Burocracia atrasa revitalização dos jardins de Burle Marx no complexo da Pampulha

Joia modernista em Belo Horizonte, obra do paisaigsta pede socorro; prometidas para setembro, as obras foram adiadas para depois do período chuvoso

por Sérgio Rodrigo Reis 13/02/2013 08:24

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Euler Júnior/EM/D.A Press
Relegado ao abandono, projeto paisagístico de Burle Marx já foi ícone do modernismo brasileiro (foto: Euler Júnior/EM/D.A Press)
O complexo da Lagoa da Pampulha reúne algumas das mais belas obras de arte do Brasil, como os painéis de Candido Portinari (1903-1962), na Igreja de São Francisco de Assis, inspirados na Via Sacra; e esculturas de Alfredo Ceschiatti (1918-1989), August Zamoyski (1893-1970) e de José Pedrosa (1915-2002), instaladas no Museu de Arte da Pampulha (MAP). Reconhecidos internacionalmente e bem conservados, esses trabalhos convivem com o estado precário dos jardins de Burle Marx (1909-1994), outra joia do conjunto modernista. Anunciadas pela Prefeitura de Belo Horizonte em meados do ano passado, a restauração e manutenção por cinco anos da obra paisagística que emoldura os prédios de Oscar Niemeyer (1907-2012) foram muito comemoradas. Entretanto, ali apenas começava uma novela.

O festejado projeto que revitalizaria a obra do paisagista e artista plástico Burle Marx, criada no início dos anos 1940, ficou a cargo de Ricardo Lana. Autor do livro 'Arquitetos da paisagem', ele se baseou em documentos, plantas originais e, no caso de espaços dos quais não há registros antigos, em interpretações de fotos, depoimentos, recortes de jornais e revistas.

Arquiteto e urbanista, Lana explica que seu objetivo é fazer renascer no entorno de prédios como o museu, a Casa do Baile e a igrejinha a obra de um dos maiores paisagistas do século 20. Burle Marx, lembra o especialista, inspirou-se nas artes plásticas e na vegetação nativa para criar um paisagismo que rompia com influências internacionais. Entretanto, com dinheiro e projeto de reforma definidos, a iniciativa ainda não saiu do papel por causa da burocracia.

“Quem está perdendo é a cidade. Trata-se de algo importantíssimo, porque se refere a um dos primeiros jardins modernistas do mundo. Burle Marx inova aqui em BH, usando a vegetação de campos rupestres e se adequando totalmente ao espírito modernista”, salienta Lana. De acordo com ele, várias instâncias do poder público retardaram essa revitalização. “Eles não têm deixado o projeto caminhar. Todo mundo dá um palpite”, reclama.

 

O paisagista explica que as obras deveriam ser iniciadas em setembro. Por conta disso, agendas dos equipamentos culturais onde haverá intervenções, como a Casa do Baile e o Museu de Arte da Pampulha, foram modificadas. “O projeto está saindo de graça e abarca tudo: recomposição dos jardins, irrigação, iluminação e mobiliário. Por causa da burocracia, está se perdendo esta oportunidade”, alerta.

Além da ação da Prefeitura de Belo Horizonte e da vontade de Ricardo Lana, contratado como consultor técnico, a revitalização exige uma série de autorizações. Como se trata de intervenção em complexo tombado pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha) e pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), a documentação e a autorização podem demorar meses. Só no Iphan, o projeto tramita desde junho. Não saiu do papel até agora, de acordo com Ricardo Lana, porque a proposta incluía adequações com o objetivo de tornar os jardins aptos ao uso.

“Não estamos discutindo questões específicas ligadas ao paisagismo, pois Ricardo Lana é um especialista reconhecido na área, mas questões formais”, alega Rafael Arrelaro, coordenador técnico da representação do Iphan em Minas. Durante a entrevista ao EM, ele anunciou a aprovação do projeto.

A decisão do Iphan é o sinal verde para a reforma. “Já podem começar”, avisa Rafael Arrelaro à Prefeitura de Belo Horizonte. O projeto original foi aprovado no Iphan com modificações. De acordo com Arrelaro, elas qualificam as intervenções propostas e as justificam. O especialista reconhece a importância da iniciativa. “Recuperados, os jardins poderão atrair novamente a atenção das pessoas para os bens no entorno da orla da Pampulha. Hoje, infelizmente e por motivos diversos, vários deles perderam a atratividade. Além da revitalização dos jardins e do museu de arte, a prefeitura prometeu inaugurar a Casa Kubitschek e despoluir a lagoa. Tudo isso deve trazer qualidade para aquele conjunto”, afirma Arrelaro.

Carlos Henrique Bicalho, diretor de Patrimônio Cultural da Fundação Municipal de Cultura, diz que não há risco de a revitalização não ser realizada. Agora, explica ele, faltam apenas a oficialização da aprovação do Iepha e o fim do período chuvoso. Bicalho atribuiu o atraso à complexidade da operação. “Restauração de jardins modernos não é iniciativa usual. De jardins historicistas, como os ingleses e os franceses, temos muitos exemplos, mas a restauração dos modernos é mais rara. Várias questões tiveram que ser elucidadas antes de o trabalho ser apresentado efetivamente. Os trâmites estão em andamento, mas precisamos respeitar o tempo necessário, pois a iniciativa é complexa”, conclui.

ENTENDA O CASO
A oportunidade de revitalizar e recuperar os jardins criados por Burle Marx na orla da Lagoa da Pampulha surgiu depois de acordo firmado entre a Prefeitura de Belo Horizonte e uma construtora. Como medida compensatória a dano que causou na capital, a empresa concordou em arcar com os custos do trabalho, cerca de R$ 4 milhões. Concluído o projeto, a cargo do urbanista Ricardo Lana, foi necessário obter a aprovação de órgãos municipais, estaduais e federais ligados à área de patrimônio.

 

O início das obras estava previsto para setembro, mas isso não ocorreu devido a entraves burocráticos. A liberação por parte do Iphan só foi confirmada na semana passada, depois de a reportagem do Estado de Minas questionar técnicos do órgão sobre a demora.

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