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FIQ-BH chega a sua 10ª edição com aposta na diversidade; confira a programação

Daniel Bretas escreveu para a mostra 'Traçado na memória', que aborda diferentes locais de Belo Horizonte. - Foto: Daniel Bretas/Divulgação

Os quadrinhos tomam conta da capital mineira a partir desta quarta-feira (30) até domingo (03). A intensa programação desta 10ª edição do Festival Internacional de Quadrinhos de Belo Horizonte (FIQ-BH) ocupa quatro espaços culturais da cidade: a Serraria Souza Pinto, que sedia a maior parte da programação, o Centro de Referência da Juventude, a Casa Fiat de Cultura e o MIS Cine Santa Tereza. São quatro exposições, duas delas com homenagens a importantes figuras do quadrinho nacional: a paulista Érica Awano, figura de destaque na produção de mangás, e o veterano mineiro Nilson, que sempre usou o humor como arma política e poética. A terceira exposição na Serraria é Traçado na memória, em que 15 quadrinistas de Belo Horizonte interpretam a cidade, e a quarta é Inarredáveis! Mulheres quadrinistas, que reúne mais de 80 obras de profissionais belo-horizontinas na Casa Fiat de Cultura.


Os números são grandiosos. Além de estandes em que circularão mais de 500 profissionais da área, o evento terá cerca de 140 convidados, mais de 200 lançamentos, cinco oficinas e 26 mesas de debate, em que convidados nacionais e internacionais abordarão diversos aspectos da linguagem, mercado e produção dos quadrinhos. Entre as “estrelas” do FIQ é o britânico Dave McKean, reconhecido mundialmente pelo sucesso com a série Sandman. Ele participa de sessão de autógrafos, conversa com os fãs e fala sobre seu novo livro Black dog: Os sonhos de Paul Nash, lançado pela Darkside Books.


A temática Processos colaborativos, definida pelos curadores Ana Koehler, Carol Rossetti, Daniel Werneck e Fabiano Azevedo, vai perpassar grande parte das atividades. Se para muitos artistas o trabalho criativo desenvolvido a quatro mãos (ou mais) pode parecer caótico, para os quadrinistas essa é uma forma efetiva e bem-sucedida de concepção de histórias.
A desenhista Cris Eiko, que escreve HQs autobiográficas em parceria com Paulo Crumbim, é prova disso. As funções de roteirista e desenhista se misturam. “Trabalhamos sempre juntos: ele desenha e eu também dou meus pitacos na história”, conta, defendendo que “duas cabeças pensam melhor que uma”.


Cris Eiko foi convidada para desenvolver a identidade visual desta edição do FIQ. Dos diversos rascunhos e ideias para a ilustração, a que mais gostou foi o desenho de um leitor que, de tão voraz, tem a cabeça indo para os ares, como em uma explosão. “É uma referência àquele momento em que alguém lê um quadrinho tão bom, se apaixona por aquilo e se torna um leitor eterno do formato”, avalia.


Entusiasta do evento, visitou o FIQ em 2009 e, em 2011, passou a participar como convidada. “O evento foi muito importante na minha trajetória porque, estando nele, conheci vários autores independentes com produções de qualidade profissional. Tive o meu primeiro contato com o pessoal das revistas Beleléu, Samba e Quarto Mundo, além de ter a oportunidade de trocar ideias com profissionais da área.”

CONSAGRAÇÃO Também de São Paulo vem a grande homenageada desta edição.

A ilustradora Érica Awano participa de sessão de autógrafos, bate-papo sobre sua trajetória e terá exposição dedicada a seu trabalho. O talento já lhe rendeu experiências no mercado internacional. Para os Estados Unidos e a Europa, a experiente artista fez Warcrat legends, série de mangás derivados do jogo World of warcraft, e, mais recentemente, The complete Alice in Wonderland. Seu último lançamento, no ano passado, foi League of legends, publicação para o mercado nacional baseada em relatos de usuários do jogo homônimo.

 


Frequentadora assídua das últimas edições, ela ressalta a importância do evento para fomento dos quadrinhos brasileiros. “O FIQ é essencialmente sobre quadrinhos – ao contrário da maioria dos grandes eventos, que contemplam também cinema, séries e outras mídias que compõem esse panorama”, destaca. Érica destaca a instabilidade do mercado de quadrinhos e identifica, ainda, falácias da relação entre as editoras e seus públicos. “Existe todo tipo de público para quadrinhos, o problema é que muitas vezes eles são vistos como um só. Há quem ache que quadrinho é coisa só de criança e que todos devem seguir o modelo de sucesso do Maurício de Sousa”, comenta.

“Quando os mangás apareceram no Brasil, eles revelaram a existência dos públicos adolescente e feminino para esse mercado, que antes não apareciam. As empresas que dão certo são aquelas que percebem que existe uma diferenciação na audiência”, completa Érica.

