Foliões se despedem - de vez - do carnaval 2020 com chuva e emoção

Vinte blocos desfilaram durante o fim de semana fazendo muita gente dançar no ritmo do axé, do funk e do samba

Larissa Ricci 01/03/2020 19:57
Tulio Santos/EM/D.A Press
Homenageando a sambista Clara Nunes, o bloco Filhas de Clara reúne apenas mulheres artistas como Aline Calixto, Marina Machado, Alcione Oliveira (foto: Tulio Santos/EM/D.A Press)
“Eu queria que essa fantasia fosse eterna.” Como se fizessem um mantra da canção Baianidade nagô, foliões de Belo Horizonte saíram às ruas para se despedirem do carnaval 2020. E foi com chuva e lágrimas nos olhos que se encerrou – agora de vez – a festa momesca neste domingo. Vinte blocos desfilaram durante o fim de semana fazendo muita gente dançar no ritmo do axé, do funk e do samba. Agora, o que fica é a saudade, as boas lembranças e a vontade que 2021 chegue logo.

Neste domingo, ocorreu o cortejo de grandes mulheres do cenário musical mineiro evocando aquela que foi uma das maiores intérpretes do nosso país. Homenageando a sambista Clara Nunes, o bloco Filhas de Clara reuniram apenas mulheres artistas como Aline Calixto, Marina Machado, Alcione Oliveira, entre outras que compõem a banda e desfilaram pela avenida que leva o nome da artista, no Bairro Renascença (Região Nordeste), onde a mesma viveu parte da sua vida.

A concentração estava marcada para as 16h e reuniu crianças, adultos de todas as tribos e gêneros. Todos usavam a cor branca. “Mais um carnaval terminando e a gente querendo festa. O corpo já não aguenta um pulo, mas a mente tá sempre pedindo mais um bloquinho”, contou Italo Santiago, de 32 anos, que foi acompanhado de Luiza Miguez, de 27. “Fomos no Filhas de Clara, por ser perto de casa e mais tranquilo, só pra aguentar chegar o próximo ano. Que venham mais blocos”, disse ela, que não superou o fim da festa.

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A concentração estava marcada para as 16h e reuniu crianças, adultos de todas as tribos e gêneros (foto: Tulio Santos/EM/D.A Press)
A servidora pública Natália Bini, de 39, se jogou no samba e na chuva para se acabar no último dia da festa momesca. "Minas é um carnaval político, um carnaval de direitos, é o povo ocupando a rua. E, nada melhor, do que terminar sambando ao som de Clara Nunes. O carnaval é nosso, é da mulher, é de luta", disse ela, emocionada./ Ela ainda reforça a importância da artista mineira: "Ela nasceu no interior de Minas, mudou para Belo Horizonte, trabalhou em uma fábrica, se descobriu sambista, foi para o Rio de Janeiro e fez história. Ela é a força da mulher mineira. Então, esse bloco - que não ia sair, que saiu com muito esforço - é maravilhoso. Precisamos valorizar Clara Nunes!", acrescentou.

Do samba ao funk. No mesmo horário ocorreu o segundo cortejo do Bloco Swing Safado, que surgiu em 2015 das ladeiras da comunidade do Conjunto Santa Maria junto com a retomada do carnaval de Belo Horizonte. O bloco conta com músicas populares brasileiras oriundas das comunidades e favelas.

O nome do bloco Swing Safado retrata bem o swing presente na ancestralidade latina e africana e a safadeza das músicas de duplo sentido. O primeiro cortejo ocorreu ainda no pré-carnaval e, agora, se apresentou mais uma vez para fechar o período festivo. O bloco contou com a participação do bloco Angola Janga, que fez muita gente dançar ao som do axé ao funk. Por fim, estava marcado uma apresentação do rapper Djonga.

E, por fim, também ocorreu o Baque Humaitá. Esse é fruto do projeto Humaitá Cultura Popular e conta com uma bateria de aproximadamente 100 batuqueiros. O Baque tocou, principalmente maracatu de baque virado e releituras de afoxé, cirandas e cocos e bois. A saída do bloco ocorreu no Bairro Esplanada, na Região Leste.

