Polêmica em torno do filme Ted chama a atenção para o processo de classificação

Filme que incomodou o deputado Protógenes Queiroz

por Carolina Braga 29/09/2012 12:17

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Arte sobre imagem de divulgação
(foto: Arte sobre imagem de divulgação)

A culpa foi da sinopse? Ou teria sido de uma interpretação equivocada? O deputado federal Protógenes Queiroz (PC do B – SP) protagonizou esta semana uma história cheia de mal-entendidos. Ao escolher o filme para assistir com o filho de 11 anos, foi atraído pelo “mimoso” urso de pelúcia Ted, que dá nome ao longa dirigido por Seth MacFarlane. Porém, a singela trama sobre um garotinho que pede às estrelas que o presente de Natal ganhe vida é, na verdade, uma comédia extremamente crítica sobre adultos que recusam as responsabilidades da vida adulta.

Sim, um urso é um protagonista, mas ele é da pesada. Ou seja, bola fora do pai. Mais ainda porque a classificação do filme não está de acordo com a idade do garoto. “Acho que não tem nada a ver. A indicação do filme já é 16 anos. Está adequado para essa idade”, comentou o espectador Wallace Rodrigues. O estudante Felipe Souza Castro concorda: “Não entendi direito a polêmica, porque a classificação está adequada para a comédia”. “Gostei bastante e acho que a idade está certa. É polêmico, mas dá para pensar sobre o filme”, completa Gabriela Goulart, de 16. Ao que parece, o deputado pulou uma etapa básica quando o tema é cinema e criança: desconsiderou a classificação indicativa de Ted.

No Brasil, essa é uma atividade do Ministério da Justiça, precisamente do Departamento de Justiça, Classificação de Títulos e Qualificação. É uma competência determinada pela Constituição Federal de 1988 e que, desde então, tem sido afinada por meio de portarias. Como o próprio nome diz, trata-se de uma indicação prévia, feita por profissionais especializados, que tem o objetivo de auxiliar pais e educadores. “A razão da existência de uma classificação indicativa é proteger a criança e o adolescente”, explica Davi Pires, diretor-adjunto do departamento responsável pela tarefa.

 

Confira o Guia Prático de classificação indicativa do Ministério da Justiça

 

A dinâmica de classificação é diferente para programas de televisão e cinema, por exemplo. No primeiro caso, a emissora inscreve o processo no Ministério da Justiça já com uma autoclassificação. A partir da estreia, o programa será monitorado e a faixa etária é confirmada ou não. Já no caso de filmes, jogos eletrônicos e role-playing game (RPG), as obras devem ser encaminhadas previamente para análise, com a informação sobre a classificação pretendida.

Os critérios que vão determinar se um filme é recomendado ou não para menores de 10, 12, 14, 16 ou 18 anos (as idades que fazem parte da classificação no Brasil) são públicos e divulgados pelo Ministério da Justiça. O Guia prático da classificação indicativa esclarece como a classificação é feita e todos os detalhes que são levados em consideração. Os principais pontos observados são cenas de violência, drogas, sexo e nudez. Por trás desses grandes temas há ainda vários níveis de detalhamento, acompanhados de exemplos. “Esses critérios são predefinidos, públicos e estão à disposição de qualquer cidadão. Nos últimos anos, nos esforçamos para objetivá-los, porque isso não deve ser segredo para ninguém”, ressalta Davi Pires.

Contexto Assim que uma obra audiovisual é apresentada ao Ministério da Justiça para classificação, ela é distribuída para três profissionais. “Usualmente, fazemos com que todas as obras sejam classificadas por mais de uma pessoa. Essa medida evita que se tenha exclusivamente um olhar em relação ao filme, por exemplo. Se em um grupo de três pessoas não houver acordo, ampliamos a consulta. Já tivemos casos de mobilizar praticamente todo o nosso quadro”, explica Davi. Foi o caso do curta The lastnote.com, dirigido por Leonardo Falcão, com Lázaro Ramos no elenco. O tema do filme é o suicídio.

“Há algumas nuances que são importantes, não é apenas a ocorrência ou não dos critérios definidos na legislação. Existe uma análise de contexto que também é importante. Uma cena de sexo, por exemplo, pode aparecer desfocada, ser uma nudez velada ou sem qualquer erotismo. Tudo tem o seu contexto”, pondera. O guia, segundo Davi, também serve como ferramenta para dar margem à diferença de olhares.