 

A homenagem em uma edição que exalta os trabalhos coletivos não poderia ser mais propícia. A parceria de sucesso com o roteirista Marcelo Cassaro foi o pontapé inicial na carreira de Érica, que criou com ele a minissérie Street fighter zero 3 e a longeva Holy avenger. “O trabalho de desenhista consiste em conseguir ler o que o roteiro pede. Tive sorte de, até hoje, trabalhar apenas com roteiristas generosos, que não fazem questão de ter controle absoluto sobre as criações, me dizendo o que fazer em cada página”, elogia a artista.

 

O veterano mineiro recebe homenagem com a exposição 'Nilson - Meio século de cartuns de humor, amor e combate'. - Foto: Nilson/Divulgação 


GIRL POWER Pela primeira vez desde sua primeira edição, em 1999, o FIQ tem uma mulher como convidada de honra. Érica Awano critica a pouca visibilidade dada às artistas e às leitoras no cenário dos quadrinhos. “Receber uma homenagem, sendo mulher, é uma experiência totalmente insólita. Até mesmo os mercados internacionais são muito voltados para comics, uma mídia que fala basicamente com os meninos. Não há equilíbrio, muita gente sequer sabe que algumas histórias da Marvel e da DC são criadas por mulheres”, aponta.


A iniciativa dialoga com a proposta de representatividade defendida pela atual curadoria do evento, que busca dar maior visibilidade para quadrinistas negros e com temática LGBTQ. “Sempre tivemos mulheres produzindo bons quadrinhos, o que faltava era abrir os olhos e começar a enxergar a obra dessas artistas.

Essa é uma preocupação do FIQ há pelo menos três edições”, afirma o curador do evento Afonso Andrade, da Fundação Municipal de Cultura. “Além de representativa, a homenagem à Érica é justa, porque considera sua contribuição aos quadrinhos brasileiros, como uma pessoa influente de sua geração e pioneira na produção de mangás no Brasil”, observa Afonso.

 

Ilustração de Érica Awana, pioneira na produção de mangás no país e a grande homenageada deste ano. - Foto: Érica Awano/Divulgação 


Representatividade, aliás, é palavra de suma importância, na opinião de Érica. “Só entrei no mercado porque cresci lendo quadrinhos japoneses, onde as mulheres atuam há muitos anos, saber que aquelas mulheres existiam foi um verdadeiro incentivo”, conta a artista. “Ter uma mulher sendo homenageada por seu trabalho em um evento como o FIQ ajuda em muito na nossa visibilidade. É algo que, a longo prazo, pode contribuir para que exista um equilíbrio de oportunidades e espaço dado a homens e mulheres na área”, completa Érica.

 

 

10º FESTIVAL INTERNACIONAL DE QUADRINHOS DE BELO HORIZONTE

 


l Serraria Souza Pinto
(Av. Assis Chateaubriand, 809, Centro).
Diversas atrações de quarta (30/5) a sexta-feira (1/6), das 9h às 21h; sábado (2/6) e domingo (3/6), das 10h às 21h. Informações: (31) 3213-3400. Entrada franca. A programação completa está disponível no site www.fiq.pbh.gov.br.

A organização do festival confirmou a realização do evento e informa que quaisquer alterações na programação serão anunciadas via redes sociais.

l Centro de Referência da Juventude

(Rua Guaicurus, 50, Centro).

Rodada de negócios e oficinas de formação artística de quinta-feira (31) a domingo (3). Informações: (31) 3277-4356.

l Casa Fiat de Cultura
(Praça da Liberdade, 10, Funcionários).

Exposição Inarredáveis! Mulheres quadrinistas. Até 29 de julho: de terça a sexta-feira, das 10h às 21h; sábado, domingo e feriado, das 10h às 18h. Informações: (31) 3289-8900.


l MIS Cine Santa Tereza
(Rua Estrela do Sul, 89, Santa Tereza). 

Exibições de filme de quarta-feira (30) a domingo (3). Informações: (31) 3277-4699.

PERCALÇOS
Realizado a cada dois anos desde 1999, o FIQ teve sua décima edição, prevista para 2017, adiada. “Tivemos uma mudança administrativa no meio de uma crise econômica e a nova prefeitura fez uma revisão dos projetos. Somou-se a isso a restruturação da Fundação e da Secretaria Municipal de Cultura, com novas gestões, e também mudanças no cronograma das leis de incentivo, cujo resultado só saiu no final do ano. Por essas razões, decidimos adiar o FIQ de novembro de 2017 para maio de 2018, o que nos daria mais tempo para planejamento e captação de recursos”, esclarece o curador Afonso Andrade.

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