Decisão de uma mãe sobre o futuro da gravidez é tema central do longa Invisível

Diretor Pablo Giorgelli fala sobre o que o motivou a dirigir o filme, que está em cartaz em BH

Breno Pessoa
Mora Arenillas interpreta a protagonista Ely, que tem 17 anos e se descobre grávida - Foto: VITRINE FILMES/DIVULGAÇÃO

No momento em que se discute no Brasil a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 181/2015 que pode proibir todas as formas de aborto no país, a decisão de uma mãe sobre o futuro da gravidez é tema central de Invisível, longa argentino em cartaz em Belo Horizonte (Cine Belas Artes 3, 19h50). Dirigido por Pablo Giorgelli, o filme acompanha as inquietações de Ely (Mora Arenillas), adolescente de 17 anos grávida e propensa a abortar a criança não planejada.


Ganhador do prêmio Caméra d’Or no Festival de Cannes por As acácias (2011), Giorgelli retorna à direção em um drama mais contido, com poucos e essencialmente breves diálogos e ausência de trilha sonora. “Quis fazer um filme simples, direto, sem truques, sem voltas narrativas ou elementos formais. Não queria coisas que distraíssem o foco”, afirma.

Assim como no Brasil, o aborto é proibido na Argentina, e Ely trilha um caminho comum a muitas mulheres dispostas a interromper a gravidez. Mas essa é só uma entre várias camadas de problemas existentes na vida da personagem, desde a falta de condições financeiras ao isolamento social e desamparo afetivo. Também é um filme sobre escolhas. A seguir, Giorgelli fala sobre como fez as suas escolhas para o filme.

Em As acácias, uma das personagens centrais é mãe acompanhada da criança pequena. A maternidade é um tema importante para você?

Não é coincidência, é um tema que, neste momento da minha vida, parece central.

Creio que é um pouco maior o assunto que me interessa, tem a ver com família. As relações familiares me parecem motivo suficiente para encarar esse problema que é fazer um filme. Produzir um filme é uma coisa que me faz sofrer, me toma muito tempo e consome muita energia física, emocional e financeira, até porque, durante todos os anos (de desenvolvimento do filme) tenho que trabalhar em outras coisas. Então, tenho que ser certeiro na escolha do tema com que quero trabalhar. Sempre que aparece o assunto da questão familiar, me interesso mais.


Seu ambiente familiar interferiu, de alguma maneira, na concepção das obras?
As acácias é um filme que teria mais a ver com paternidade do que com a maternidade. O personagem principal é um caminhoneiro em conflito com a paternidade. Em retrospecto, percebo que esse filme coincide com a época em que meu pai morreu e eu mesmo ainda não era pai. Depois de As acácias tive duas filhas. Agora, tenho uma família só de mulheres: minha mãe, minha esposa, minhas duas filhas e minha cunhada. Essa família que tenho agora me surpreende um pouco.

E é também um filme sobre a adolescência.
Tinha interesse de abordar a adolescência e, para minha surpresa, o personagem que me veio era feminino. Decidi seguir essa intuição e tentar descobrir para onde a história ia. A princípio, nunca sei para onde ela caminha, não tenho ideia. É um processo de descobrir como será esse filme e vou trabalhando em diferentes camadas.

De um lado, trabalho com minhas próprias ideias e lembranças, do outro, há também uma pesquisa.

Quais aspectos mais interessantes desse processo de pesquisa?

Uma coisa que me chamou a atenção durante a pesquisa para o filme foi a quantidade de adolescentes de classes mais baixas que, diante de uma gravidez indesejada, optam por ter os filhos. Eu não entendia, a princípio. Custei a entender a explicação: jovens que têm pouca perspectiva de futuro, que vivem em locais com péssimas condições ou em situação de invisibilidade, tomam essa decisão como um modo de se proteger, de encontrar uma identidade. As mães sempre são respeitadas em comunidades. É quase inconsciente, instintivo.

Do que se trata o “invisível’ do título?
O invisível são muitas coisas. Primeiro, é sobre contar a vida de uma pessoa anônima, comum, como todos nós. Invisível é ser esse adolescente que não se vê, que o mundo adulto não vê. É o contexto político e social que está presente o tempo todo e não se vê. O filme trabalha muito com aquilo que não se vê. E, finalmente, eu, como diretor, me faço invisível para que o filme aponte para Ely.

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