'Mapas para as estrelas' constrói retrato apavorante dos subterrâneos de Hollywood

Filme de David Cronenberg amontoa tramas e personagens para criticar o culto às celebridades

por Mariana Peixoto 19/03/2015 08:15

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Caitlin Cronenberg/Paris Filmes/Divulgação
Julianne Moore, em cena de 'Mapas para as estrelas', que lhe rendeu prêmio de interpretação no Festival de Cannes (foto: Caitlin Cronenberg/Paris Filmes/Divulgação)
Havana Segrand é a versão feminina de Riggan Thomson. Para ambos, os dias de glória em Hollywood ficaram no passado. Esperam, ou melhor, têm convicção de que vão conseguir se reerguer com novos projetos.

As semelhanças entre Riggan, interpretado por Michael Keaton no oscarizado 'Birdman', e Havana terminam aí. Porque a personagem vivida por Julianne Moore (que levou por ele, com muita justiça, o prêmio de melhor atriz no Festival de Cannes de 2014) é cria de David Cronenberg. E a lente sempre distorcida do diretor canadense nos brinda, em 'Mapas para as estrelas', que estreia nesta quinta-feira, com um retrato absolutamente aterrador de Hollywood.

A partir de um núcleo de personagens disfuncionais, Cronenberg nos apresenta histórias inverossímeis numa olhada rápida. Mas, observando com cuidado, tudo no filme faz sentido (ainda que um sentido muito torto).



Mesmo já tendo passado há muito dos 40, Havana acredita que pode interpretar o papel que foi definidor da carreira de sua mãe. Um detalhe: a mãe, morta há muitos anos, era uma garota quando o interpretou. Fazendo todo tipo de esforço para conseguir ser escalada, ela vive às voltas com a terapia nada convencional de Stafford Weiss (John Cusack), estrela da autoajuda.

Weiss é casado com Cristina (Olivia Williams), que está fazendo o que pode para que o filho Benjie (Evan Bird), astro mirim de 13 anos, retorne à carreira, depois de passar por reabilitação.

Completando o quadro, Agatha (Mia Wasikowska), garota com metade do corpo queimado, chega a Hollywood vinda da Flórida, disposta a se encontrar com o próprio passado. O primeiro amigo que faz é Jerome (Robert Pattinson), aspirante a ator que paga as contas como motorista de limusine. É a chegada de Agatha a Los Angeles que detona a narrativa.

O roteirista Bruce Wagner mostra quão pequena – nos dois sentidos – é Hollywood. Todos se conhecem, dependem de favores, tentam passar a perna uns nos outros. Ninguém se gosta. E todos fingem gostar uns dos outros.

Com diálogos mais do que afiados, assistimos a um desvario de egos. Benjie, que conheceu o sucesso muito cedo – e ganhou milhões com ele – se ressente sobremaneira de um menino mais novo, coadjuvante que está lhe roubando a cena num novo filme.

Julianne Moore vai a extremos na interpretação de Havana. Protagoniza cenas absurdas, sem nunca errar a dose. Na terapia com Weiss, somente com roupa íntima, a encenação de Cronenberg dá a sensação de que a atriz está sendo currada pelo terapeuta. Consegue até mesmo fazer humor com necessidades fisiológicas.

Ao espectador, resta olhar para o ninho de cobras com um sorriso no rosto. É improvável? Em mais de um momento, sim. Há um certa dose de exagero? Certamente. Mas, a partir do circo de Hollywood, que conhece muito bem, Cronenberg faz um retrato satírico da essência do ser humano, elevada à décima potência.

Maestro da perversão, o diretor rege seus personagens para um final apavorante e, ao mesmo tempo, apoteótico. E sem deixar pontas soltas, como em seu filme anterior, 'Cosmópolis' (2012).

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