Mudanças propostas pelo Governo de Minas na Lei de Incentivo à Cultura levantam polêmica no setor

Alterações deixam dúvidas quanto ao futuro da política cultural no estado; não há consenso sobre a redução da contrapartida do setor privado

por Carolina Braga 10/12/2012 09:00

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Beto Magalhães/ EM/ D.A Press
"A redução da contrapartida seria mesmo uma forma de seduzir o empresariado para a parceria?" Carluty Ferreira, produtor (foto: Beto Magalhães/ EM/ D.A Press)
Não há unanimidade sobre a principal mudança proposta pelo governo na Lei Estadual de Incentivo à Cultura. Na semana passada, o governador Antonio Anastasia enviou para a Assembleia Legislativa projeto que reduz os percentuais da contrapartida obrigatória para empresas que deduzem do ICMS recursos destinados ao setor cultural. Se aprovadas, as novas regras vão vigorar nos próximos 10 anos.

Atualmente, funciona assim: se a empresa destina R$ 100 mil a um projeto cultural visando deduzir esse dinheiro do ICMS, poderá abater 80% desse valor. Em contrapartida, é obrigada a tirar do caixa 20% (R$ 20 mil) – recursos não deduzíveis – e aplicá-los diretamente na proposta que selecionou, previamente aprovada pelo estado.

De acordo com o projeto que tramita na Assembleia, a contrapartida não deduzível passará de 20% para 1%, 3% ou 5%, dependendo do faturamento da patrocinadora. A expectativa do governo estadual é de que mais empresas de pequeno e médio porte, inclusive do interior, invistam na cultura por meio da dedução de ICMS.

Ainda que as perspectivas de captação sejam ampliadas, há receio de parte de artistas e produtores atuantes em Minas em relação ao futuro. Sobretudo porque o mecanismo de incentivo cultural, de certa forma, viciou a relação das empresas patrocinadoras com a arte, o consumo do público e até mesmo com esferas governamentais. O poder de decisão sobre produtos culturais a serem oferecidos – com recursos públicos oriundos dos impostos – tem ficado, cada vez mais, a cargo de departamentos de marketing do setor privado. De certa forma, a redução da contrapartida reforça essa realidade.

“O raciocínio da classe é: quanto mais dinheiro agora, melhor. Mas qual o efeito disso? Estimula-se a prática de não investir diretamente na cultura. Se a lei de incentivo acabar, haverá um deserto na arte. O efeito pode ser perverso”, adverte a gestora cultural Karla Guerra.

A produtora Keila Monadjemi acredita que as mudanças vão facilitar a captação, principalmente junto a pequenas e médias empresas. Mas pondera: “Por outro lado, você desestimula o patrocínio direto, algo pelo qual estamos brigando há tempos. Inclusive, já tivemos alguns avanços”.

Rômulo Duque, presidente do Sindicato dos Produtores de Artes Cênicas de Minas Gerais (Sinparc-MG), afirma que o novo projeto chega em momento importante no contexto econômico mundial. “As empresas já não estavam conseguindo fazer frente ao valor real da contrapartida. Acreditamos que com essa mudança o panorama vá mudar radicalmente. Como os valores são praticamente simbólicos, acho que teremos maior demanda pela captação de projetos”, prevê Duque.

DESCOMPASSO

A adequação da Lei 17.615/2008 é reivindicada há muito tempo pelo setor artístico. Nos últimos anos, na mesma medida em que cresceram os inscritos para ter acesso ao mecanismo de incentivo fiscal, aumentou a lista de projetos aprovados pelo governo para captar esses recursos.

No entanto, o número de empresas investidoras não aumentou no mesmo ritmo. Ainda está em torno de 10 a 14 para 1,7 mil projetos/ano. O descompasso torna a captação de recursos cada vez mais difícil.

 “Não sei se a mudança vai sensibilizar as empresas a nos patrocinar. A redução da contrapartida seria mesmo uma forma de seduzir o empresariado para a parceria? O que está impedindo o patrocínio? Serão mesmo os 20%? Ainda há muitas questões a serem discutidas”, afirma Carluty Ferreira, presidente do Movimento Teatro de Grupo.

“Não vou dizer que sou contra, mas também não sou a favor. Gostaria que houvesse mais debate. O setor cultural reúne diversos grupos. É papel do Estado ouvir o maior número de pessoas para tomar as decisões”, propõe Helder Quiroga, coordenador da ONG Contato.


AS MUDANÇAS
CONTRAPARTIDA
Hoje

» Percentual de dedução do
investimento no ICMS devido – 80%
» Repasse direto não deduzível (contrapartida) – 20%

Proposta do governo
» Empresas com faturamento anual
de R$ 3,6 milhões a R$ 14,4 milhões
» Percentual de dedução do investimento no ICMS devido – 99%
» Repasse direto não deduzível (contrapartida) – 1%
» Limite mensal – 10% sobre o valor do ICMS devido, até atingir o limite da dedução

» Empresas com faturamento de R$ 14,4 milhões a R$ 28,8 milhões
» Percentual de dedução do investimento no ICMS devido – 97%
» Repasse direto não deduzível (contrapartida) – 3%
» Limite mensal – 7% sobre o valor do ICMS devido, até atingir o limite da dedução

» Empresas com faturamento superior
a R$ 28,8 milhões
» Percentual de dedução do investimento
no ICMS devido – 95%
» Repasse direto não deduzível (contrapartida) – 5%
» Limite mensal – 3% sobre o valor do ICMS devido, até atingir o limite da dedução

DESCONTO/DÍVIDA ATIVA
Hoje
» Apenas empresas com dívida inscrita até 31 de outubro de 2007 podem abater o débito, por meio de apoio financeiro a projetos culturais

Proposta do governo
» Podem participar contribuintes inscritas em dívida ativa há mais de 12 meses, contados da data de requerimento do incentivador à Advocacia Geral do Estado

Fonte: Secretaria de Estado da Cultura

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