artistas que estão fora do cânone ou colocados num gueto”, explica Moura. Exemplos podem ser a obra de Terezinha Soares, a poesia visual e suas diversas variantes, a Arte Postal, as manifestações undergrounds dos anos 1960, 1970 e 1980, a produção moderna e contemporânea de Belo Horizonte. “Todos colocam questões e merecem ser mais e melhor conhecidos do que foram até agora. Hoje, podemos rever, criticamente, verdades fixadas por muito tempo sobre arte, artistas, relações com a vida, o pensamento ameríndio. Precisamos de um contexto mais inclusivo”, argumenta, exemplificando discussões propostas pela equipe do Masp sob comando de Adriano Pedrosa.

A convivência com o Masp vem mexendo com o curador e crítico mineiro. “Falta a Minas Gerais um museu de arte que mobilize acervos hoje dispersos do mesmo modo como o Masp é o de São Paulo, o MAR é o museu de arte do Rio de Janeiro”, argumenta. A coleção de arte do estado de Minas Gerais, pondera, cria base para o projeto. O curador não fugiu de provocações como se pode ver nas respostas abaixo.

Rodrigo Moura é autodidata. No fim dos anos 1990, foi aluno de desenho de Amílcar de Castro e, no momento, estuda filosofia na UFMG. “Arte e curadoria entraram na minha vida pela paixão. Primeiro literatura, música e cinema, depois artes visuais. Família e amigos, artistas e críticos foram os primeiros a me introduzir na arte.
A partir daí, nunca mais parei. A arte salvou minha vida. Trabalho com isso para que mais pessoas possam ter o mesmo privilégio que tive”, conta.

Quatro perguntas para...

Rodrigo Moura
curador

Como você vê o colecionismo público no Brasil?

O Estado brasileiro coleciona mal, é negligente com o colecionar. Existe uma miopia com relação ao tema, que não é questão de governo, mas de Estado. Uma coleção de arte pública não é algo secundário, mas fundamental. Tem o papel de formar gerações, aproximar as pessoas da arte, explicar a nossa experiência como nação. E, nesse sentido, é bom que existam os museus da sociedade civil que conseguem fazer o que os estatais não conseguiram. De todo modo, tem havido avanços como a criação de vários museus em diversas partes do país nos últimos anos.

Quais seriam os aspectos importantes que deveriam merecer consideração quando se fala em coleções públicas?
A falta de uma política pública para museus e coleções. A existência de incentivos fiscais maiores para o desenvolvimento de acervos, uma política de isenção tributária para a importação de bens culturais e obras de arte para o Brasil. É certo uma instituição de interesse público pagar, para trazer uma obra para o Brasil, taxas no valor de 50% da obra? E também buscar alguma unificação de acervos.
Sinto falta, ainda, de uma pactuação entre sociedade civil e governo em que o poder público tivesse o papel de guardador, de fiel depositário de certos acervos.

Você pode falar do papel do visitante?

Não se deve reduzir o tema da arte a um número, pequeno ou grande, de visitantes das exposições, mas o público tem sido um bom parceiro das instituições. Exposições de arte, no Brasil, deixaram de ser uma coisa de elite. O público sabe reconhecer e valorizar, e cobra trabalhos de excelência. A instituição que não faz esse trabalho de excelência fica sem público. É função do museu formar o público e mostrar que o museu pertence, antes de mais ninguém, a ele.

Na sua opinião, como o museu (público ou de interesse público) deve se relacionar com coleções e colecionadores privados ou da sociedadede civil?
A fragmentação, pulverização e acesso incipiente aos acervos é um problema que ainda não foi devidamente equacionado no Brasil. Apenas por meio de instituições museológicas fortes, dotadas de apoio político e de orçamentos confiáveis, isso pode começar a mudar. O principal papel dos museus deve ser colecionar ativamente, mas também reunir acervos, fundos e depósitos de artistas, colecionadores particulares e outras instituições. Cabe ao Estado criar mecanismos de financiamento e de incentivo fiscal mais eficientes para favorecer essa afluência dos bens culturais..