Acompanhado apenas de um auxiliar de som, realiza sozinho as reportagens do programa que há quatro anos leva seu nome, na GloboNews. É na estrada que ele escreve as crônicas que publica semanalmente nos jornais O Globo e O Estado de S. Paulo. E foi também durante as viagens que ele deu início ao que chama “cadernos de um aprendiz”. São textos em que reflete sobre a jovem democracia brasileira.
Democracia tropical – Cadernos de um aprendiz (Sextante), livro que chega nesta segunda (24) às livrarias, faz dois caminhos. Reúne as crônicas publicadas na imprensa em 2016 antes, durante e após o impeachment da presidente Dilma Rousseff. Essas são entremeadas com os textos que refletem sobre os rumos do país nas últimas três décadas
Escritor, jornalista, ex-deputado federal, ex-militante da luta armada, um dos fundadores do Partido Verde, é hoje um dos mais conhecidos críticos da gestão petista, partido que abandonou em 2003. Entre esquerda e direita, prefere se colocar hoje como uma pessoa que “luta contra a corrupção”. Muitas das pautas de seu programa buscam mostrar um olhar bem pessoal sobre a questão.
Conversou com o Estado de Minas na última semana, de Rondônia, onde fazia reportagem sobre a Usina de Santo Antônio, no Rio Madeira, em Porto Velho. “Aquela em que a Odebrecht comprou todo mundo. Governador, deputados, polícia e até os índios.”
Na apresentação de Democracia tropical o senhor fala sobre a dificuldade de escrever um livro que não tem um ponto final. Como o senhor vê os acontecimentos no Brasil desde que entregou a obra à editora?
O livro trata de uma crise que está se desenvolvendo. Se eu tivesse que esperá-la, teria que aguardar até 2018. E, mesmo assim, não estaria seguro de que ela poderia acabar
No texto Esperança difusa o senhor fala sobre a queda do Muro de Berlim, comentando que se ele tivesse caído “nas cabeças tropicais” a situação poderia ter sido outra. Acredita que o “Muro de Berlim” está caindo agora na América Latina?
Quando estava na Alemanha e o muro havia caído, os camelôs vendiam as pedras dele. A procura foi tão grande que eles começaram a falsificá-las. O que está caindo agora aqui é um muro falsificado, inclusive num contexto de continente. O que se tentou na Venezuela com o rótulo de socialismo do século 21 foi um socialismo que chegou através das eleições, em vez da luta armada. O Executivo foi colonizando os outros poderes, começando pelo Parlamento. Ou seja, foi um modelo de socialismo falsificado.
Fazendo um pouco de futurologia, o que acha que pode ocorrer até as eleições de 2018?
Estou trabalhando com uma possibilidade negativa, que é o avanço dos populismos. Como o populismo de esquerda fracassou muito recentemente, acho que ele terá menos capacidade de seduzir, pois está na memória do povo. Já o populismo de direita é jovem. Com o sucesso de Trump nos EUA, é muito possível que ele tenha uma grande repercussão aqui. Mas não a ponto de conquistar o poder. Acho que terá um crescimento político razoável. Quanto à esquerda, normalmente o cenário que trabalhamos é de um confronto de esquerda e direita. Na esquerda, existem variáveis não resolvidas, por exemplo, se o Lula vai se aguentar como candidato. A esquerda está tendo uma dificuldade em reconhecer seus erros e fazer uma autocrítica. É muito possível que uma sucessão de fatos negativos acabe massacrando a esquerda, pois o Lula ainda é uma incógnita.
No livro, o senhor também fala que jogou fora algumas certezas que tinha sobre o marxismo. Que certezas tem hoje?
Não é que eu tenha certeza, mas tenho convicção de que o processo político brasileiro continuará a ser democrático. Na minha cabeça está descartada qualquer solução não democrática, seja violenta ou não. Acho que nós passamos por um período em que houve grande cisão entre o que querem as pessoas e o sistema político-partidário. Acho que o Brasil deve apresentar, nos próximos anos, uma reaproximação do sistema político-partidário de acordo com as aspirações da sociedade.
Durante o exílio, o senhor viveu em alguns países, como o Chile e a Suécia. Deixaria o Brasil agora?
Não. Outro dia até pensei nisto, pois tenho visto um movimento, em setores da classe média, de deixar o Brasil. Tem muita gente em Portugal, jovens no Canadá... Eu passei muitos anos fora e minha forma de viver no Brasil hoje é pular de um lugar para o outro dentro dele. Nos últimos quatro anos, nunca estou no mesmo lugar.
Num país dividido, sem muitas nuances, como o senhor se coloca hoje?
Colocaram-me à esquerda durante algum tempo. Há alguns anos, a própria esquerda estranha minha posição, acha que me aproximei da direita. Não me aproximei da direita como pensam. À medida que você vai ficando velho, as coisas vão simplificando. Minha luta principal no Brasil é a luta contra a corrupção. Estou disposto a trabalhar com pessoas que lutem contra a corrupção. Com uma ressalva: não trabalho com aqueles que acreditam numa saída autoritária. Só que a esquerda brasileira definiu a corrupção como um não tema, uma não pauta. É muito complicado para ela hoje trabalhar isto. A impossibilidade de haver um entendimento com ela está nesta luta contra a corrupção.