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Economista Eduardo Giannetti lança novo livro ''O elogio do vira-lata e outros ensaios''

Diz o senso comum que com o avançar dos anos nos tornamos mais pragmáticos e céticos, deixando os sonhos e utopias para tempos passados. O economista Eduardo Giannetti completou 61 anos em fevereiro. Pensa justamente o contrário. “Sinto que o tempo acirrou em mim a revolta com as injustiças da vida brasileira e, principalmente, exacerbou a esperança e a fé radical em nosso futuro”, escreveu ele no prefácio de seu novo livro, O elogio do vira-lata e outros ensaios (Cia. das Letras).

A obra reúne 25 ensaios escritos pelo autor desde 1989. Há dois textos inéditos: o que dá título ao livro e Agostinho da Silva, semeador de vida, sobre as ideias do filósofo português e sua visão de futuro para os países de língua portuguesa. O autor dividiu a seleção em três eixos temáticos: Enredos brasileiros (nove textos que abordam questões da vida brasileira); Dispersos literomusicais (oito ensaios em que discorre sobre Aristóteles, Mozart e Machado de Assis); e Filosofia econômica (artigos acadêmicos).

É o vira-latismo do brasileiro, tornado célebre há seis décadas a partir da publicação de um texto de Nelson Rodrigues, que dá início à entrevista com Giannetti. Leia os melhores trechos.

 

 

"A imaginação brasileira é extremamente volátil, oscila entre os estados de confiança e euforia e de desengano em relação ao futuro”

Eduardo Giannetti, economista

 

 

Só deixaremos de ser vira-latas quando compreendermos que não há problemas em ser vira-latas?

Exatamente.

A metáfora do Nelson Rodrigues, que nasceu no futebol, tornou-se tão poderosa que transcendeu a particularidade e se tornou parte da fala brasileira. Mas não podemos mais viver esta inferioridade diante dos estrangeiros. Nossa condição de vira-latas denota nossa miscigenação, nossa cultura sincrética. Ser um vira-lata não é o fim. Aliás, prefiro ser um vira-latas do que um doberman da política.

 

 



 

 

 

O senhor é um otimista em relação ao Brasil, apesar dos pesares.

Alguma vantagem a idade tem. Vi o Brasil cair e se levantar várias vezes. Tenho comigo que desta vez não vai ser diferente.

Enquanto as crises eram vividas, elas nos pareciam absolutamente irrecuperáveis. E o país sempre conseguiu se reerguer. O pessoal mais jovem é que está mais assustado. A imaginação brasileira é extremamente volátil, oscila entre os estados de confiança e euforia e de desengano em relação ao futuro. A questão é que não éramos tão bons como nos imaginávamos quando estávamos no período de euforia.

O elogio do vira-lata recupera textos a partir de 1989, época em que o senhor voltou a viver no Brasil, após o período em que estudou na Inglaterra. O livro acaba traçando o arco de sua trajetória no país, não?

Para selecionar os textos, preocupei-me fundamentalmente que fossem artigos que tivessem alguma coisa a dizer ao presente, à vida brasileira hoje. Quando cheguei, minha aspiração maior era me inserir no mundo acadêmico, publicar artigos científicos. Paralelamente, queria contribuir para o que imaginava ser economia de mercado, não esta caricatura de economia de mercado que o país tem.
Queria um país mais justo, com muita ênfase no capital humano. Percebo agora, olhando 30 anos para trás, que fui me sensibilizando com a singularidade cultural brasileira. Temos que criar uma relação alternativa ao modelo ocidental iluminista, tanto no plano ético quanto no ambiental.

O senhor escreve com igual paixão sobre Aristóteles e sistema educacional.

A minha graduação é em economia e ciências sociais, minha paixão é a filosofia. Não fiz filosofia por medo de não me viabilizar financeiramente. Meu pai era severo, austero, deixou claro que uma vez formado ele não me ajudaria mais. Assim que a vida me permitiu, pude me dedicar mais ao que tenho paixão, que é o pensamento filosófico. Os ensaios da segunda parte do livro foram encomendados, não coisas que tomei a iniciativa de fazer. Meu editor, Luis Schwarcz, sabendo que eu gostava muito de Machado de Assis, me pediu para escrever um prefácio sobre Dom Casmurro para uma antologia que ele publicaria de prefácios para livros clássicos. A Osesp me convidou para fazer uma fala sobre Mozart antes de um concerto. Tomei toda a coragem do mundo e fiz.
Sou prudente na vida prática e corro riscos na vida intelectual.

Por falar nisto, o que os governantes eleitos no segundo semestre devem pensar?

Há algumas urgências que clamam por ser equacionadas. Os três grandes problemas que mais afetam a vida do brasileiro comum são segurança, emprego e saúde. Agora, temos que ter clareza de que, se não tivermos ênfase em formação educacional, nenhum futuro nos espera. O futuro do Brasil não vai ser decidido em pregões da bolsa de valores, nas profundezas do pré-sal. Temos uma carga tributária extremamente elevada – 40% da renda nacional transita pelo setor público. Ou seja, de cada R$ 100, R$ 40 passam pelo governo. Somos um país em que quase metade dos domicílios não tem coleta de esgoto. Os governantes agem como se a sociedade existisse para servi-los, e não o contrário. Tem alguma coisa profundamente errada aí.



O ELOGIO DO VIRA-LATA E OUTROS ENSAIOS

. De Eduardo Giannetti
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Companhia das Letras
. 328 páginas
. R$ 64,90 e R$ 39,90 (e-book)
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