“Eu tenho vergonha das pessoas. Tenho medo de gente. Música para mim foi uma fuga da minha incapacidade de viver socialmente com as pessoas”
“Meu trabalho é difícil de ser popular, mas eu sei que pelo jeito de eu falar, por meu jeito de ser, rola identificação com qualquer pessoa. Sou uma pessoa muito simples. Eu quero o que todo mundo quer. Eu quero é ser feliz. Quero sentar, rodar e gozar igual a todo mundo”
As declarações acima, reunidas por Paulo Henrique Fontenelle no documentário 'Cássia', contribuem para dar contornos à personalidade de Cássia Eller e revelam a estrela do rock nacional em estado bruto. O filme, exibido como hors concours em sessão de gala do Festival de Cinema do Rio de Janeiro, no último dia 6, chega ao circuito comercial em janeiro próximo. “Adoraria fazer o lançamento em Brasília, ponto de partida da carreira da nossa heroína”, diz o diretor, que assina outras produções do gênero, como o premiado 'Loki', sobre o eterno mutante Arnaldo Baptista.
Na realização de Cássia, Fontenelle colheu depoimentos de pessoas que fizeram parte da vida da roqueira, entre as quais a jornalista Deborah Dornellas, o crítico musical Tárik de Souza, os artistas Oswaldo Montenegro, Zélia Duncan, Nando Reis e Dora Galesso e, obviamente, a companheira Maria Eugênia e o filho, Chicão.
“Sempre admirei Cássia, mas não a conheci pessoalmente. Quando, em 2010, tive a ideia de fazer o documentário e passei a realizá-lo, me senti íntimo dela. A primeira pessoa que procurei para falar da minha decisão foi Eugênia, que me deu carta branca para levar adiante o projeto. Ela estabeleceu apenas uma condição: que fossem focalizadas todas as facetas de Cássia, sem nenhum tipo de restrição”, conta Fontenelle.
Arrepio
Ao cineasta, Eugênia disse: “No palco, eu tinha a sensação de que ela recebia um santo, mesmo. Era uma coisa doida aquilo ali! Cássia se transformava, não era a mesma pessoa”. Vai mais ou menos nessa linha o depoimento colhido de Deborah Dornellas, produtora da cantora, no início da carreira. “A lembrança que não me sai da memória é a de Cássia no palco. Quando ela começava a cantar, eu ficava toda arrepiada. Como é que ela conseguia cantar com aquela voz, com aquela emoção?”, diz.
Bastidores de momentos tristes da biografia da cantora também são destacados no filme. Um deles é a exaustiva especulação em torno da morte da cantora— não faltou quem atribuísse a uma overdose de drogas. O outro é o da luta de Eugênia para manter a guarda de Chicão. O pais de Cássia haviam entrado na Justiça para obter a guarda do neto, à revelia do restante da família. A vitória da companheira da artista se transformou em emblema, por ter reconhecidos os direitos de um casal homossexual no país.
Produzido pela Migdal Filmes, em parceria com o canal de tevê GNT, o documentário, que será distribuído pela H2O Filmes, ficou pronto somente em setembro último. “Conseguimos imagens raras de Cássia, em seu ambiente familiar, principalmente as dela com o filho, Chicão, e de shows e espetáculos de teatros em Brasília, antes da fama e do sucesso”, anuncia Fontenelle.