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Conheça os autores das marchinhas que bombam no carnaval de BH

Coautor de 'Pinto em cima', que ironiza a atitude do prefeito de SP em relação ao grafite, mineiro Vitor Velloso, radicado em SP, ganha projeção

Ana Clara Brant Pedro Galvão

Compositor de marchinhas Vitor Velloso - Foto: Braulio Mourão/Divulgação

Tudo começou com Coxinha da madrasta. Aí vieram os sucessos Imagina na Copa, Baile do Pó Royal, Rejeitados de Guarapari, Prefeito, libera o cooler e Não enche o saco do Chico. Assim como o carnaval de BH, que começou a bombar por volta de 2010 e a atrair pessoas de fora da cidade,  marchinhas de músicos mineiros passaram a conquistar, além do público local, o de outras cidades.

Boa parte das marchinhas que conquistaram os foliões foram feitas por uma mesma turma de compositores. A primeira delas – vencedora do Concurso Mestre Jonas, em 2012, foi Coxinha da madrasta, do cantor e compositor Flávio Henrique, inspirada numa denúncia de suposta irregularidade na contratação de um bufê pela Câmara Municipal de BH. Foi por volta dessa época que uma turma de amigos começou a se reunir num sítio em Lagoa Santa para tentar montar uma banda de jazz.

Sempre à luz da Lua cheia, o grupo tocava de tudo – sertanejo, carimbó, bossa, reggae... “Era tudo menos jazz (risos). Acabamos desviando da rota e nos transformamos num coletivo de compositores. Numa das reuniões, Gustavo Maguá apareceu e me mostrou uma marchinha que tinha feito com Flávio Henrique e Marcos Frederico, O pano da cuíca. Achei aquilo genial. Acredito que, a partir dali, começou essa história do carnaval”, diz o músico e administrador Vitor Velloso, autor de Baile do Pó Royal, Prefeito, libera o cooler e a recente Pinto em cima, com Maguá e Marcelo Guerra.

A composição, lançada às vésperas do aniversário de São Paulo (25/1), ironiza o prefeito paulistano João Doria com versos como “você pode pichar primeiro/ Não deixo mole e pinto atrás/ Pra cidade ficar mais ‘top’ /Na 23 e na Faria Lima /De fantasia pra dar mais ibope /Poso pra foto e pinto por cima”.

REPERCUSSÃO
A marchinha está na semifinal da 6ª edição do Concurso Mestre Jonas, nesta sexta (3), no Mercado Distrital do Cruzeiro. No sábado (4), disputa o Concurso de Marchinhas Nois Trupica Mas Não Cai, na capital paulista
. “Moro em São Paulo há 16 anos e nunca tive uma abertura tão grande no meio musical como agora, com o sucesso dessa marchinha do Doria. É a primeira vez que sou selecionado para um concurso aqui e ainda fui convidado para desfilar no Bloco Vai de Doria. Provavelmente, no carnaval vou ficar na ponte aérea BH-Sampa”, afirma Vitor.

No ano passado, Vitor Velloso e Marcos Frederico já haviam sentido um gostinho do sucesso além das Gerais. Não enche o saco do Chico, que fazia referência aos insultos direcionados a Chico Buarque na saída de um restaurante na Zona Sul carioca, estourou no Rio de Janeiro antes daqui e ficou em segundo lugar no Concurso Nacional de Marchinhas da Fundição Progresso. A música venceu a edição 2016 do Mestre Jonas. “Assim como eram as marchinhas de antigamente, as de hoje refletem o momento do país. Como a política é tema recorrente e que dá pano para manga, acaba virando uma grande inspiração para os compositores. Surge o assunto, e a gente faz”, diz Maguá.

Quando perceberam que suas músicas contagiavam foliões, os amigos decidiram se “profissionalizar”. Os encontros regados a cerveja no sítio deram origem à Orquestra Royal, que reúne músicos para tocar temas carnavalescos, autorais e consagrados. O nome se refere a um dos maiores sucessos do grupo, o Baile do Pó Royal, vencedor do Mestre Jonas de 2014.

“Na época, nem colocamos o nome de todos os autores e criamos alguns pseudônimos, como Alfredo Jackson e Joílson Cachaça, porque deu muita polêmica
. Mas ela caiu na boca do povo. Acredito que, até hoje,  já fizemos umas 30 marchinhas. No domingo de carnaval, vamos lançar nosso disco na Rua Sapucaí, na Floresta, para a galera curtir as marchinhas da Orquestra”, anuncia Maguá, que neste ano pretende criar um bloco de carnaval chamado O Pacato Cidadão, em homenagem a bandas mineiras, como Skank e Jota Quest.

