'Minha mãe é uma peça 3' supera 'Star wars' e lidera bilheteria no Brasil

Filme que encerra a trilogia de Paulo Gustavo sobre dona Hermínia soma mais de 7 milhões de espectadores e tem uma renda superior a R$ 115 milhões

Ana Clara Brant 16/01/2020 06:00
Downtown/Paris Filmes/Divulgação
Roteirista de Minha mãe é uma peça 3 destaca talento de Paulo Gustavo e aspecto emotivo do filme como fatores para o seu sucesso (foto: Downtown/Paris Filmes/Divulgação)

“Há muitos anos eu não ia ao cinema. Mas meus filhos fizeram tanta 'pressão' que acabaram me convencendo. E valeu a pena, porque nunca ri tanto. Eu me vi retratada em várias situações desse filme.” O depoimento é da professora aposentada Maria Efigênia Soares, de 68 anos, após uma sessão de Minha mãe é uma peça 3, na tarde da última segunda-feira (13), em Belo Horizonte. Ela é um dos 7.202.167 de espectadores que já assistiram ao título de encerramento da trilogia estrelada por Paulo Gustavo.

Desde que estreou, em 26 de dezembro passado, o longa brasileiro se mantém à frente dos resultados de bilheteria dos blockbusters norte-americanos Frozen 2 e Star wars – A ascensão Skywalker, com arrecadação que já soma R$ 115 milhões em ingressos vendidos. Mais do que isso: o longa também já foi visto por mais gente do que o primeiro título da trilogia, que levou 4,5 milhões de pessoas ao cinema em 2013. É quase certo que seu público também será maior do que Minha mãe é uma peça 2 (2016), até então o recordista da franquia, com pouco mais de 9,3 milhões de espectadores. “Franquia é sempre uma incógnita. Acontece muito de o primeiro ir bem e os demais não. Mas, neste caso, ele só vem evoluindo. A questão da empatia, da identificação, ainda mais numa comédia, podem levar isso longe. E isso é um dos fatores que podem explicar esse fenômeno”, afirma o diretor e produtor de cinema Paulo Sérgio Almeida, fundador do portal Filme B, especializado no mercado cinematográfico.
Para Almeida, outro aspecto essencial para o sucesso do filme é seu idealizador e protagonista: Paulo Gustavo. Além de interpretar, o humorista atua em outras frentes, como produção, roteiro, divulgação e até nas estratégias de lançamento. “Paulo Gustavo é hoje o maior astro do cinema brasileiro e está se aproximando dos grandes campeões de bilheteria no Brasil, que são Os Trapalhões e Xuxa. Não se sabe até onde ele vai, mas ele é muito competente em tudo o que faz. Tem carisma, talento, sabe fazer comédia no timing certo e é, sem dúvida, um astro e um executivo de primeira do cinema”, avalia o especialista.

Quando o filme foi lançado, em 1.456 salas do país, ocupando, portanto, quase a metade das telas brasileiras, Paulo Gustavo declarou ao Estado de Minas que não faz um projeto pensando em bilheteria, apesar de considerá-la muito importante, e que quis que o terceiro longa fosse, sim, o melhor dos três.

“Quis fazer um filme do meu coração para o público curtir, se emocionar. Quis que o terceiro fosse o melhor da trilogia, mas não há esse compromisso com o sucesso de bilheteria. É claro que a gente torce, mas realmente não passa por esse lugar. O segundo foi uma explosão, e a gente não espera que faça a mesma bilheteria agora, apesar de torcer muito. Se ele fizer menos público que o segundo, a gente não vai ficar triste. A gente não está pensando nisso. Estamos, sim, fazendo um projeto lindo”, afirmou.

Susana Garcia, que dirigiu o filme e assina o roteiro junto com Paulo Gustavo e Fil Braz, também afirmou que o desafio da equipe é que a qualidade do terceiro filme superasse a de seus antecessores. “A gente trabalhou profundamente no roteiro e ficamos um ano nisso para contar uma história que fosse engraçada, que emocionasse, que causasse identificação e que fosse à altura do que a Hermínia (personagem principal) merece”, declarou, também na época da estreia.

