Livremente inspirado em Antígona, espetáculo leva o público a sair de seu conforto

'Antígona: Outra vez tenho vontade de bater em alguém' é apresentado de hoje a domingo e de 10 a 12 de dezembro, no Centro de Referência de Moda

por Shirley Pacelli 04/12/2015 08:00
KIKO FONSECA/DIVULGAÇÃO
(foto: KIKO FONSECA/DIVULGAÇÃO)
Um espetáculo livremente inspirado em Antígona, de Sófocles, mas acima de tudo um teatro político, que leva o público a sair de seu conforto. É essa a proposta de Antígona: Outra vez tenho vontade de bater em alguém, da companhia francesa Pitouch, que estreia hoje em Belo Horizonte. A peça, uma videoinstalação, fica  em cartaz no Centro de Referência da Moda até domingo e de 10 a 12 de dezembro.


Com direção da atriz e diretora chilena Evelyn Biecher, radicada na França, é uma coprodução entre Minas Gerais e Estrasburgo (França). Além da própria diretora, o elenco conta com os franceses Julie Pichavant, Michael Steffan e os atores belo-horizontinos Ana Cândida Cardoso e Jefferson da Fonseca Coutinho.


Coutinho conheceu o trabalho de Evelyn num festival em Cuba, em 2013. Como curador do FIT-BH 2014,  incluiu o espetáculo Frag#3, da Pitouch, na grade do festival. “O teatro dela é político, de revolta, de chamamento do indivíduo, do cidadão para as nossas responsabilidades”, diz ele.

O ator mineiro explica que a montagem atual não traz a conhecida Antígona do teatro grego, mas um trabalho contemporâneo, onde um levante contra o sistema é o mote. Críticas ao poder econômico e público, ao uso de agrotóxicos e à hipocrisia dos modelos de família estão inseridas na produção. “É um levante contra tudo que nos oprime, nos distancia do que é natural”, afirma.

Antígona: Outra vez tenho vontade de bater em alguém ganha em Belo Horizonte seu primeiro formato, mas os artistas envolvidos na montagem pretendem que ela esteja em permanente processo (e liberdade) de criação. A companhia chegou ao Brasil um dia após os atentados de Paris, em 13 de novembro. Uma semana antes, havia acontecido o desastre de Mariana. A comoção estava presente na discussão do texto teatral e essas questões acabaram sendo introduzidas na peça. “Os acontecimentos fortalecem a urgência desse espetáculo”, diz Coutinho.

A apresentação é feita em três idiomas: português, espanhol e francês. “Algumas palavras-chave em português amarram todas as ideias”, afirma o ator. A interpretação, como é usual no trabalho de pesquisa da companhia, exige uma preparação física. O corpo segue o movimento da música e dos ruídos propostos pela direção.

Antígona: Outra vez tenho vontade de bater em alguém
De hoje a domingo e de 10 a 12 de dezembro, às 20h, no Centro de Referência da Moda (Rua da Bahia, 1.149, Centro). Ingressos a R$ 40 (inteira) na bilheteria ou pelo site em www.sympla.com.br. Informações: (31) 3277-4384


TRÊS PERGUNTAS PARA...
EVELYN BIECHER, atriz e diretora


Qual foi a inspiração para a criação do texto do espetáculo? Como o define?
Minha inspiração foi a  sociedade atual. É importante ser capaz de dizer “não. chega!”. Estamos numa espiral de “ter que fazer bem” as coisas, somente para não ser “desaprovados”. Defino o espetáculo como um grito de ajuda  universal. O mundo está muito triste, com coisas difíceis de suportar... Não é melhor adicionar um pouco de doçura, em vez de adicionar mais merda num mundo de merda? Temos de “viver”, não “sobreviver”.

Como serão abordados a tragédia de Mariana e os atentados de Paris?
Mariana e os ataques são terríveis tragédias. Para mim, não há diferença na dor ou na importância. A morte de uma pessoa é equivalente à de todos. Vamos dizer os nomes dos mortos, transformar em terra, terra contaminada com tóxicos, seremos Mariana. Falo dos mortos que precisam de justiça (não confunda com vingança). Como Antígona, aplicar as leis humanas universais, aquelas que não estão escritas. Mariana e Paris, dois exemplos de tragédias que simbolizam todas as tragédias existentes e que existiram.

Qual a importância de tratar dessas questões na arte?
Nós não julgamos ninguém. Vejo a arte como um dever. Meu espetáculo nos dá a oportunidade de gritar. Não o vejo como um divertimento. Quem vier só para rir, não venha.  Temos de seguir em frente sem esquecer o passado. Basta falar sobre a vida, cabe a você escolher um ponto de vista. Talvez goste, talvez não. Abro a janela para você ver o mundo. Isso, para mim, é arte.

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