Reportagem de jornalista que se fingiu de prostituta inspira 'Oloture'

Filme nigeriano no catálogo da Netflix trata das redes de tráfico de mulheres para a Europa e é baseado em texto jornalístico

AFP 07/01/2021 04:00
Netflix/DIVULGAÇÃO
Oloture é uma produção nigeriana sobre tráfico de mulheres lançada no catálogo da Netflix em outubro (foto: Netflix/DIVULGAÇÃO)
Na tela, Oloture, a heroína do filme de mesmo nome da Netflix, é uma jornalista que se infiltra em uma rede de prostituição e tráfico de pessoas. Na vida real, Tobore, cuja história inspirou esta produção nigeriana de sucesso, afirma que, após a experiência, ela não é mais que "uma sombra" de si mesma.

Em 2013, Tobore Ovuorie se passou por uma profissional do sexo, após a morte de uma amiga que foi para a Europa se prostituir com uma rede mafiosa. "Quis fazer justiça por ela e contar a história por trás dessas mulheres exploradas" no Ocidente, afirma Tobore, de 39 anos.

Seu objetivo era "ganhar a confiança das prostitutas" para ser apresentada a uma "Madame" – uma das cafetinas traficantes que enviam dezenas de jovens para trabalhar para elas na Europa.

Depois de oito meses de investigação secreta, Tobore Ovu- orie voltou com um relato chocante sobre os maus-tratos das jovens, mas também sobre as orgias organizadas por políticos locais e tráfico de órgãos para crimes rituais.

Pius Utomi Ekpei/AFP
A jornalista Tobore Ovuorie, que se fez passar por prostituta e cuja reportagem num jornal nigeriano deu origem ao filme, em Ikeja, na Nigéria  (foto: Pius Utomi Ekpei/AFP)

ADAPTAÇÃO

Seu relato, publicado em 2014 no jornal nigeriano Premium Times e na revista holandesa Zam Chronicles, inspirou uma produtora na Nigéria, que o adaptou para as telas.

Oloture, que está disponível na Netflix desde outubro passado, teve um grande sucesso internacional para um filme nigeriano, cuja produção de cinema é volumosa, mas não costuma circular para além do continente africano. 

"Oloture fala desses jornalistas que vão tão longe em sua investigação, que terminam sendo eles os protagonistas", afirma o diretor do filme, Kenneth Gyang. "Mas Oloture coloca no mapa principalmente essas mulheres vítimas de tráfico."

O tráfico de mulheres para a exploração sexual é um verdadeiro tormento na Nigéria, especialmente em Cidade de Benin, no Sul do país, que se tornou o centro de recrutamento de mulheres pelas redes criminosas para levá-las à Europa.

É difícil saber quantas, mas apenas na Itália estima-se que entre 10 mil e 30 mil nigerianas estão envolvidas na prostituição, segundo as autoridades.

Dezenas de milhares de outras nunca conseguiram atravessar o Mediterrâneo e estão presas na Líbia ou em outros países da África Ocidental, onde são exploradas pelos traficantes, que as fazem sonhar com a chegada à Europa.

Nas redes sociais, o filme foi alvo de debates, principalmente pelo seu final trágico. "Para a maioria dessas mulheres não existe luz no fim do túnel, então, por que acabar com um final feliz?", diz o diretor.

Na vida real, Tobore conseguiu fugir para a fronteira com o Benin, escapando da vigilância de seus traficantes em meio a uma multidão. Desde então, sete anos se passaram, mas, para ela, a história ainda não terminou. A jornalista agora tenta encontrar as mulheres com as quais iria viajar para a Europa e contar sua vida após a partida.

O combate a essas redes se transformou na grande luta de sua vida, mas a um preço muito alto. "Que efeito essa investigação teve em mim? Não sou nada além da sombra de mim mesma", afirma. "Tento sorrir, ficar feliz, mas a verdade é que, na maior parte do tempo, luto para me segurar na vida."

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