AMADURECIMENTO

A franquia Minha mãe é uma peça é baseada no espetáculo teatral de mesmo nome, criado e estrelado por Paulo Gustavo. A primeira adaptação para o cinema mostrava Dona Hermínia divorciada do marido (Herson Capri), que a trocou por uma mulher mais jovem (Ingrid Guimarães). Hiperativa, ela não larga do pé de seus filhos Marcelina (Mariana Xavier) e Juliano (Rodrigo Pandolfo), sem se dar conta de que eles já estão bem grandinhos. No segundo longa, a protagonista teve que lidar com a “síndrome do ninho vazio”, já que “as crianças” resolveram sair de casa. Neste terceiro, a protagonista tem que se redescobrir e se reinventar,  porque os filhos estão formando novas famílias. Marcelina está grávida e Juliano (Rodrigo Pandolfo) vai se casar.

“Acho que toda mãe já enfrentou algumas das situações pelas quais a Hermínia passa. É quase universal. Por isso a gente acaba gostando, se identificando. O mais legal é que ainda é pelo olhar da comédia, é engraçado. Achei esse terceiro filme a cereja do bolo”, comentou a dentista Flávia Ferraz, de 43, que já assistiu duas vezes a Minha mãe é uma peça 3.

A comerciante Mariana Martins, de 55, não conseguiu segurar as gargalhadas nas cenas da personagem nos Estados Unidos, em que ela tem dificuldades de se comunicar na alfândega e nos restaurantes pelo fato de não dominar o inglês. “Já passei por aquilo demais. Não sei falar nada de inglês e, toda vez que vou para Miami,  tenho que embromar (risos). Nunca tinha visto nenhum filme dessa franquia, mas adorei. Ele é muito direto, objetivo, e a gente está precisando de se divertir neste mundo que anda tão complicado”, comentou.

O roteirista Fil Braz está no projeto desde o começo. Minha mãe é uma peça 1 foi seu primeiro texto para o cinema. Ele avalia que um dos motivos do êxito da empreitada é falar diretamente com o público, de uma maneira simples e, ao mesmo tempo, interessante. “Paulo Gustavo e eu nos conhecemos desde a adolescência. Somos de uma família de classe média de Niterói, como tantas outras famílias do Brasil. Nós colocamos no roteiro o que nós vivemos. Mas aí descobrimos que é uma coisa que todo mundo vive. Minha mãe... traz um humor muito regional, brasileiro, aquela coisa do nosso jeitinho, da amorosidade, e isso cativa as pessoas”, diz.

Braz afirma que não se surpreendeu com o êxito do terceiro longa. Ele acredita que o fato de já ter uma certa bagagem – é autor de outras comédias cinematográficas, como Tô ryca e Vai que cola, o filme – contribuiu. “Quando escrevi o primeiro Minha mãe é uma peça, eu tinha 31 anos. Vou fazer 40. Paulo Gustavo e eu envelhecemos e amadurecemos, e a gente acaba ficando mais especialista, vai aprendendo. Esse é, sem dúvida,  o filme mais maduro dos três.”

Na opinião do roteirista, a contribuição de Susana Garcia – a única diretora mulher presente na trilogia – foi essencial, com seu olhar feminino e sensível. “E Paulo é um craque, está com um domínio da comédia, da personagem. Ele é fantástico. Além de divertir, o filme está fazendo com que as pessoas se emocionem. Elas veem ali uma verdade, aquela coisa do álbum de família, se enxergam. É bonito, porque está tocando o espectador.”

INCERTEZAS

Apesar de o cinema nacional começar 2020 com boas notícias – o desempenho extraordinário de Minha mãe é uma peça 3, inclusive desbancando rivais estrangeiros, e a indicação de Democracia em vertigem, da diretora mineira Petra Costa, ao Oscar de melhor documentário – tanto Paulo Sérgio Almeida quando Fil Braz se dizem apreensivos em relação ao futuro.

“Está tudo muito confuso, instável. A relação com o governo federal é a pior possível. Os mecanismos de financiamento estão parados. A gente está muito preocupada. É até contraditório, porque você vê filmes nacionais superando os norte-americanos, outros projetos ganhando prêmios em festivais importantes, como Cannes (Bacurau, de Kleber Mendonça Filho e Juliano Dornelles, e A vida invisível, de Karim Ainouz,  foram premiados na mostra francesa em 2019), indicação ao Oscar e temos essa grande interrogação. O que esse governo vai fazer com relação ao cinema e à cultura do país?”, questiona Almeida.

Braz se diz muito atento a tudo o que está acontecendo e lastima o fato de o Palácio do Planalto não apoiar a cultura. “É lamentável tudo isso. É um momento de muita incerteza. Tenho alguns filmes que escrevi,  como as comédias Tô ryca 2 e Os salafrários, que estão prontos para ser lançados, mas os demais projetos a gente não sabe como vai ser. Vamos torcer, porque o cinema brasileiro merece.”

MAIS SOBRE CINEMA