Duas horas antes do início da sessão de 'Scarface – A vergonha de uma nação', a secretária executiva Giselda Prazeres já aguardava na bilheteria do Cine Humberto Mauro. E ela nem era a primeira. “Vai dar fila. Dependendo do filme, às vezes você não consegue nem pegar o ingresso. Vem muita gente”, conta. Desde que começou a mostra dedicada à cinematografia do americano Howard Hawks, em 12 de abril, esta tem sido a rotina de Giselda. “Vejo de dois a três filmes por dia”, conta.
Até domingo, quando termina a maratona, Giselda pretende ainda ver algumas raridades. 'O último caso de Trent' e 'A patrulha da madrugada', por exemplo, são cópias originais, respectivamente de 1929 e 1930, preservadas pela Biblioteca do Congresso Americano. Os longas serão exibidos amanhã. Hoje, o destaque da programação é um dos mais antigos exemplares da filmografia: 'Enquanto os maridos se divertem', de 1927.
Para os habitués da mostra, durante todo o período foram poucos os motivos para reclamar. “Se for para melhorar, a sugestão que dou é para cumprir os horários. Às vezes, também, alguns filmes estavam sem legenda”, criticou o professor Mendel Szarajbaman. De acordo com Rafael Ciccarini, de fato houve problema com a tradução de dois longas, que depois foram reprisados.
“Notadamente, são filmes mais antigos, que até vi na adolescência. De toda forma, está muito bem aceito, porque a frequência tem sido ótima”, confirma o aposentado Sebastião Luiz Rocha. Também frequentador assíduo, ele não tem do que reclamar. Há pelo menos três anos é fácil encontrá-lo nos arredores do Palácio das Artes. Conferiu os clássicos de Carlitos e viu pelo menos quatro obras de Hawks.
Mostras sempre foram a marca registrada do Humberto Mauro. O que tem feito a diferença é a exibição integral de trabalhos criadores essenciais. Depois de Luís Buñuel (1900-1983), Charles Chaplin (1889-1977) e Howard Hawks (1896-1977), sir Alfred Hitchcock (1899-1980) será o nome do segundo semestre. Como o público tem respondido à altura, a tendência é que cada vez mais mostras desse calibre ganhem lugar na programação do espaço.
88 sessões
6.168 pessoas até o dia 6/5
40 filmes
4 debates
1 curso
Mostra Howard Hawks
Programação
Sexta
15h – A noiva era ele (1949)
17h – Levada da breca (1938)
19h – Enquanto os maridos se divertem (1927)
21h – Bola de fogo (1941)
Sábado
14h – A patrulha da madrugada (1930)
16h – Debate com Geraldo Veloso (cineasta/MG), André Setaro (crítico/BA) e Bruno Andrade (pesquisador/SC), com mediação de Rafael Ciccarini.
18h30 – O proscrito (1943)
20h30 – O último caso de Trent (1929)
Domingo
16h – Uma aventura na Martinica (1944)
18h – Faixa vermelha 7000 (1965)
20h – O esporte favorito dos homens (1964)
Cine Humberto Mauro do Palácio das Artes, Av. Afonso Pena, 1.537, Centro. Entrada franca. Os ingressos podem ser retirados meia hora antes de cada sessão.
Orquestra ao vivo e 3D
Entre 31 de julho e 7 de setembro, serão exibidos pelo menos 54 filmes e séries dirigidos ou produzidos pelo mestre do suspense. A abertura, já marcada para o Grande Teatro do Palácio das Artes, será com o filme mudo 'The plesure garden' (1925), com trilha sonora executada ao vivo pela Orquestra Sinfônica de Minas Gerais. “Inclusive com a vinda do Daniel Patrick Coen, compositor inglês que trabalhou com Hitchcock. Ele vem para ensaiar junto com o maestro”, adianta Ciccarini.
Como o Cine Humberto Mauro tem capacidade de público muito pequena, Rafael Ciccarini planeja expandir a programação para outras áreas do Palácio das Artes e até mesmo ampliar os horários. Pode ser que a grade de atrações comece às 11h. “A ideia é fazer uma concentração de Hitchcock”, anuncia o curador.
Rafael Ciccarini sabe que quanto mais oferece, mais será cobrado. Como aquecimento para a mostra de Hitchcock, realizará outras exibições que cairão nas graças do público especializado. Entre 13 e 23 deste mês, estarão em destaque criações do norte-americano Robert Altman. Além dele, estão previstas exibições integrais das obras dos franceses Jean Vigo (1905-1934) e Maurice Pialat (1925-2003). “Serão todos os longas, curtas e séries de TV. O Pialat não é conhecido do grande público, mas durante muito tempo os cinéfilos anseiam por uma mostra dedicada a ele”, diz Rafael.
O curador observa que o Cine Humberto Mauro tem conquistado novas audiências. “Trazemos um público com Hawks, não conseguimos reter todo mundo, mas parte dele volta para o Pialat e assim vamos formando”, analisa. Foi o caso do pesquisador de opinião Antônio Tadeu. Há cerca de três meses ele descobriu que podia ver os filmes que gosta de graça. Agora, sempre que pode, está na plateia e ainda com o olhar crítico. “O Hawks é um diretor diferente da nossa época. É de um período que não tinha muito recurso, mas era extremamente criativo. O que tenho sentido é que ele apresentou muitas novidades de criação e na direção”, analisa Antônio Tadeu.
Voz do público
“O conjunto da obra chamou a atenção. Hawks deixou a marca como diretor de cinema porque abordou todos os gêneros. Mostrou ser um gênio da direção” - Giselda Prazeres, secretária executiva
"É uma volta ao passado, um tempo que não vivemos, outras técnicas de interpretação. Estou cansado de efeito especial
com computador. Estou me deliciando com isso aqui" - Mendel Szarajbaman, professor de física
"Gosto muito desses filmes antigos e, neste caso, estão em bom estado, dá para assistir tranquilamente. Chamou-me a tenção a qualidade e a quantidade" - Carmem Santana, bancária
"É uma grande iniciativa, porque foi a primeira mostra integral no Brasil. Como o crítico Inácio Araújo comentou, nós mineiros estamos tendo a oportunidade de ver em um mês o que ele demorou anos para ver" - Jefferson Assunção, cineasta