''Sempre compreendi o desenho como minha linguagem, tanto que considerava a verdadeira maneira de fazer arte, pela sua concisão, espiritualidade e falta de cor. O desenho é uma escrita.'' Álvaro Apocalypse (1937-2003) foi pintor, ilustrador, gravador, desenhista, professor. Mas foi como fundador do Grupo Giramundo (1970), mais importante companhia de teatro de bonecos do país, que sua arte ganhou mundo.
O baú de Álvaro Apocalypse, mostra que será aberta ao público, nesta terça-feira (3/10), em dois andares de galerias no Cine Theatro Brasil Vallourec, revela boa parte de sua produção. Maior exposição já dedicada ao artista, vai reunir uma centena de obras – pinturas, desenhos, placas, cadernos, estudos. Setenta por cento do material é inédito.
''Álvaro tinha muita coisa guardada, coisas inacabadas. E como artista era rápido. Para ele, não se corrigia um desenho. Ele fazia um quadro.
O material todo do artista, à exceção da obra com o Giramundo, está atualmente sob a guarda de Paulo. Ele acredita que a pinacoteca do avô chegue a 300 trabalhos. Para a exposição, selecionou os mais marcantes.
''Tem muita coisa da vida pessoal, como desenho do cachorro dele, da Teresinha numa rede (a artista Teresinha Veloso, mulher de Álvaro e cofundadora do Giramundo), uma série de desenhos feitos em tecidos. Algumas obras ele nem chegou a assinar'', diz Paulo.
A trajetória do artista foi analisada recentemente no livro Álvaro Apocalypse (2012), com texto crítico de Márcio Sampaio. No volume, o crítico desvenda o trabalho do mineiro, que, no início da carreira, nos anos 1950, revela o traço modernista. Influenciado por Candido Portinari, o grande tema de Apocalypse vem do povo.
DITADURA A partir do golpe militar de 1964, emergem personagens da realidade fantástica e temas críticos da realidade social. Artista que nunca se importara muito com a cor – ''O mundo deveria ser preto e branco'', disse, certa vez –, Apocalypse passa, a partir dos anos 1970, a se dedicar à cor, ao vencer um concurso que o leva a uma temporada de dois anos na França. No mesmo período, trabalha com grandes painéis.
O grosso da exposição vem de material dos anos 1970. ''Depois, com o sucesso do Giramundo, sua produção diminuiu'', conta Paulo. Logicamente, o trabalho junto à companhia não vai ficar de fora da exposição. Haverá pelo menos duas dezenas deles, de diferentes espetáculos. E ainda foram impressos, em 3D, dois quadros. A intenção com os trabalhos em alto relevo é promover a interação com deficientes visuais.
Em Belo Horizonte, a última exposição dedicada a Álvaro Apocalypse já tem mais de 10 anos.
O curador Rodrigo Moura se apropriou do título para uma exposição realizada ao longo deste semestre no Museu de Artes e Ofícios (MAO). Aberta em agosto, Um atrapalho no trabalho (Apud Paulo Leminski) vai até o início de dezembro. A ideia é promover o diálogo da produção da arte contemporânea com o acervo do museu, único do país a se dedicar exclusivamente ao trabalho.
Para tal, o curador convidou cinco artistas para fazer intervenções com trabalhos que se relacionem com o acervo da instituição. Mas a exposição não vem pronta. As obras são apresentadas aos poucos. A cada nova instalação (Cao Guimarães e Patrícia Leite foram os dois primeiros), Moura promove uma conversa com cada autor.
Nesta terça-feira, o curador se encontra com o terceiro convidado. Mineiro radicado em São Paulo, Thiago Honório apresenta Pencas.
As pencas de Honório são operações muito simples. Ele juntou várias luvas de trabalhadores pelo punho. O resultado remete a pencas de banana. O artista teve outra obra exposta recentemente em BH. Na exposição Entre nós – A figura humana no Masp, apresentada no CCBB, Honório exibiu a instalação Trabalho, que se apropriou de ferramentas de operários.
Ainda neste mês, a mostra vai apresentar, também em lançamentos seguidos de conversas com o curador, obras dos artistas Cristiano Rennó e Paulo Nazareth. Dessa maneira, ao longo de novembro e no início de dezembro, trabalhos dos cinco artistas poderão ser vistos em conjunto no museu. Para o fim da exposição está previsto o lançamento do catálogo que documenta todo o processo.
O BAÚ DE ÁLVARO APOCALYPSE
Exposição no Cine Theatro Brasil Vallourec, Praça Sete, Centro, (31) 3201-5211. Até 5 de novembro. Visitação de terça-feira a domingo, das 11h às 19h. Entrada franca.
UM ATRAPALHO NO TRABALHO (APUD PAULO LEMINSKI)
Instalação de Thiago Honório. O artista conversa com o curador Rodrigo Moura, nesta terça-feira (3/10), às 19h, no Museu de Artes e Ofícios, Praça Rui Barbosa, 600, Centro. Informações: (31) 3248-8603. Entrada franca.
Oficina e espetáculo Além da mostra O baú de Álvaro Apocalypse, o Cine Theatro Brasil Vallourec vai apresentar, no dia 12, às 16h, o espetáculo O carnaval dos animais, do Grupo Giramundo. Ingressos: R$ 40 (inteira) e R$ 20 (meia). Na Semana da Criança ainda haverá uma oficina gratuita de marionetes com os integrantes do Giramundo. Mais informações: www.cinetheatrobrasil.com.br