Maurício Tizumba negocia ocupação do Mercado de Santa Tereza

Multiartista pretende transformar mercado distrital, desativado desde 2007, em Centro de Referência da Cultura Negra

por Ailton Magioli 04/04/2015 07:00

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Beto Novaes/EM/D. A. PRESS
(foto: Beto Novaes/EM/D. A. PRESS )
O multiartista Maurício Tizumba, de 57 anos, está na linha de fogo cruzado entre poder público e movimentos sociais, mais precisamente entre a Prefeitura de Belo Horizonte e o Movimento Salve Santa Tereza, a Associação Comunitária do Bairro Santa Tereza e a Associação dos Amigos do Bairro Santa Tereza. O ponto da discórdia é a ocupação do mercado distrital do bairro da Regional Leste, desativado desde 2007.


“Apesar de a gente já ter-se posicionado, existe o impasse”, diz ele, a respeito da reivindicação de uso do espaço. Depois da anulação, pelo Ministério Público de Minas Gerais, da eleição virtual que, em 2008, havia selecionado projeto de Tizumba e do Mercado Mundo Mico para a reativação do espaço, o mercado tem tudo para ir parar nas mãos de Tizumba, conforme proposta do prefeito Marcio Lacerda (PSB), que pretende criar no local o Centro de Referência da Cultura Negra, capitaneado pelo artista.

“Não vamos para lá para batucar tambor. Vamos levar parabólicas”, afirma Tizumba, admitindo ser impossível chegar a qualquer comunidade sem pedir licença. “Tenho ideias para a ocupação do mercado que podem até não ser aceitas”, pondera, lembrando que nem tudo autorizado em terreiro alheio está fadado ao sucesso.

ESPAÇO
O interesse do artista pelo espaço remonta à realização da primeira edição do Festival de Arte Negra (FAN), de 1995. “Há dois anos, eu falei com o prefeito que precisávamos de um espaço para a comunidade negra na cidade, assim como os cedidos pelo estado ao Banco do Brasil, à Fiat e a outras empresas que participam do Circuito Cultural Praça da Liberdade”, diz Tizumba. O Circuito Cultural Praça da Liberdade é gerido pela secretaria estadual de Cultura.

Depois de recusar o Mercado da Lagoinha, Tizumba reivindicou da PBH uma casa na Rua da Bahia que, segundo ele diz, também acabou não vingando. “Sei que tudo é difícil, principalmente em se tratando de cultura negra e popular.”

Recentemente, ele e outros representantes do movimento negro divulgaram nota à imprensa, intitulada Nossos Sonhos não Envelhecem – em referência ao livro Os sonhos não envelhecem – Histórias do Clube da Esquina, de Márcio Borges, um dos fundadores do movimento musical mineiro, ao lado de Milton Nascimento.

Assinam a nota, além de Tizumba, Ibrahima Gaye, cônsul honorário do Senegal; Marcos Cardoso, da Coordenação Nacional de Entidades Negras, e Rosália Diogo, do Instituto Cultural Casarão das Artes. Segundo Tizumba, ele resolveu se posicionar publicamente porque a notícia de criação do Centro de Referência da Cultura Negra no Mercado Distrital de Santa Tereza vazou e “muita gente não teria gostado da ideia”.

“Eu conheço muito bem Santa Tereza, que me ensinou a viver”, diz, de maneira carinhosa, citando que Fiemg e PMMG também teriam reivindicado o uso do mercado distrital do bairro, sem sucesso. “Não conseguiram porque o povo de Santa Tereza é forte e, unido, sabe o que quer.” Ele afirma estar em busca do diálogo para uma solução. “O espaço é muito grande. Cabe Santa Tereza e a gente.” A área possui mais de 19 mil metros quadrados, e nela a PBH já planejou criar uma escola técnica, em parceria com a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), proposta também recusada pela população do bairro, recentemente tombado pelo poder público.

“Sou congadeiro, artista popular e sei que o que a gente constrói vai ficar, enquanto a gente passa”, afirma Tizumba, salientando que o desejo dele de participar da criação do Centro de Referência da Cultura Negra no local não é vaidade. “O povo de Santa Tereza poderia ter-se apropriado do espaço e, no entanto, ele está lá fechado.”

Ele aposta na chance de conseguir verba internacional para a criação do Centro de Referência da Cultura Negra em Belo Horizonte. “Vemos a possibilidade de falar com 40 embaixadas da África no Brasil.” Além da cultura afrobrasileira, o mercado passaria a abrigar atividades de gastronomia e tecnologia, assim como outras manifestações artísticas.

Irriquieto, enquanto assiste à disputa entre poder público e movimentos sociais, Tizumba trabalha. No próximo dia 11, ele leva a São Paulo o musical Os saltimbancos, pelo qual ganhou o Prêmio Zilka Salaberry de Teatro Infantil 2010, na categoria de melhor ator, sob a direção de Cacá Mourthé, sobrinha de Maria Clara Machado.

REGIME Paralelamente, comanda todos os sábados à noite, na sede do Tambor Mineiro, no bairro Prado, o projeto Samba Tizumba & Convidados, enquanto planeja emagrecer (pesa 82 kg, atualmente) 15 kg para a disputa de um papel, não revelado, no cinema.

De 12 a 24 de maio, o artista estará à frente da 3ª Mostra Benjamin de Oliveira, no Teatro Oi Futuro – Klauss Vianna, de Belo Horizonte. Idalizador do evento que apresenta elencos de artistas negros, ele diz ter recebido 153 inscrições de todo o país e duas do exterior (América do Sul e África).

Nos últimos anos, Tizumba se dedicou principalmente ao teatro musical de temática negra, tendo atuado em espetáculos como Besouro, O negro, a flor e o rosário e Galanga Chico Rei. Este último, especialmente escrito para ele pelo poeta Paulo César Pinheiro, acaba de ter a trilha sonora gravada em estúdio, sob a direção de Sérgio Santos. O lançamento do CD está agendado para 24 de maio, dentro da programação da Mostra Benjamin de Oliveira.

Além de estudar a possibilidade de remontagem do musical infantil A zeropeia, de Betinho, o multiartista ainda avalia dois convites do exterior. Um de Berlim, na Alemanha, onde já trabalha há quatro anos com o Grupo Tambor Mineiro, e outro da Bulgária. Na sede do Tambor Mineiro, Tizumba coordena aulas do instrumento.

De engraxate a artista

De engraxate a artistaEx-engraxate, lanterneiro e peão de obra, Maurício Tizumba chegou à arte através do amigo Murilo Borges, do bairro Nossa Senhora Aparecida, que lhe ensinou os primeiros acordes de violão.

Daí para o circuito musical da cidade foi questão de tempo, enquanto o teatro lhe chegava, paralelamente, via escola. Em 1988, o então artista iniciante ingressa no Teatro Universitário (TU) da UFMG, integrando-se no mercado profissional a seguir, via musical Hollywwod bananas, de Eid Ribeiro.

Hoje, além de comandar a Companhia Burlantis, Tizumba cursa o quatro ano da faculdade de turismo em uma instituição de ensino particular. “Mexendo com arte, houve um período em que acabei me envolvendo com a secretaria de Turismo e Cultura da Lagoa Santa, onde tenho um cantinho na Lapinha”, revela Tizumba, que acabou se tornando conselheiro de Turismo da cidade. “Além do turismo de cunho religioso (tambor e congado), o meu mundo também envolve o turismo cultural (música e teatro)”, diz o estudante, que vislumbra atuação paralela na área.

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