Bach – com música de Marco Antônio Guimarães sobre a obra de Johann Sebastian Bach – é a única montagem da companhia mineira que tem cenas aéreas. Tubos metálicos (referência aos órgãos das igrejas barrocas) presos no teto servem para os bailarinos como uma ponte entre céu e terra.
Gira – com trilha criada pelo trio paulistano Metá Metá – também carrega sua carga de unicidade. É o primeiro dos 39 espetáculos do grupo a manter os bailarinos no palco durante toda a apresentação.
E há ainda uma leitura que faz com que as montagens sejam complementares: a busca pelo divino. O coreógrafo Rodrigo Pederneiras afirma não ter sido esta a intenção. Escolheu Bach para dividir com Gira a temporada 2017 do Corpo porque o espetáculo não era apresentado há uma década no país. Mas ele vê sentido na relação.
“A intenção de fazer Bach veio depois de conversas com Marco Antônio.
Considerado o maior compositor do Barroco alemão, Bach ganhou, na visão do Corpo, uma relação com o Barroco mineiro – visto através das cores do espetáculo – azul, grafite e dourado – que remetem às igrejas históricas.
Gira, por seu lado, tem uma clara intenção de se conectar com o divino. Mas algo totalmente terra, chão. Se os ritos da umbanda serviram como inspiração da companhia, é a figura de Exu – o orixá que é o mensageiro entre o mundo espiritual e o material – que guia toda a coreografia. A sugestão do tema veio do próprio Metá Metá (Juçara Marçal, Thiago França e Kiko Dinucci), grupo que trabalha com a música afro-brasileira.
Na umbanda, a gira é o espaço e o momento em que as entidades “descem” para que as pessoas se elevem. “Se a gente ia fazer um espetáculo sobre a gira, obviamente teríamos que falar de Exu, que é quem faz a conexão com as outras divindades”, conta Pederneiras.
Na visão do Corpo, as giras se dão através de solos, duos, trios e outras formações que buscam traduzir as relações entre humano e divino. “Eu não podia usar a dança afro, pois cairia no óbvio. É dança contemporânea. Não há um simulacro de terreiro no palco”, acrescenta o coreógrafo.
Na tradução da companhia, a gira ocorre num quadrado negro, muito iluminado, em que os bailarinos, com o mesmo figurino – saias brancas, unicamente –, representam diferentes entidades. Quando não estão em cena, os bailarinos permanecem “escondidos” sob um tule negro nas laterais do palco, onde ficam as coxias.
Aos 62 anos, 42 deles dedicados à dança, Pederneiras, de formação católica “ferrenha, muito rígida”, admite sua ignorância sobre religiões de matriz africana, até iniciar o trabalho atual. “Eu tinha uma ideia equivocada de Exu, pensava numa identidade meio do mal. E é justamente o oposto.”
Para Pederneiras, a imersão no universo da umbanda teve início com uma série de leituras.
O espetáculo anterior do Corpo assinado por Pederneiras foi Dança sinfônica (2015), que celebrou a trajetória de 40 anos do grupo. Gira, agora, já vem apontada pela crítica especializada como a possibilidade de uma nova fase. “Não sei o que dizer sobre isso. Só sei que Gira é um trabalho muito especial para toda a companhia, que teve uma participação grande na elaboração. Deu uma sacudida geral em todo o tipo de gente. Tem gente que fica agitada nas apresentações, algumas pessoas até choram. Eu estou meio emotivo também”, conta Pederneiras.
Se alguém der sorte, pode até assistir a uma das sessões a seu lado.
BACH
Espetáculo de 1996 com coreografia de Rodrigo Pederneiras, música de Marco Antônio Guimarães (sobre a obra de J.S. Bach), cenografia de Fernando Velloso e Paulo Pederneiras, figurino de Freusa Zechmeister e iluminação de Paulo Pederneiras. Duração: 45 minutos. A montagem volta ao cartaz no Brasil depois de 10 anos. Vigésima sexta coreografia do Corpo, estreou em setembro de 1996 na Bienal da Dança de Lyon, na França. Foi a primeira produção do grupo como companhia residente da Maison de La Dance, espaço que o Corpo ocupou por três anos.
GIRA
Espetáculo com coreografia de Rodrigo Pederneiras, música do Metá Metá, cenografia de Paulo Pederneiras, figurino de Freusa Zechmeister e iluminação de Paulo e Gabriel Pederneiras. Duração: 40 minutos. A montagem estreou em São Paulo, em 4 de agosto. Pela primeira vez, o Corpo abriu sessões extras na capital paulista, resultando em nove apresentações ao todo. Depois da temporada em BH, a montagem segue para Porto Alegre (em 7 e 8 de outubro). Trigésima nona coreografia do Corpo, é a primeira que coloca todos os bailarinos (19) em cena durante todo o tempo.
GRUPO CORPO
Espetáculos Bach e Gira. Palácio das Artes, Avenida Afonso Pena, 1.537, Centro, (31) 3236-7400. Hoje, às 20h30; amanhã, às 19h; terça e quarta, às 20h30; quinta, às 19h. Ingressos esgotados. Sessão extra na sexta (dia 8), às 20h30. Ingressos: R$ 100 (inteira, plateias 1 e 2) e R$ 80 (inteira, plateia superior). Venda no local e no site www.ingressorapido.com.br..