Tá rindo de quê?

Produção de programas humorísticos vive bom momento no país, mas apostas equivocadas e presença da concorrência via internet fazem com que emissoras busquem alternativas

por Ana Clara Brant 13/09/2015 10:30

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Paulo Belote/Tv Globo
Os comediantes Heloisa Perissé, Marcelo Serrado, Dani Valente e Nando Cunha gravam Tomara que caia (foto: Paulo Belote/Tv Globo)

Desde sua estreia, em 19 de julho, o humorístico Tomara que caia, que vai ao ar todos os domingos após o Fantástico, vem sendo bastante criticado. Não é à toa que tem alcançado uma audiência pífia, com média de nove pontos. Além das gozações sobre o programa que invadiram as redes sociais, muitos espectadores que são clientes da NET notaram que a descrição do programa na operadora estava sendo exibida com a logomarca adulterada para ‘Tomara que saia logo do ar’. A NET esclareceu que foi um erro operacional da empresa responsável por fornecer os dados. No entanto, a atração vai mesmo cair, ou melhor, sair do ar. O último episódio está previsto para 4 de outubro. Segundo a TV Globo, o fim já estava previsto, pois o programa só teria mesmo 12 episódios.

Misturando humor popular, improviso e game show, Tomara que caia, exibido ao vivo e com plateia, não tem agradado nem quem é do ramo. O ator e comediante mineiro Carlos Nunes revela que assistiu à estreia, mas se decepcionou e não animou de ver os demais episódios. “É muito triste saber que aquilo é uma mentira. Falam que é improviso, mas não é. Se fosse assumidamente ensaiado, não seria tão ruim, até porque o elenco é bom. Não gosto de criticar quem faz rir, poque o dom da alegria é algo sublime e fundamental na nossa vida, mas fazer bobagem pela bobagem não rola. Não dá pra assistir a um humor com que não consigo nem gargalhar”, opina.

O mestre em comunicação e professor do Instituto de Comunicação e Artes da UNA Leonardo Gomes Pereira conta que Tomara que caia lhe pareceu um Sai de baixo requentado. Para o pesquisador, até os nomes dos dois programas fazem referência a um mesmo campo semântico: o do alto-baixo e o do sai de baixo que está para cair. “O sucesso deste último no meio da década de 1990 veio, em parte, pelo momento em que a linguagem televisiva ruminava os seus recursos de forma a tornar o backstage um elemento da mise-en-scène. A hibridização e o caráter bricolage do formato – programa de humor da TV gravado ao vivo em um teatro – veio engrossar o caldo de produções que alguns autores chamaram de ‘metatevê’. De programas de humor a jornalísticos e, de maneira ainda mais evidente, nos reality shows, encontramos muitas produções que se fazem no fundo, no backstage e, de preferência, com alguma vinculação indicial com o tempo presente: o real, o agora, o ao vivo”, analisa.

Essa mistura de TV e teatro é a fórmula que o Multishow tem utilizado na maioria dos seus humorísticos. Todo mês, praticamente, o canal a cabo coloca no ar programas nesse formato. Boa parte vai na onda do Vai que cola, sitcom que se passa numa pensão e tem até cenário giratório. A atração conta com grandes nomes da comédia nacional, como Paulo Gustavo, Samantha Schmütz e Cacau Protásio. Em sua primeira temporada, em 2013, alcançou a maior audiência da TV paga nos últimos 10 anos com 11 milhões de espectadores. Em outubro, o Vai que cola estreia sua terceira temporada.

