O escritor Sebastião Nunes receberá, nesta sexta-feira (28), o Prêmio Governo de Minas Gerais de Literatura 2018 pelo conjunto da obra em cerimônia no auditório do BDMG Cultural. A notícia da homenagem foi publicada em 5 de dezembro, data em que ele comemorou oito décadas de vida. “Foi um presente”, diz. Agradece, mas não perde a ironia: “Não encontraram outro para premiar”. O ano foi pródigo em homenagem ao bocaiuvense: foi autor homenageado na Feira Miolo(s), reunião de editoras alternativas organizada pela Lote 42 realizada em São Paulo, e sua obra foi abordada no livro Sebastião Nunes: delirante lucidez, de Gustavo Piqueira (Coleção Gráfica Particular/Ed. Lote 42).
A sua poesia é visual. Em que momento você viu que seu caminho era transitar pela imagem e texto?
Tinha muitos caminhos. Esse era o problema.
Quando você lançou Decálogo da classe média (1998), você enviou exemplares a 120 intelectuais de todo o país dentro de um pequeno caixão de defunto.
O que escrevo não é romance, não é novela, não é conto. Crônica, sim. É algo caótico. Chamo de prosa experimental. É a única maneira mais próxima de definir. Na época, eu e o artesão Carlinhos Belém fomos à funerária e olhamos modelos de caixões.
Essa questão está cada vez mais atual, não é mesmo?
Precisamos de um mundo mais ético. Que as pessoas olhem para o outro e vejam a diferença que elas têm se tivessem a visão do outro. As pessoas só mostram a cara. A selfie está aí para provar. Uma mulher e o marido se sentam à mesa cada um com seu celular... É a individualidade mais extrema.
O que a experiência como editor da Dubolso influencia na sua escrita?
Fui publicitário muitos anos. A publicidade lida com todas as técnicas, da tipografia à televisão. Transitava em todas essas áreas. Isso ajudou na construção que fiz artisticamente, inclusive a liberdade de transitar entre as áreas. Ia para o rádio gravar spot, para a televisão gravar comercial, sentava-me na prancheta. Era um conhecimento técnico. Como editor, podia ajudar outros autores.
O que o Prêmio de Literatura do Governo de Minas representa para você?
Foi uma grande surpresa. Jamais imaginei. A tendência é que os prêmios possam laurear carreiras mais bem comportadas, de artistas com comportamento mais convencional, dentro do padrão, sem palavrão, extorsão e experimentalista. Não acharam mais ninguém para dar o prêmio.
Você sempre fazendo uso da sátira...
Gosto muito de brincar. Sátira é melhor forma de brincar em termos de escrita. Os grandes artistas, como Machado de Assis, Millôr, Steinberg nos EUA. São autores muito ricos, que cutucam. Então, a gente fica cutucando as coisas. A gente não é melhor que os outros. É uma forma de brincar com os outros e com a gente.
No poema Data venia, você escreveu: “Sebastião nião choramingou sonetos aos 17 anos./ Bastião nunes tartamudeou contos aos 23 anos./ Sebastunes ião lastimou-se elegíaco aos 37 anos./ Tião nu vaiou-se neste poema aos 46 anos”. Qual é o verso para Sebastião aos 80?
Parei de escrever poesia aos 50 anos. Não tem esse verso. Paul McCartney escreveu o título “quando eu tiver 64 anos”. Só depois, quando tinha 64 anos, fez a letra da música. Mas eu nunca mais escrevi um verso. Parei. Fiquei na prosa e no teatro infantil.
Você tem uma carreira consolidada, inclusive o prêmio é esse reconhecimento. Quais são os seus planos literários para 2019?
Não faço programas e definições claras do que vou fazer. As coisas acontecem. Nessa idade não tem como fazer planos demais. Queria um Brasil melhor, mas é praticamente impossível diante do que temos pela frente.
Qual é o balanço que você faz dessa longa carreira?
A carreira é uma coisa que fiz individualmente, sem participar de grupos. Isso é importante para mim. Se está em um grupo, tem que pedir bênção para o chefe. Isso trava muito a criação. Por outro lado, pode-se ter pouco reconhecimento. Quem comanda tudo são os grupos, determinam caminhos e direções. Se não faz parte, fecham-se os caminhos de divulgação. Mas o balanço é muito positivo. Em outubro, o autor Gustavo Piqueira (SP) entrou em contato comigo. Ele é um designer extraordinário, que só conheci agora – estou cada dia conhecendo menos pessoas. Ele resolveu fazer um livro com minha obra. Cecília Arbolave e João Varella, da editora Lote 42, me homenagearam na Feira Miolo(s). Duas grandes homenagens aos 80 anos que gratificam e recuperam o passado.
PRÊMIO GOVERNO DE MINAS GERAIS DE LITERATURA 2018
. Sebastião Nunes (conjunto da obra)
. Emir Rossoni (ficção)
. Ana Estaregui (poesia)
. Jonathan Tavares Diniz (jovem escritor mineiro).
Cerimônia de premiação:
. Hoje, às 10h30, no BDMG Cultural (Rua da Bahia, 1.600, Lourdes). Entrada franca.