No sábado, centenas de pessoas participaram do Vira o Santo. Realizado desde 2009, o evento reúne os foliões para fazer uma despedida à altura do carnaval de rua. Ontem, o público pôde rever algumas atrações como Baião de Rua, Mientras Dura, Garotas Solteiras, Manjericão, Filhos de Tcha Tcha, Então, Brilha! e Alô Abacaxi. Outro destaque do dia foi o bloco Ziriggydum Stardust – que desfila sempre no fim de semana pós-carnaval, levando para as ruas de Belo Horizonte canções do camaleão do rock/pop David Bowie em ritmo de carnavalesco – e o bloco É o Amô – que surgiu em 2018 para celebrar o sertanejo retrô. O bloco Transbordatambém levou foliões às ruas com o intuito de descentralização do carnaval. O cortejo saiu da Região Noroeste de Belo Horizonte, limite de Contagem.


BH, eu curti


Arquivo Pessoal
Larissa Ricci no bloco Mama na Vaca (foto: Arquivo Pessoal)


“Definitivamente, sou do grupo que quer a folia pra sempre. Comecei a pular carnaval há quatro semanas, optei por tirar férias para aproveitar o melhor mês do ano. Entrei na festa nos ensaios dos blocos em meados de janeiro e pulei oficialmente em 8 de fevereiro, com o cortejo do Baião de Rua, que saiu da Avenida Brasil, no Bairro Santa Efigênia, na Região Leste de Belo Horizonte. Só encerrei na quarta-feira de cinzas, passando pelo Afro Magia Negra e o I Wanna Love You – se não estivesse de plantão, teria ido ao Swing Safado neste domingo.

Passei por quase 20 blocos. E posso dizer que foi no pré-carnaval que mais aproveitei. Como Te Lhamas foi um dos melhores blocos deste ano, assim como o Bloco da Bicicletinha, Babadan e Swing Safado. Entre sábado e terça-feira, tentei ao máximo fugir dos 'blocões' e de cortejos que aconteciam no Centro da cidade. Mas o povo tomou conta das ruas mesmo e até os pequenos blocos cresceram.

Fiquei surpresa ao ir ao Tico Tico Serra Copo, que divulga o local de concentração com pouco tempo de antecedência e não integra a programação oficial da prefeitura, e constatar que estava muito lotado. E entendo a procura: é um bloco muito legal, com caminhos surpreendes, que, este ano, terminou em uma quadra de terra com todos os foliões se refrescando com a água de um caminhão-pipa. Infelizmente, fui embora cedo e perdi a melhor parte. Mas o carnaval é feito de vários acertos e erros. O meu grande acerto de terça-feira foi a escolha do Truck do Desejo. O cortejo tomou a Avenida Augusto de Lima, mas, apesar de cheio, não houve empurra-empurra e o bloco me surpreendeu positivamente com repertório 100% feminino. À noite, fui ao Mientras Dura que também recomendo.

Me joguei e curti o melhor carnaval da minha vida. Em termos de organização, acho que temos o que melhorar. Mas não tive problema para encontrar banheiros químicos – e, infelizmente, longas filas – ou me deslocar para os blocos. Acho que os desvios do trânsito – exceto no entorno da Savassi – funcionaram. Bonito ver o Centro da cidade tomado por pessoas e não por carros. Mas também foi no Centro onde senti medo e presenciei diversas cenas de assédio sexual. Tive medo de passar pela Avenida Afonso Penas às 13h de um sábado. Infelizmente, um problema que extrapola o período do carnaval.

Fui surpreendida pela quantidade de policiais militares na dispersão de alguns blocos como, por exemplo, o Batiza, na Região Leste de Belo Horizonte. Isso sem falar da apreensão ao ver blocos ameaçados por conta dos trios elétricos.

Enfim, agora a folia acabou. Hoje, volto das minhas férias com dores e marcas roxas pelo corpo – que não consigo me lembrar como e quando surgiram – e pouquíssimas horas de sono. E valeu a pena. Já estou com saudades e ansiosa para o próximo ano. Até devo me arriscar a aprender a tocar algum instrumento e integrar uma bateria. Conto com a sorte e com o editor mais legal do mundo para me liberar para a folia em 2021.” (Larissa Ricci)

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