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FOTOGRAFIA

Livro quer retratar Brasília dos anos 1980 através de fotos

Ricardo Junqueira - Foto: Marco LenhaEm tempos de comemoração dos 60 anos de Brasília e buscas por músicas inéditas de Renato Russo, outras raridades da turma dos anos 1980 da cidade estão prestes a serem reveladas, em duplo sentido: os fotógrafos brasilienses Nick Nick e Ricardo Ricardo vêm divulgando, digitalmente, filmes e negativos produzidos por eles entre 1981 e 1989, com fotos que retratam a efervescente cena cultural daquela geração pelo ângulo de quem estava de dentro.



Boa parte das bandas daquele período foram clicadas pela dupla, de Escola de Escândalo, Arte no Escuro e Cinco Generais a Plebe Rude, Capital Inicial e Legião Urbana, além de artistas cênicos, pintores, cineastas, modelos e tudo o que rolava no movimento cultural da cidade, que deu origem a movimentos como o Cabeças e o Rock Brasília. “Não estávamos cobrindo os shows, ou bastidores: estávamos lá como amigos. Eu andava no palco de todas as bandas, fotografava somente com uma objetiva normal, pois era o que tinha e ninguém ligava. Fazíamos parte daquilo”, contextualiza Nick Nick.

Uma seleção dessas fotos será publicada no livro Pós-New Brasília 1981-1989 — A biografia de um tempo que não foi perdido. A campanha de financiamento coletivo para publicar o livro começa nesta sexta-feira (13/11), e vai até o fim do ano. Quem contribuir poderá adquirir um exemplar e diversas recompensas, a depender do valor investido.

Foto do livro 'Pós-New Brasília - 1981-1989' - Foto: Pós-New/Divulgação

Clique você mesmo

A ética do faça você mesmo era predominante na época. Se as bandas tinham que fazer os próprios shows em qualquer calçada para ter onde tocar, os fotógrafos também organizavam as próprias exposições onde desse. Ricardo promoveu uma dessas exposições, certa vez, e conheceu Nick. Os dois já fotografavam o pessoal da cidade, despretensiosamente, e resolveram unir forças em um trabalho mais profissional. Fundaram, então, a agência de fotografia Pós-New, nome que brinca com os títulos que eram dados a tendências culturais da época como o pós-punk, new wave ou new romantic.



“Então, meus amigos eram os caras que ficaram famosos. E eu estava sempre por perto clicando e fazendo fotos de divulgação para eles”, conta Nick. “A vida dupla me deixava louco. Até que abandonei tudo e fiquei somente com as fotos da turma. Loucura, mas estava cheio de paixão”, completa.

Renato Russo durante o ensaio fotográfico para a capa do álbum 'Que País é Este', no Rio de Janeiro - Foto: Pós-New/Divulgação

Ricardo se interessou pela fotografia a partir de um livro de fotos que ganhou de presente e o impressionou. Comprou a primeira câmera com o salário mínimo de office boy da Caixa Econômica. Demorou dois anos para quitar o carnê que conseguiu com a ajuda dos avós. Um dia, o pessoal da Legião Urbana pediu para que ele fizesse um ensaio de divulgação para um dos primeiros álbuns da banda, na casa do Dado Villa-Lobos.

Ele não pretendia cobrar, afinal, era apenas mais uma sessão de fotografias que ele tirava dos amigos. Mas a empresária, Fernanda, fez questão de pagar, afinal, era um trabalho. Nessa altura, ele trabalhava como caixa do Banco Bandeirante. “Quando ela pagou, o valor era mais ou menos o que eu ganhava no banco”, lembra-se. “Então eu posso fazer um trabalho desse, que eu adoro, e ainda posso ganhar dinheiro?”, pensou, e, no dia seguinte, pediu demissão do banco e se tornou fotógrafo, para desespero dos pais. Algum tempo depois, Ricardo produziria novas fotos que virariam a capa do álbum Que País é Este?.




“A gente não tinha medo de pegar um filme, ler a bula e revelar de um jeito todo errado, só para ver como ficava. E não tínhamos grana, então fizemos amizades com vários vendedores de lojas de fotografia e comprávamos filmes vencidos mais barato. Assim, as coisas eram sempre cheias de novidades, tinham muito contraste. Usávamos a cidade como locação e isso foi muito legal”, defende Nick.

Com o tempo, as coisas foram prosperando para os artistas da cidade. “Quando passamos assinar nosso nome/Pós-New, passamos a ser mais respeitados fora daqui. O Tom Leão, na época um dos grandes caras do Rio de Janeiro no Jornalismo alternativo, fez uma matéria falando da gente. A gente parecia gente grande. Me lembro de ser convidado para ir clicar shows em São Paulo. Chegava no Circo Voador, no Rio de Janeiro, sempre cheio de moral. Éramos os fotógrafos da Plebe, da Legião. Ter uma marca fazia tudo parecer mais profissional. Mas, na verdade, a pós-New nunca existiu com empresa”, Nick relata.


Nas décadas seguintes, volta e meia o projeto de resgatar aquelas fotografias voltava à discussão, com algumas tentativas, mas a correria da vida e questões pessoas sempre levaram ao adiamento do projeto. Muitas empresas chegaram a fazer propostas para adquirir o material, todas recusadas. “Nunca quis tratar esse material como um produto, pois mais do que parte da biografia da cidade, ali está a minha biografia, dos primeiros anos de minha trajetória, com o Ricardo, juntos na Pós-New”, explica Nick.

*Estagiário sob a supervisão de Igor Silveira

Serviço
Lançamento da campanha de financiamento coletivo do livro Pós-New Brasília 1981-1989 – A biografia de um tempo que não foi perdido. A arrecadação começa nesta sexta-feira (13/11) e vai até 31 de dezembro, no link https://www.catarse.me/posnew.