Quando se deparou com moinhos de vento, Dom Quixote de La Mancha enxergou gigantes travando batalhas com inimigos que não existiam. A saga criada por Miguel de Cervantes, em um dos maiores clássicos da literatura mundial, foi transposta para o Brasil contemporâneo pelo historiador e cientista político Marcelo Douglas, que lança seu primeiro romance, O Brasil e as batalhas de Quixote (Editora Ramalhete). Gestor no Ministério do Planejamento, Marcelo publicou vários livros na área administrativa e estreia na literatura.
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A trajetória de desilusões do protagonista coloca em foco as mazelas de seu país. “Será que a sociedade brasileira não está em uma batalha imaginária com inimigos que não existem, em vez de atacar o clientelismo? O personagem reflete se estamos na trincheira certa. Quem sabe não estamos num transe coletivo, e a sociedade não quer mudar de fato, ficando todos condenados a ficar desse jeito?”
BATALHAS
Marcelo Douglas observa que Dom Quixote enfrentava batalhas imaginárias, mas os resultados da luta eram reais e atingiam fisicamente o corpo do herói, que saía machucado dos confrontos.“Depois das batalhas, Quixote ficava com o corpo todo quebrado.
O paradoxo é que o personagem é alheio à realidade, mas tem consciência de que a transformação vem da participação do cidadão. “Por um lado, ele é chamado a participar. De outro, sente-se enojado e desencantado com a política.”
Como o romance transita entre ficção e realidade, apresentar o contexto social e político brasileiro com precisão torna-se um imperativo. O escritor recheia o romance com dados históricos e usa artigo publicado por ele no Estado de Minas, em 7 de abril de 2003, analisando os primeiros 100 dias da presidência de Luiz Inácio Lula da Silva. Maurício recorre à poesia, tomando de empréstimo versos de João Cabral de Melo Neto e Carlos Drummond de Andrade.
O romance adota uma visão desesperançada em relação à política. No entanto, o autor demonstra que os cidadãos são corresponsáveis pelos rumos da nação. “A sociedade brasileira cobra do Estado, do sistema partidário, mas, no cotidiano, assume atitude precária.
Marcelo Douglas atuou como professor na Pontifícia Universidade Católica (PUC Minas), na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e na Fundação João Pinheiro. O romance demonstra a situação angustiante na qual o país está imerso. “Estávamos diante de uma escolha de Sofia, uma escolha triste. De um lado, um projeto com pouco apreço às instituições e de outro lado, um projeto de muito apreço à corrupção e à falta de ética. Agora, é hora de tentar olhar para a frente. Essa renovação pode ser boa. É hora de pacificar o país.
Guimarães na Global
Depois de meses de negociação, o grupo editorial Global assinou nesta semana contrato com os herdeiros de João Guimarães Rosa (1908-1967) para a publicação da obra completa do autor – com exceção de Grande sertão: veredas, que sairá pela Companhia das Letras em fevereiro. A Companhia também estava na disputa por esse contrato maior, bem como Todavia e Rocco.
Casa de autores como Cecília Meireles, Cora Coralina, Manuel Bandeira e Gilberto Freyre, entre outros, a Global começa a lançar em março suas edições, sempre com fortuna crítica e cronologia. Sagarana será o primeiro. A lista segue com Primeiras estórias, Zoo e Fita verde no cabelo (infantis), A hora e a vez de Augusto Matraga, Manuelzão e Miguilim e outros.
“Quando cerca de 50% da obra estiver publicada em edições individuais, o que deve demorar dois anos no máximo, começamos a preparar o volume da obra completa para sair pela Nova Aguilar com Grande sertão: veredas inclusive”, afirma Luiz Alves Júnior, fundador da editora. “Ganhamos pelo trabalho que fazemos, não pela proposta financeira – embora ela tenha sido alta. Mas é compensador.” A obra de Guimarães Rosa é dividida entre três herdeiros. Um deles, porém, é o único dono de Grande sertão: veredas. (Estadão Conteúdo)
O Brasil e as batalhas de Quixote
De Marcelo Douglas de Figueiredo Torres
Editora Ramalhete
(194 págs.)
R$ 40