A ideia de produzir o livro partiu de Herkenhoff e coincidiu com o interesse do colecionador Salim Mattar.
“Paulo vinha escrevendo sobre o meu trabalho. Muito cuidadoso, ele cria cadernos para os artistas. Tinha cinco cadernos só com os meus trabalhos.” Para produzir o livro, além da pesquisa em andamento, Herkenhoff acompanhou a artista no ateliê e teve várias conversas. “Eram conversas muito boas, que sempre acrescentavam algo”, recorda Niura.
Ao olhar para a trajetória apresentada no livro, a artista pontua que é possível perceber como trabalhos de diferentes épocas ecoam um no outro. Um das obras apresentadas na publicação, Projeto aurora nasceu do fascínio da artista com a cor das casas de descendentes quilombolas em um distrito de Diamantina. As casas eram de taipa. “No ateliê, a taipa é filtrada com água destilada e misturada com aglutinante, resultando em inúmeros potes”, descreve o curador sobre a técnica usada pela artista.
Esse trabalho traz uma coincidência muito significativa para Niura. Ela foi convidada para apresentá-lo numa exposição individual no Paço Imperial, no Rio de Janeiro. A artista foi surpreendida quando descobriu que o trabalho, que dialoga com a comunidade quilombola, seria exposto na sala onde foi assinada a Lei Áurea, em 13 de maio de 1888. “Abro esse trabalho com rodapé com as marcas dos pés dos artesãos do Vale do Jequitinhonha.”
Outra obra apresentada no livro é Meteoros, em que Niura pinta usando pó de meteoritos. Ligada à ideia de vida e morte, a obra é a forma que a artista encontrou para manter a presença do irmão.
A obra que encerra o livro é o média-metragem NháNhá, de 2014, que nasceu de maneira inesperada. Numa viagem de férias a Minas Gerais, ela viu uma casa no alto do morro descascada e se encantou. “Não estava buscando nada. A casa me encontrou. Parecia uma visão.” Em seus trabalhos, Niura segue à risca a máxima de que vida e arte são uma coisa só. Por isso, se afeta com aspectos singelos do dia a dia e os transforma em arte. Depois dessa bem-sucedida experiência com o audiovisual, ela tem planos de realizar um longa-metragem.
O média-metragem mostra a casa no topo de um morro de terra, tomada por uma poeira vermelha. “NháNhá é a dimensão terrenal das entranhas de um lugar que não precisa de um acidente cósmico para se devastar, bastando o homem em sua voracidade para acelerar o Antropoceno, a era geológica e climática decorrente da intervenção humana sobre o equilíbrio de seu planeta”, escreve Herkenhoff.
Em função de NháNhá, foi convidada para fazer algo tendo como ponto de partida a tragédia no município de Mariana, quando, em 5 de novembro do ano passado, uma barragem se rompeu e uma onda de lama levou morte e devastação para o distrito de Bento Rodrigues, riscado do mapa, e outras localidades ao longo do Rio Doce. A artista foi até a localidade e colaborou no que pôde, mas não transformou o que viu em trabalho.
LANÇAMENTO
Hoje, das 11h às 15h, na Quixote Livraria e Café (Rua Fernandes Tourinho, 274, Savassi, (31) 3227-3077).
NIURA BELLAVINHA
. De Paulo Herkenhoff
. Editora Cobogó
. 280 páginas
. R$ 132.