Familiares, amigos e artistas se despedem hoje do artista plástico Décio Noviello, morto aos 90 anos, na manhã de ontem, em Belo Horizonte. O artista autodidata, que começou desenhando em um canto de caderno de escola – e era censurado pelo pai, que achava o estudo mais importante –, tornou-se referência na arte pop brasileira. E tinha na história de vida o orgulho de ser um dos participantes da exposição Do corpo a terra, com curadoria de Frederico Moraes, de 1970, concebida para a inauguração do Palácio das Artes e, atualmente, um marco histórico da vanguarda brasileira. O corpo do artista plástico está sendo velado no Funeral House e será sepultado hoje, às 16h, no Cemitério do Bonfim. Ele era natural de São Gonçalo do Sapucaí.
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Artista plástico Décio Noviello morre aos 90 anosMorre a atriz Ruth de Souza, aos 98 anos, no RioCuradora Mônica Hoff participa de bate-papo no Museu da PampulhaHistoriador Timothy Snyder diz que guerra da informação ameaça o mundoEstão abertas as inscrições para o concorrido concurso de fotografia da FUJIFILM 'Firme e forte', diz Ziraldo sobre fake news de sua morte Viúva de Saramago diz que 'não podemos chegar mais baixo em dignidade'Padre Fábio de Melo dá bronca em político que fechou túnel para fazer selfie Luto na dramaturgia: Ruth de Souza sai de cena aos 98 anosMúsicas de BH vão para as semifinais do 49º Festival Nacional da CançãoO artista plástico Eymard Brandão ressaltou que a atuação de Décio Noviello foi muito significativa para a arte e identidade cultural do estado. “Ele projetou Minas Gerais em diversos segmentos e sempre teve uma atuação positiva em galerias de arte e museus. Era atual e atuante”, afirmou.
Desenhista, cenógrafo, figurinista, gravurista e pintor, Décio Noviello tinha vários talentos e um papel importante na história do carnaval de Belo Horizonte. Em 1979, o artista plástico já atendia a convites da prefeitura para decorar a Avenida Afonso Pena, onde as escolas desfilavam. Em 1983, houve um concurso para eleger a ornamentação mais bonita. O prêmio foi concedido ao artista, com o tema Transamazônica – crítica ao “asfalto puro” da avenida, segundo ele, ainda menos arborizada do que atualmente. Em busca de uma sintonia entre as ornamentações e os foliões, começou a escrever o capítulo mais luxuoso do carnaval de rua de Belo Horizonte, entre 1983 a 1988.
Em entrevista concedida ao Estado de Minas no ano passado, Décio revelou não gostar dos bloquinhos que caracterizam o atual carnaval da capital. “Não tem graça nenhuma. Deus me livre. Podem ir lá, mas não me chamem nem pra ver na televisão”, brincou. Durante a conversa com a reportagem do EM, Décio relembrou como era o carnaval na cidade nas décadas passadas.
“O povo vinha de toda parte ver a avenida. A decoração estava linda, mas não tinha nada decente para passar por baixo dela. Nossas escolas eram a Canto da Alvorada, com tudo muito pé-rapado, e a Cidade Jardim, com umas meninas de sutiã de tirinha vermelha e calçãozinho, ou então usando camisetas rasgadas, desfiadas com tesoura. O corpo pintado de urucum, todo mundo descalço ou de chinelo de dedo, uma coisa horrorosa. Não dava. Noviello relembrou os tempos em que cortejos das escolas de samba eram o ponto alto do carnaval de BH. A cidade superava São Paulo em esplendor na avenida. “Paulistas? Eles não tinham nada. Nosso carnaval aqui era muito melhor. Lá, só ficou bom depois que fizeram o sambódromo”, dizia. “A prefeitura começou a botar dinheiro, ficou uma beleza. Vinham mestre-sala e porta-bandeira do Rio. Pra nós, dos bastidores, as coisas deram uma melhorada boa. O comércio passou a oferecer materiais adequados para adereços e fantasias, coisa que não tínhamos no início”, contou.
ALÉM DO QUADRO Mas a obra de Décio Noviello vai muito além do carnaval. E se configura como emblema de aspectos que toda a sua geração experimentou com intensidade: a tentativa de ‘tridimensionalizar’ a pintura, indo além do quadro, a sedução pelo carnaval e pela arte das camadas populares urbanas (e indígenas) como modelo social e estético, a revalorização positiva do barroco e do rococó como ancestralidade do nacional. O fundamento da linguagem do artista sempre foi um cuidadoso planejamento (geométrico), que se projeta como comentário social para além da sedução pelo aspecto ótico.
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