Quanto vale um olhar? No caso de Glenn Close, todos os prêmios a que for indicada por sua arrebatadora performance em 'A esposa'. O longa do sueco Björn Runge, aqui em sua primeira incursão em uma produção falada em inglês, chega nesta quinta-feira (10) aos cinemas brasileiros.
O lançamento vem quente depois de Close arrebatar (com justiça) da favorita Lady Gaga o Globo de Ouro de melhor atriz em filme em drama, no último domingo. Espera-se que esse troféu seja o início de uma sequência (Bafta, Sag Awards) que culmine com o Oscar, ao qual Close, de 71 anos, já concorreu outras seis vezes, sem sucesso.
'A esposa' é um tratado sobre o fim de um casamento. E tudo está descrito no olhar da atriz. Adaptação do romance homônimo da escritora norte-americana Meg Wolitzer (inédito no Brasil), acompanha o casal Joan (Close) e Joe Castleman (Jonathan Pryce).
Já na primeira sequência fica claro quão complexa é a relação. Na cama, Joe, sem conseguir dormir, acorda a mulher. Ela lhe diz que não é hora de sexo, ele afirma que está estressado e que ela não precisa fazer nada, só basta se deitar de lado. Na sequência seguinte, os dois são acordados ainda de madrugada pelo telefonema que Joe tanto queria. É a Academia Sueca informando que ele foi laureado com o Nobel, o prêmio máximo da literatura mundial.
Incrédulo assim que atende ao telefone, Joe pede ao interlocutor licença para a mulher ouvir a conversa na extensão. No minuto seguinte, os dois estão pulando na cama, como crianças. “Ganhei o Nobel! Ganhei o Nobel!”, grita Joe. Mesmo acompanhando-o nessa explosão infantil, o jeito de Joan mostra que há algo errado. São gritos silenciosos que o olhar de Glenn Close expressa a partir desse momento. O casal e o filho mais novo, David (Max Irons), embarcam para Estocolmo para uma curta temporada que inclui todo o ritual que precede o Nobel.
“Minha esposa não escreve, graças a Deus.” É dessa maneira que Joe apresenta Joan aos colegas laureados. Ela assente a todos com um sorriso educado (crispado, se olharmos com atenção), ora limpando a sujeira da barba do marido, ora lembrando-lhe o nome de uma personagem célebre de seus romances.
Em dado momento, quando lhe perguntam o que faz, Joan deixa a serenidade de lado e diz: “Sou uma fazedora de reis”. A resposta está ali, veremos mais tarde. No meio do grupo do Nobel está o aspirante a biógrafo Nathaniel Bone (Christian Slater), que há anos tenta convencer Castleman a conceder-lhe entrevistas. O homem nega veementemente – mas Bone fez o dever de casa e acaba conseguindo que Joan converse com ele. O biógrafo sabe mais do que deveria.
DEPENDÊNCIA
Intercalado com os preparativos do Nobel, assistimos ao início do romance entre Joe e Joan, nos anos 1950 e 1960. O jovem casal, ele professor de literatura (Harry Lloyd), ela sua aluna na universidade (papel de Annie Starke, filha de Glenn Close), envolve-se numa relação de dependência mútua. Casado, ele abandona mulher e filho para ficar com a moça – o relacionamento vai lhe custar também a carreira acadêmica em uma universidade de primeiro time.
Com as cartas na mesa, o espectador só tem a acompanhar a evolução da narrativa. Sabiamente, Björn Runge dá todo o espaço para a dupla de protagonistas brilhar em longas tomadas. A maneira como Joan aquiesce perante todos os abusos do marido (flertar descaradamente com a fotógrafa do evento, colocar a mulher de lado sempre que a situação pede) não deve ser subestimada.
Joan, como “fazedora de reis”, vai se mostrar, ao final da narrativa, muito maior do que o marido e os que o cercam. E Glenn Close faz isso de maneira sutil, com economia de gestos. Seu olhar, desdobrado em vários, acaba mesmerizando a plateia no incômodo e intenso relato sobre os desgastes da vida a dois.
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'A esposa' é um tratado sobre o fim de um casamento. E tudo está descrito no olhar da atriz. Adaptação do romance homônimo da escritora norte-americana Meg Wolitzer (inédito no Brasil), acompanha o casal Joan (Close) e Joe Castleman (Jonathan Pryce).
Já na primeira sequência fica claro quão complexa é a relação. Na cama, Joe, sem conseguir dormir, acorda a mulher. Ela lhe diz que não é hora de sexo, ele afirma que está estressado e que ela não precisa fazer nada, só basta se deitar de lado. Na sequência seguinte, os dois são acordados ainda de madrugada pelo telefonema que Joe tanto queria. É a Academia Sueca informando que ele foi laureado com o Nobel, o prêmio máximo da literatura mundial.
Incrédulo assim que atende ao telefone, Joe pede ao interlocutor licença para a mulher ouvir a conversa na extensão. No minuto seguinte, os dois estão pulando na cama, como crianças. “Ganhei o Nobel! Ganhei o Nobel!”, grita Joe. Mesmo acompanhando-o nessa explosão infantil, o jeito de Joan mostra que há algo errado. São gritos silenciosos que o olhar de Glenn Close expressa a partir desse momento. O casal e o filho mais novo, David (Max Irons), embarcam para Estocolmo para uma curta temporada que inclui todo o ritual que precede o Nobel.
“Minha esposa não escreve, graças a Deus.” É dessa maneira que Joe apresenta Joan aos colegas laureados. Ela assente a todos com um sorriso educado (crispado, se olharmos com atenção), ora limpando a sujeira da barba do marido, ora lembrando-lhe o nome de uma personagem célebre de seus romances.
Em dado momento, quando lhe perguntam o que faz, Joan deixa a serenidade de lado e diz: “Sou uma fazedora de reis”. A resposta está ali, veremos mais tarde. No meio do grupo do Nobel está o aspirante a biógrafo Nathaniel Bone (Christian Slater), que há anos tenta convencer Castleman a conceder-lhe entrevistas. O homem nega veementemente – mas Bone fez o dever de casa e acaba conseguindo que Joan converse com ele. O biógrafo sabe mais do que deveria.
DEPENDÊNCIA
Intercalado com os preparativos do Nobel, assistimos ao início do romance entre Joe e Joan, nos anos 1950 e 1960. O jovem casal, ele professor de literatura (Harry Lloyd), ela sua aluna na universidade (papel de Annie Starke, filha de Glenn Close), envolve-se numa relação de dependência mútua. Casado, ele abandona mulher e filho para ficar com a moça – o relacionamento vai lhe custar também a carreira acadêmica em uma universidade de primeiro time.
Com as cartas na mesa, o espectador só tem a acompanhar a evolução da narrativa. Sabiamente, Björn Runge dá todo o espaço para a dupla de protagonistas brilhar em longas tomadas. A maneira como Joan aquiesce perante todos os abusos do marido (flertar descaradamente com a fotógrafa do evento, colocar a mulher de lado sempre que a situação pede) não deve ser subestimada.
Joan, como “fazedora de reis”, vai se mostrar, ao final da narrativa, muito maior do que o marido e os que o cercam. E Glenn Close faz isso de maneira sutil, com economia de gestos. Seu olhar, desdobrado em vários, acaba mesmerizando a plateia no incômodo e intenso relato sobre os desgastes da vida a dois.