A dinâmica de classificação é muito variada ao redor do mundo. A razão para isso é simples: trata-se de atividade que depende – e muito – da cultura de um povo. “Temos sociedades muito diferentes. Os Estados Unidos, por exemplo, são mais tolerantes com a violência e intolerantes com nudez e sexo. Aqui, por sua vez, somos mais permissivos em relação a isso”, comenta o diretor. Um bom exemplo é o filme Capitalism: A love story, do documentarista Michael Moore, que nos EUA foi classificado para maiores de 17 e no Brasil ganhou a indicação livre.

Com Ted, curiosamente, houve certa padronização. Nos Estados Unidos, o filme foi classificado como R, ou seja, de acesso restrito, o que obriga menores de 17 anos a estarem acompanhados dos pais ou responsáveis legais. A mesma medida vale no Brasil: acompanhados do pai, mãe ou responsável legal, crianças e adolescentes podem assistir a quaisquer filmes ou produções culturais, desde que a classificação indicativa seja até 16 anos. Quando o filme é indicado para maiores de 18 anos, a entrada de menores é proibida. A classificação do Ministério da Justiça só pode ser alterada por decisão judicial.


Classificação no mundo

>> Argentina
A Comissão Assessora de Exibição Cinematográfica (Caec) é a entidade responsável pela classificação, formada por um profissional licenciado em psicologia, psicopedagogia ou ciência da educação; um crítico de cinema indicado pela Secretaria de Cultura; e um advogado proposto pelo ministro do Interior. São cinco categorias: recomendável para o público infantil (apto para todos), apto para maiores de 13 anos, apto para maiores de 16 anos, apto para maiores de 18 anos, apto para maiores de 18 anos com exibição condicionada.

>> Espanha
A classificação é feita pelo Instituto da Cinematografia e das Artes Audiovisuais, órgão autônomo do Ministério da Cultura espanhol, ou pelas autoridades competentes das Comunidades Autônomas, como a Catalunha. São seis categorias–(especialmente recomendada para a infância, para todos os públicos, não recomendada para menores de 7 anos, não recomendada para menores de 13 anos, não recomendada para menores de 18 anos, filme X (caráter pornográfico ou que fazem apologia da violência)

>> Portugal
Classificação feita pela Comissão de Classificação de Espectáculos. Os menores de 3 anos não podem assistir a quaisquer espetáculos públicos, mas menores podem assistir às obras classificadas para faixa etária superior, desde que acompanhados pelos pais ou outros responsáveis, devidamente identificados. São cinco faixas etárias: para maiores de 4 anos; 6 anos; 12 anos; 16 anos; 18 anos.

>> Estados Unidos
A Associação de Cinema da América (MPAA) é formada por representantes da sociedade civil. A classificação é feita a partir da análise do tema, linguagem, violência, nudez, sexo e uso de drogas. As categorias são as seguintes: general audiences (G), livre para todas as idades; parental guindance suggested (PG), partes do filme podem não ser adequadas para crianças, sugestão de acompanhamento dos pais ou responsáveis legais; parents strongly cautioned (PG-13), parte do material do filme poder ser impróprio para crianças menores de 13 anos com acompanhamento dos pais ou responsáveis legais seriamente recomendada; restricted (R), acesso restrito, menores de 17 anos necessitam da presença dos pais ou responsáveis legais; no one 17 and under admitted (NC-17), menores de 17 anos não são admitidos nas sessões do filme.

Faixas de classificação no Brasil

Livre – para todo público

Não recomendada para menores de 10 anos
Não recomendada para menores de 12 anos
Não recomendada para menores de 14 anos
Não recomendada para menores de 16 anos
Não recomendada para menores de 18 anos

Palavra de especialista


Tamara Gonçalves, advogada


Alfabetização digital


“O papel do Estado é garantir que a política de classificação funcione. Depois entra a liberdade dos pais de decidir se o filho tem ou não maturidade para ver aquela obra. Classificação é diferente de censura. A classificação não tem o condão de colocar um policial na sala das pessoas, dizendo: ‘Agora, seu filho tem que ir para cama e não pode mais ver TV’. É uma liberdade de escolha dos pais. É preciso desenvolver no país a educomunicação ou alfabetização digital. Trata-se de um esforço para ensinar que existe uma produção de mídia por trás daquilo que se está vendo. Aprender a ler a mídia criticamente é muito importante. É fundamental na sociedade em que vivemos.”

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