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Exposição '100 anos de Athos Bulcão' será inaugurada nesta quarta (11), no CCBB

Painel de Bulcão foi apagado no Shopping Del Rey - Foto: Divulgação - Edésio Fernandes/EM/D.A. PressHouve artistas brasileiros que trabalharam o azulejo antes dele, inclusive Cândido Portinari – de quem foi assistente no painel da Igreja São Francisco de Assis, na Pampulha. Mas foi Athos Bulcão (1918-2008) quem fez o marco da azulejaria brasileira. “Ele não dizia isso de si, reportava tudo a Portinari. Mas estudos posteriores mostraram que, mesmo que vários modernistas tenham experimentado, nenhum deles ultrapassou os quatro azulejos que fazem um desenho, que vem da matriz portuguesa. Quem vai brincar com isso, inovar, é o Athos”, comenta Marília Panitz.

Ao lado de André Severo, ela assina a curadoria da mostra 100 anos de Athos Bulcão, que celebra o centenário do artista nascido no Rio de Janeiro que se tornou o “artista de Brasília”. A exposição, promovida pelo Centro Cultural Banco do Brasil, será aberta hoje ao público de Belo Horizonte. Lançada em janeiro no CCBB da Capital Federal, chega agora à filial mineira – no segundo semestre vai para os centros culturais do Rio e de São Paulo.

Qualquer leigo pode entender a fala da curadora. É só olhar para o Edifício Niemeyer, na Praça da Liberdade, ao lado do CCBB, e ver que os azulejos – hoje um tanto deteriorados pela passagem do tempo – que acompanham as curvas da edificação não formam um desenho fechado em si.

São peças gráficas que vão se multiplicando.

Assim como a azulejaria de Bulcão, aberta para o mundo, a mostra não se fecha na vertente que o consagrou. Apresenta as mais diferentes atuações do artista, que trabalhou em cenografia, figurino, fotografia, pintura, desenho e escultura. Traz ainda um segmento dedicado a artistas mais jovens que o têm como referência.

E quem faz o caminho é o próprio Bulcão. Cada um dos núcleos da exposição traz um texto pinçado de uma entrevista concedida em 1998, quando completou 80 anos. “Brasília, sendo uma ‘jovem senhora’, tinha um certo complexo de falta de identidade. Ainda que tenha o arquiteto dos arquitetos (Oscar Niemeyer), a cidade teve também uma figura como a do Athos, que contribuiu para a formação da identidade de seus habitantes”, comenta Marina,

Para a curadora, a produção de Bulcão, “embora pareça diversa, é muito interconectada. Toda a experimentação dele vai aflorar na arte e na arquitetura, que é a parte da obra mais importante, no sentido de trazer um impacto na sociedade”.

100 ANOS DE ATHOS BULCÃO
Exposição no CCBB, Praça da Liberdade, 450, Funcionários.
De hoje (11/04) a 24 de junho. Visitação de quarta a segunda, das 9h às 21h. Entrada franca.

Os caminhos de Bulcão


• A cor da fantasia
Trabalhos figurativos são a parte menos conhecida da obra do artista. Neste núcleo, destacam-se vestes litúrgicas desenhadas para os padres da Catedral de Brasília (que nunca as usaram), como também pequenos quadros que retratam a vida de Nossa Senhora. Pintados sobre mármore, os quadros aparecem em reproduções – apenas uma peça é original. Em contraponto, o núcleo ainda apresenta imagens de carnaval, realizadas já no fim da vida, quando o artista sofria de mal de Parkinson. “A paleta (de cores) não muda. As formas são semelhantes tanto no sagrado quanto no profano”, chama a atenção o curador André Severo.

• Devaneios em preto e branco
Reúne outra parte bastante conhecida da obra de Bulcão, as fotomontagens, que integram o acervo da Fundação Athos Bulcão – a outra coleção completa que existe é do Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro.

Acompanhando as fotomontagens estão as matrizes em que o artista trabalhou.

• É tudo falso
Assim como outros artistas de sua época, Athos Bulcão questionava a ideia da originalidade, como também da falsificação. Neste núcleo estão presentes esculturas de bichos em pequena escala, que depois ganhariam dimensões grandes na Rede Sarah de hospitais de reabilitação – foi, inclusive, no Sarah de Brasília, que traz algumas dessas obras, que o artista morreu, em 2008.

• A geometria e a poesia
As cores que o artista trabalhou são o destaque deste núcleo através de três conjuntos de obras. Máscaras, reunidas pela primeira vez a partir de coleções particulares e públicas; telas que mostram diferentes texturas criadas a partir de círculos, pontos e cruzes; e estudos de painéis de azulejos, desenhos e gravuras.

• A forma reinventada e seus modos de usar
Também um lado pouco conhecido da obra de Athos Bulcão. Revela, ainda no início da carreira, no Rio de Janeiro, sua atuação nas artes cênicas – foi cenógrafo e figurinista do Teatro Tablado, assinando espetáculos como Tia Vânia, de Anton Tchekhov. Há ainda trabalhos em capas de revistas e livros – um dos destaques é a quarta edição de O encontro marcado, de Fernando Sabino –, bem como a produção de lenços. Em 1949, ele fez um estudo para lenços, que nunca tinha saído do papel – a exposição produziu três dos seis projetos criados por ele.

• Construções/Montagens: A invenção de uma forma de integração da arte à arquitetura
Maior núcleo da mostra, reúne parte dos trabalhos mais conhecidos do artista e como eles interagiram com as cidades onde foram realizados. É de Brasília, evidentemente, a maior parte dos projetos. Mas ainda se vê a marca que ele deixou em Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Natal, Recife, além de Buenos Aires (Argentina), Praia (Cabo Verde), Lagos (Nigéria) e Milão (Itália), entre outras cidades.

• Rastros de Athos Bulcão
Ocupa duas salas do CCBB. Nas paredes, convivem trabalhos em azulejo tanto de Athos Bulcão quanto de artistas que o têm como referência. “São azulejistas novos, como Pedro Verçosa e Felipe Cavalcanti e outros, de 50, 60 anos, que conviveram com eles nos encontros que promovia em sua casa, chamado Chá do Athos, como o Wagner Barja (atual diretor do Museu Nacional da República)”, conta Marina Panitz.
Também neste núcleo está um trabalho do mineiro Alexandre Mancini, o único artista chancelado pela Fundação Athos Bulcão.

UM PAINEL APAGADO
Entre os 300 trabalhos expostos no CCBB está a serigrafia Pampulha II (1992). Uma versão da obra integrou o projeto arquitetônico do Shopping Del Rey desde sua inauguração, em 1991. O painel esteve em uma das entradas do centro de compras. Quinze anos mais tarde, foi encoberto. Procurada pelo EM, a atual administração do shopping, que assumiu a gestão em 2006, afirmou, através de sua assessoria, que o painel foi encoberto “após apresentar sinais de desgastes naturais do tempo, que comprometeram a forma estética criada pelo artista. A tomada de decisão sobre o processo de revitalização do espaço foi analisada por uma equipe de especialistas. Antes de optar pela substituição da serigrafia, os responsáveis verificaram a lista de obras tombadas pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan)”.

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