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Escritora carioca Adriana Lisboa lança em BH seu segundo livro de poemas

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“Somente após sete anos de silêncio num mosteiro/ aquele poeta encontrou sua voz/ libertando na palavra o que a palavra sela.” É com esse verso – do poema Silêncio – que a escritora carioca Adriana Lisboa abre Pequena música (Iluminuras), seu mais novo livro. Seria o silêncio uma música ou um som?

“Em termos estritos da física, como ensinou John Cage (compositor e teórico musical norte-americano), o silêncio não existe, para a experiência humana pelo menos. Porque ouvimos os ruídos do nosso próprio corpo, mesmo num ambiente ‘protegido’ do som. Mas existe o silêncio em contraponto ao ruído – por exemplo, no momento em que respondo a esta entrevista estou na sala da casa de um parente, há uma televisão ligada num jogo de basquete, duas crianças e quatro adultos falando ao mesmo tempo, mas há certos momentos em que tudo se cala. Esse é o silêncio que faz parte da composição musical e poética. O silêncio usado como significante. Como disse Susan Sontag (escritora e crítica de arte norte-americana), também, o silêncio como oposição ao barulho, ao ruído, ao ambiente de som que o cerca e delimita”, afirma Adriana.

Vencedora do Prêmio Literário José Saramago em 2003 com o romance Sinfonia em branco, a autora participa nesta terça-feira (15)do projeto Sempre um Papo. Adriana já foi cantora e diz que a música acaba entrando tematicamente na elaboração do enredo das suas histórias literárias, assim como é o ponto de partida de vários poemas.

“Mas, além disso, elementos musicais como ritmo, som e contraponto têm uma participação importante. Na escrita de poesia, talvez isso seja sempre verdade, para qualquer autora ou autor, ainda que inconscientemente”, diz.

MUSICALIDADE Adriana acredita que as duas artes (literatura e música) dialogam e avalia que a música está presente em sua escrita de várias formas. “As palavras têm ritmo, tem qualidade sonora; dizer ‘zanga’, ‘raiva’, ‘indignação’, ‘exasperação’ é dizer coisas distintas, tanto em significado quanto em musicalidade. Embora o dicionário apresente essas palavras como sinônimos. Ler um poema em voz alta é, em grande medida, ouvir sua música. Tive uma experiência interessante na Índia, há alguns meses, participando de uma leitura de poesia em que alguns leram em hindi e urdu. Como eu não entendia nada, ouvi os poemas como música, literalmente, e foi impressionante: a melodia, a respiração, o timbre e as modulações da voz.”

Pequena música é o seu segundo livro de poesias – o anterior é Parte da paisagem (2014).
Depois de ter escrito contos, romances e livro infantojuvenil, a escritora conta que cada gênero tem o seu próprio processo de produção. “Para adaptar um pouco a definição de Cortázar, eu diria que o poema é um instantâneo, uma fotografia (mesmo que você passe algum tempo editando depois), o conto é um filme de curta-metragem, o romance um longa. Cada um tem seu tempo de composição e de leitura, cada um tem sua narrativa, mas, no fim das contas, é tudo literatura”, resume.

O novo livro é dividido em tópicos, como se fossem capítulos. Essa divisão só surgiu depois de a obra estar pronta, quando a autora percebeu que os poemas tinham certos eixos temáticos ou sub-eixos temáticos, dentro de um eixo maior, conforme ela define. “Caro ser é uma espécie de homenagem a objetos que fazem parte da experiência do cotidiano – relógios, máquina de lavar, limão etc. Armários é a parte autobiográfica do livro, sempre dentro dessa clave da observação do cotidiano. Mirante é uma viagem para dentro e, por fim, Revolução dos cravos, uma viagem para fora”, diz ela, que prevê lançar em 2019 o romance Todos os santos.

Depois de ter morado na França e na Nova Zelândia, Adriana Lisboa vive atualmente nos Estados Unidos. Ela avalia que a distância do Brasil teve influência sobre sua maneira de escrever.
“Ocupo uma espécie de entre-lugar, porque não moro no Brasil, mas escrevo em português. Moro nos EUA, mas não sou uma escritora estadunidense. E os meus temas às vezes transitam fora dos dois mundos. Sou cidadã dos dois países e, às vezes, não me sinto cidadã de lugar nenhum – realmente desenraizada. Isso tem um lado angustiante e um lado muito libertário. Além disso, o convívio com a língua inglesa, de vocabulário riquíssimo e extremamente preciso, fez com que eu mudasse minha relação com o português. Acho que fiquei mais exigente com o meu próprio texto.”

 


Pequena música
Autora: Adriana Lisboa
Editora: Iluminuras (96 págs.)
Preço sugerido: R$ 35

Sempre Um Papo com Adriana Lisboa.
Terça-feira (15), às 19h30, no Auditório da Cemig (Rua Alvarenga Peixoto, 1.220, Santo Agostinho. (31) 3261-1501)

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