Artistas plásticos e músicos brasileiros falam da experiência de trabalhar em outros países

Criadores estrangeiros também chegam ao Brasil em busca de intercâmbio e novos mercados

por Ailton Magioli 10/11/2012 07:00

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Leandro Couri/EM/D. A Press
O músico português João Pires com a mulher, a atriz Poliana Tuchia, do Grupo Trampulim, prepara disco autoral (foto: Leandro Couri/EM/D. A Press )
Distante da onda nacionalista que levou o romântico Gonçalves Dias (1823-1864) a escrever a Canção do exílio, quando ainda cursava direito em Coimbra, o mundo globalizado e em crise assiste cada vez mais à circulação entre artistas de vários países. O processo tem mão dupla e é incentivado, principalmente, por questões profissionais, o que tem gerado novas experiências estéticas. Que o diga o músico português João Pires. 

De olho na promissora (e crescente) ponte musical Lisboa-Belo Horizonte, ele aportou por aqui há dois anos para produzir coletânea para a ONG Contato e, sob a chancela do Ano de Portugal no Brasil, por meio do qual está excursionando pelo país, acabou fixando-se no país até se casar com a atriz e regente Poliana Tuchia, do Grupo Trampulim e da Orquestra Frito na Hora. Em abril, o casal vai ter o primeiro filho.

“Foi tudo tão rápido. Pensava apenas na possibilidade de fazer uma ponte musical entre Portugal e Brasil. Uma série de fatores, sobretudo profissionais, contribuíram para eu ficar por aqui”, avalia João Pires. Paralelamente, o músico acabou trabalhando mais no país, produzindo outros dois discos, além do primeiro da cantora mineira Laura Lopes. Em meio a tudo, ele ainda gravou (entre os dois continentes) Caminhar, o primeiro disco solo de carreira, que vai lançar em breve.

Acervo pessoal
Claudia Renault levou seu estilo para o ateliê que montou em Portugal: uma escrita feita de materiais desprezados (foto: Acervo pessoal)
Em orientação geográfica inversa à do músico português, a artista plástica e professora da Escola Guignard Claudia Renault matriculou-se, em 2010, em curso de doutoramento (como dizem os portugueses) na Universidade de Coimbra, licenciando-se da instituição brasileira para a especialização em arte contemporânea. “No início, a solidão foi enorme”, revela a artista, estranhando a receptivididade nada gentil dos patrícios, que, em sua opinião, parecem desinteressados em novas amizades.

A exemplo do que fazia em BH, Claudia sai catando (aqui era mais madeira) tudo o que chama a atenção dela (gravetos, vidros, pedaços de tijolos e plásticos), colando o material, que também chama de “escrita”, nas paredes do ateliê, o que gerou a mostra Habitar como poética. Em Portugal, ela aproveita a proximidade para visitar grandes museus e mostras em toda a      comunidade europeia. A crise que assola o continente, diz a artista mineira, se tornou o principal assunto dos últimos tempos. “Os preços sobem e eles agora estão muito aflitos”. A meta de Claudia Renault, no entanto, avisa ela, “é abrir horizontes. Ir mais além”.



Hippie e publicidade


Jackson Romanelli/EM/D. A Press
O cantor e compositor mineiro Leo Minax, radicado na Espanha desde 1987, também tem trabalhos na Dinamarca (foto: Jackson Romanelli/EM/D. A Press )
Na Espanha desde 1987, o cantor, compositor e instrumentista Leo Minax foi em busca do aprofundamento da relação afetivo-familiar que sempre manteve com aquele país, graças à origem, paralelamente à aventura natural de um jovem que acabara de concluir o curso de jornalismo. “Foi uma viagem meio hippie, não havia um objetivo cercado de definições”, confessa o cantor, que, acompanhado da então namorada, saiu de Belo Horizonte um ano antes, via França, sem data prevista para a volta.

Vinte e seis anos depois, com seis discos gravados e profissão definida – é locutor de publicidade naquele país, paralelamente à carreira artística –, Leo admite que o trabalho de cinco anos ao lado do grupo Carnaval Brasil, como violonista e percussionista, foi decisivo para a sua permanência na Espanha. “As protagonistas eram as mulatas e nós viajávamos o país inteiro em condições muito boas”, recorda, salientando que a experiência foi decisiva para ele do ponto de vista da formação musical.

“A essa altura, já tinha entrado com pedido de recuperação da nacionalidade espanhola, já que meu avô não havia registrado os filhos”, acrescenta o músico, hoje detentor da dupla cidadania. “Não só me tornei um artista lá, mas principalmente me tornei um homem lá”, diz, orgulhoso, Leo Minax. Depois de deixar a casa dos pais em Belo Horizonte, na Espanha ele diz que finalmente se “independizou” (ganhou independência), termo e pronúncia, aliás, bem de acordo com o característico portunhol.

Hoje mais liberto em relação à carreira artística, ele garante a sobrevivência graças à publicidade, salientando o fato de os espanhóis fidelizarem as vozes no mercado. “Tem sido uma boa alternativa”, garante o cantor, que, em ano musical sabático na Espanha, diz também ter encontrado mercados alternativos como a Dinamarca, onde, além de um disco, também fez shows no grupo do pianista Steen Rasmussen. No dia 17, ele retorna a Madri. Saudade do Brasil? “O Brasil é família e é praia também. Conheci muito de meu país depois que saí daqui”, conclui.

Ananda Sette Câmara/Divulgação
"Londres é uma cidade que apresenta uma diversidade cultural imensa. Se perco em relação ao espaço físico da casa e do ateliê, ganho em informação e aprendizado", diz a artista plástica, Rivane Neuenschwander. (foto: Ananda Sette Câmara/Divulgação )
De volta  De malas prontas para o retorno, mês que vem, a Londres, onde viveu por quase três anos em momentos diferentes da década de 1990, a artista plástica belo-horizontina Rivane Neuenschwander acredita que a vivência de qualquer outra cultura é um privilégio para qualquer um. “No meu caso, acredito que a nova estada na Inglaterra será fundamental para a formação dos meus filhos”, diz a mãe de um menino de 7 anos e de uma menina de 5, casada com Jochen Volz, um dos curadores de Inhotim, que acaba de assumir, também, a programação da Serpentine Gallery.

“Este é o motivo principal da mudança. Mas como artista plástica, posso trabalhar em qualquer lugar, e tendo uma galeria em Londres, fico mais tranquila em relação à minha situação profissional”, afirma Rivane, salientando o fato de as crianças terem, na escola, contato com outras culturas, outros costumes, outras línguas. “Londres é uma cidade que apresenta uma diversidade cultural imensa, espaços públicos, parques e museus com uma programação intensa e criteriosa. Para mim pessoalmente, se por um lado perco em relação ao espaço físico da casa e do ateliê, por outro ganho em informação e aprendizado”, acredita.

A questão da violência urbana, que também aflige a artista no Brasil, será temporariamente resolvida. “Será muito bom viver em uma cidade da qual podemos realmente desfrutar, sem medo de andar pelas ruas e parques”, justifica Rivane Neuenschwander. Da primeira vez que viveu naquela cidade, em 1996, ela viajou graças a uma bolsa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) para estudar no Royal College de Art por dois anos. Da segunda vez, ganhou uma residência de nove meses no Delfina Studios, uma iniciativa privada de Londres. A artista, que fala inglês fluentemente, conhece a cidade e tem amigos por lá, está confortável em relação à nova mudança.

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