O sucesso motivou a criação de novos programas com os mesmos atores. Paulo Gustavo ganhou 220 volts e Paulo Gustavo na estrada, Marcus Majella, o Ferdinando show, Cacau Protásio, o Trair e coçar é só começar e Samantha Schmütz, Aí eu vi vantagem. Em outubro, será a vez de Fernando Caruso, outra estrela do programa, ganhar a sua atração, o Treme treme na Paulista, que terá a participação de dois comediantes mineiros, Gustavo Mendes e Eraldo Fontiny. Anteriormente, o Multishow já tinha exibido outros teatros televisivos que não tiveram boa repercussão de Ibope e crítica, o Acredita na peruca, liderado por Luiz Fernando Guimarães, e o #Partiushopping, com Tom Cavalcante.
Amos Rodrigues/Divulgação
A personagem Lili, do humorista Eraldo Fontiny, vai integrar o Treme treme na Paulista (foto: Amos Rodrigues/Divulgação)


Leonardo Gomes acrescenta que a “pretensa inovação de linguagem” trazida pelo Sai de baixo já não encanta tanto os nossos tempos. Para o professor, agora “buscamos manipular, interferir”. Ele cita o caso específico de Pânico e CQC, que conquistaram audiência a partir da desconstrução de fatos, pessoas ou personalidades para explorar o ridículo. “O que deu errado? Acho que a falta de sintonia com os espíritos do tempo”, sugere, citando Tudo pela audiência como exemplo de uma vertente possível.

Com 35 anos de carreira, Carlos Nunes diz gostar de Vai que cola, mas considera “exagero” a criação de spin-offs (programas derivados de outras obras). Ele critica o volume de produções e uma certa massificação. “Tudo em excesso é ruim”, frisa.

VANTAGENS Por outro lado, há quem veja a proliferação de humorísticos como positiva e defenda a mescla de TV e teatro. O ator e comediante de Belo Horizonte Eraldo Fontiny, que ficou conhecido na internet pela personagem Lili, a menina aparentemente dócil que não tem papas na língua, vai estrear ao lado de Fernando Caruso no Multishow, no Treme treme na Paulista. “Essa coisa de gravar com plateia permite aquela sensação igual de teatro, de fazer de primeira. A mistura dá um tempero diferente”, diz. Para ele, o humor, sempre muito discriminado, agora está finalmente sendo valorizado.

O colega Maurício Canguçu também elogia as iniciativas, apesar de reconhecer que há muita coisa duvidosa no ar. No entanto, salienta a importância das produções nacionais. “Com o sucesso dos canais da internet, as emissoras pagas, sobretudo, resolveram investir”, diz. Ele defende as cotas para a produção nacional por ampliar o mercado de trabalho do setor. “Para mim, se tem muitos programas de humor, é porque o público quer e o que não tiver qualidade vai acabar saindo fora.”

Sem dúvida, a rede mudou os rumos do humor produzido no país. Dentre os 10 canais mais assistidos no Brasil no YouTube, três são humorísticos. Porta dos fundos é o vice-campeão, atrás do fenômeno Galinha pintadinha, com 10.514.095 inscritos e 1.879.171.970 visualizações desde que foi criado, em março de 2012. O Parafernalha, menos pop, vem em 7º lugar e tem 7.132.966 de inscritos e 852.880.441 visualizações.

Os efeitos das séries feitas para a internet nas emissoras de TV são um fato. O próprio Porta dos fundos, exibido no YouTube, no canal Fox, vai estrear na mesma emissora, e, em novembro, série feita exclusivamente para a TV, O grande Gonzalez. O professor Leonardo Gomes defende que os canais de humor da internet têm suficientes elementos para exigir a readequação de linguagens e de elementos das mídias convencionais. “As emissoras devem ficar atentas a isso como indicativo de demandas sociais para as quais ela passa a propor solução”, conclui.


• NA TV

Aberta

» Chapa quente (Globo)
» Tomara que caia (Globo)
» Zorra (Globo)
» A praça é nossa (SBT)

A cabo

» Vai que cola (Multishow)
» Ferdinando show (Multishow)
» Aí eu vi vantagem (Multishow)
» 220 Volts (Multishow)
» A grande farsa (Multishow)
» Suburbanos (Multishow)

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