Das 15 finalistas do Concurso de Marchinhas Mestre Jonas deste ano, ao menos quatro – Botequeiro (Helton Lima), Pinto por cima (Vitor Velloso, Gustavo Maguá e Marcelo Guerra), Solta o cano (Marcos Frederido e Vitor Velloso) e Espetista (Caio do Cavaco, Pedro Oliveira e Thiago Dibeto) – têm integrantes da Orquestra Royal. “Eu me sinto privilegiado em fazer parte disso e ver que aquela turma que se reunia no sítio da minha família para tomar cerveja e tocar um pouco acabou contagiando o carnaval não só de BH como de outros lugares”, afirma Vitor Velloso.

‘INCORRETAS’ NA BERLINDA

Algumas das marchinhas mais tradicionais do carnaval brasileiro estão provocando polêmica e não serão executadas no Rio de Janeiro. Consideradas politicamente incorretas, músicas como Cabeleira do Zezé, Maria Sapatão, Índio quer apito e O teu cabelo não nega devem sair do repertório de alguns blocos cariocas. Mesmo com a justificativa de que as composições foram criadas em uma determinada época e contexto, integrantes de agremiações da Cidade Maravilhosa, como Mulheres Rodadas, Cordão do Boitatá e Charanga do França, defendem que elas sejam banidas. É esperar pra ver...

 

Tirando onda com o 'cidadão de bem'

 

“Veja só quem vem, é o cidadão de bem, contra a corrupção, taça de champanhe, na manifestação.” Não só os políticos são alvo de chacotas e ironias nas marchinhas neste ano. No furacão ideológico que atravessa o país, sobrou também para parte da classe média. “É uma marchinha para aqueles que se acham cidadãos de bem, mas que fazem o mal para quem é diferente deles”, diz a multiartista Jhê Delacroix, intérprete e coautora do Baile do cidadão de bem.

Segundo os autores, o alvo da canção são as pessoas que se dizem humanistas, mas defendem que “bandido bom é bandido morto”, entre outras incoerências. “Esta marchinha vai para todo cidadão que defende com unhas e dentes o Estado democrático de direita”, diz a letra. Embora fale de um estereótipo, a composição teve embasamento em pesquisas. “Queria saber o que era o tal do cidadão de bem que todos replicam da boca para fora, se existia isso na ciência política e na sociologia, e acabei descobrindo várias boas respostas, inclusive, que esse era o nome do jornal da Ku Klux Klan”, afirma Helbeth Trotta, coautor da marchinha,  uma das 15 semifinalistas do Concurso Mestre Jonas.

Mesmo ainda em competição, a música já virou hit. A repercussão nas redes sociais passou até por figuras como a deputada federal Jandira Feghali (PCdoB – RJ).  A líder da esquerda na Câmara compartilhou o Baile do cidadão de bem em sua página no Facebook. Nas ruas, a canção também parece ter agradado. “Eu estava no cortejo do bloco Agitoê, no Rio, e cantei a marchinha para uns amigos, que adoraram. Em seguida, um casal que acompanhava o bloco me perguntou se era eu mesma a intérprete, porque eles já haviam escutado na internet”, relata Jhê, empolgada. “Tenho amiga que vai sair fantasiada de manifestante, com camisa da Seleção e taça de champanhe na mão”, conta.

Carioca vivendo em BH há quatro anos, ela se orgulha dos rumos tomados pelo carnaval de rua da capital mineira nos últimos anos. “O carnaval de BH me emociona por ser combativo. Ele tira do desespero e das lutas uma força que consegue transformar tudo isso numa festa, que não é uma festa vazia. Desde que me mudei para cá, nunca mais passei o carnaval em outro lugar”, conta a artista, que além da música se dedica às artes visuais e à contação de histórias.

Quatro marchinhas que estão 'causando'

 

 

PARA CAIR NO SAMBA

Confira as 15 marchinhas selecionadas para o Concurso Mestre Jonas

 

  1. A desmoralizante saga (Rodolfo Gomes, Matheus Nascimento)
  2. Manja rolha – herói do toillet  (João Fialho)
  3. O baile do cidadão de bem (Helbeth Trotta, Jhê Delacroix)
  4. Botequeiro (Helton Lima)
  5. Nesse carnaval (Rafael Macedo)
  6. Homem de saia (Carlos Linhares)
  7. Pinto por cima (Vitor Velloso, Gustavo Maguá, Marcelo Guerra)
  8. Solta o cano (Marcos Frederico, Vitor Velloso)
  9. Cleptomania (Moisés Araújo, Leno Rocha)
  10. Espetista (Caio do Cavaco, Pedro Oliveira, Thiago Dibeto)
  11. De flor em flor (Gabriel Rocha)
  12. Adeus de carnaval (Maria Inês Aroeira Braga)
  13. O ménage a Caetano (Rafael Fares)
  14. Puxa saco (Jadir Ferreira Laureão, Aldnei Pereira Sobrinho)
  15. Frevo da gente daqui (Gustavo da Macedônia)