Pena de Pavão de Krishna une espiritualidade ao carnaval e anima as ruas da região do Barreiro

Este ano, o cortejo homenageou o capoerista Moa do Katendê, assassinado, no ano passado, por expressar sua opinião política, e as vítimas da tragédia de Brumadinho foram lembradas com um minuto de silêncio

Leandro Couri/E.M/D.A Press
O cortejo denuncia o rompimento da barragem da Vale em Brumadinho e homenageia o mestre de capoeira Moa do Katende, assinado em função de sua opinião política no período da eleição no ano passado e encera com uma chuva de tinta (foto: Leandro Couri/E.M/D.A Press)

Rostos azuis, mantras, rituais, ioga e meditação. Um dos blocos mais espirituais do carnaval de Belo Horizonte, o Pena de Pavão de Krishna desfilou, na manhã deste domingo, segundo dia de folia na capital mineira, no Bairro Milionários, na Região do Barreiro. O bloco saiu da Praça do Cristo em direção à praça da antiga Febem.

Este ano, o cortejo homenageou o capoerista Moa do Katendê, assassinado, no ano passado, por expressar sua opinião política. Ele foi morto, a facadas, por Paulo Sérgio Ferreira de Santana, de 36 anos, depois de uma discussão em um bar de Salvador. Os pavões também homenagearam as vítimas da tragédia de Brumadinho em um minuto de silêncio.  No meio do trajeto, o bloco estendeu, no alto do trio, o mesmo bandeirão asteado pelo Então, Brilha! no sábado com os dizeres "Todo mundo sabe. Não foi acidente. A Vale mata peixe, mata rio e mata gente." A previsão é de que o número de mortos ultrapasse os 300. 

O Pena de Pavão de Krishna sai com o objetivo de colaborar para implantação de um parque ecológico na região. O cortejo nasce da parceria entre o PPK e o Instituto Macunaíma. "O PPK defende a causa das águas. A defesa perpassa tanto pela criação do parque ecológico como pela denúncia do crime de Brumadinho", afirma o músico do PPK Raphael Sales em referência aos danos ao Rio Paraopeba!

A espiritualidade foi expressa ainda na preparação para o cortejo. Por volta das 8h, os integrantes fizeram um café da manhã orgânico a céu aberto regado de muitas frutas como melancia, banana e maçã. Ao mesmo tempo, foliões e responsáveis do grupo se pintavam de azul, em alusão à cor da deusa Sri Krishna- personalidade de Deus segundo o Hinduismo.Após a alimentação, o grupo iniciou rituais para buscar energias positivas. Aos pés da estátua do Cristo, os pavões fizeram uma mandala com areia colorida. Foram feitas diversas práticas de comunhão o mantra ioga foi conduzido pelo devoto de Krishna Narasimha Deva.  "O objetivo é elevar a consciência ao plano espiritual numa conexão de amor com Deus. Usamos todos os nosso sentidos.  Não há barreiras para adorar a Deus, nem o carnaval. Todos os momentos são auspiciosos", afirma Narisimha.
 
Ver galeria . 44 Fotos Foliões se preparam para o cortejo se pintando de azul e realizando um ritual para boas energiasLeandro Couri/D.A. Press
Foliões se preparam para o cortejo se pintando de azul e realizando um ritual para boas energias (foto: Leandro Couri/D.A. Press )
 
 
Hiran Donato, da organização não-governamental No caminho do bem, conduziu uma prática de conexão com a ancestralidade. Para ele, a festa, não é apenas carnal, e pode ser também destinada ao cuidado interior, o "almaval". "A ideia é conectar as pessoas, equilibrar festa aos desejos da alma de conectar com o interior", afirma Hiran. Os pavões se deram as mãos e formaram uma roda.  
Ainda na Praça do Cristo, os pavões construíram, coletivamente, uma mandala orgânica com areia colorida. Nesse momento, pessoas de todas as idades participaram. Aos pés da estátua do Cristo, os pavões ainda se abraçaram e pediram perdão pelas faltas cometidas. Lá, eles se deitaram em círculo, formando uma mandala humana.

O cortejo O primeiro trecho do cortejo do PPK é uma ladeira, mas nada que os pavões não tirem de letra. Para descer todos os santos ajudam e o PPK além da benção de Krishna, buscam a permissão aos orixás e traz Exu abrindo os caminhos. Durante o trajeto, o bloco  apresentou afoxés e músicas em referência à cultura afro brasileira. Eles homenageiam o Mestre Moa do Katende, o "moço lindo do Badauê, da música Beleza Pura de Caetano Veloso.

 A designer de joias Mary Arantes se prepara todos os anos para o desfile do Pena de Pavão de Krishna. Ela destaca os momentos de partilha em pleno carnaval. "Adoro a caminho das frutas. Essa concentração é a mais importante para mim no carnaval. O café da manhã é oferecido pelo bloco para a comunhão numa demonstração de generosidade", afirma.

Mary destaca como as pessoas compartilham a maquiagem e até fantasia. "Um pinta o rosto do outro. É um momento de magia. Tem que estar aqui para essa vivência. As pessoas que praticam mantras, meditação e ioga. Tudo isso deixa o clima verdadeiro". Mary que não usa maquiagem se rende às cores do PPK. "uso maquiagem zero o ano inteiro. Nunca pensei que aos 62 anos teria a pochete  cheia de glitter, prova que estou amando o carnaval.

O PPK reúne pavões que já participam há vários carnavais. É o caso de Filippo Angeletti, 10,  que participa do cortejo desde quando tinha 6 anos.  "Eu gosto muito do Pena. Foi o primeiro bloco que participei", conta. Filippo  está sempre na folia e ama o carnaval.  A mãe, Cristiane Angeletti,  sempre o levou. Ontem eles estiveram no Então Brilha e na terça feira vai ao Juventude Bronzeada e Tiete da Ivette.
Histórico.

Pessoas pintadas de azul, penas, turbantes e colares. Estes são alguns dos elementos que compõem o desfile do bloco Pena de Pavão de Krishna, carinhosamente conhecido como PPK. Com uma temática inspirada na cultura indiana, o cortejo traz a espiritualidade para as ruas de BH e mescla mantras indianos, afoxé e ritmos africanos. O grupo, que desfila desde 2013 nas ruas da capital, foge da Região Central e busca locais mais ermos, próximos da natureza. Este ano, pela primeira vez desde a criação do bloco, o Pena de Pavão de Krishna anunciou o local de seu desfile, que tradicionalmente era mantido como surpresa até o dia do cortejo. A cor azul é uma homenagem a Sri Krishna, a personalidade de Deus, segundo o movimento indiano. O nome do bloco é uma referência à um trecho da música Trilhos Urbanos, do cantor Caetano Veloso.

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