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Ivens Machado ganha sua primeira mostra em Belo Horizonte

Com cacos de vidro, concreto e folhas quadriculadas, o escultor catarinense deixou obra instigante. A exposição Todos por um pode ser vista na Periscópio Arte Contemporânea

Walter Sebastião
Esculturas de Ivens Machado valorizam materiais considerados 'menos nobres' - Foto: Periscópio/divulgação

Um artista importante, mas pouco conhecido, queria apresentar os trabalhos dele em Belo Horizonte. Porém, morreu antes de concretizar esse desejo. Ivens Machado (1942-2015), escultor, gravador, pintor e videomaker catarinense, ganha exposição na Periscópio Arte Contemporânea. Com curadoria de Wilson Lázaro, a mostra traz quatro esculturas e um vídeo – Ivens é pioneiro no uso dessa mídia no país. Todas as obras vêm de seu próprio acervo.

A exposição mineira conta também com peças de Ernesto Neto, Marcone Moreira, Rodrigo Cass, Mauro Restiffe e Lucas Simões. Lázaro explica que esses autores exibem trabalhos que dialogam com a obra de Ivens Machado, inclusive no uso de materiais não convencionais. Não se trata de criadores influenciados por ele, observa o curador.

“Ivens Machado tem presença forte, direta ou indiretamente, na arte brasileira. Ele abre um olhar novo sobre a vida e o mundo.
Sua obra tem frescor, é sempre nova”, afirma Wilson Lázaro. Exemplo disso podem ser as reverências de críticos à obra dele, mas, especialmente, o fato de ser muito querido pelos colegas. Vários deles, como a pintora Adriana Varejão, citam-no como o criador que respeitam e admiram.

De acordo com Lázaro, trata-se de um autor que afirmava a criação, antes de tudo, independentemente de materiais utilizados, das limitações impostas pelo mercado ou da preocupação com erros e acertos. “Ele dizia: ‘No final dá certo’”, recorda o curador, com bom humor. “É raro criar com tal liberdade, como faz o Ivens”, pondera.

POLÊMICA


O uso de materiais “não nobres” provocava alguma polêmica, em especial no mercado de arte. “Mas sempre existiram aqueles que saudavam a singularidade da obra dele”, afirma Lázaro, lembrando que o artista tem várias obras nas mais importantes coleções brasileiras.

O curador diz que o circuito internacional de arte começa a mostrar interesse pela obra de Ivens Machado. Logo depois de sua morte, em maio de 2015, em decorrência de uma queda em casa, o Centro Georges Pompidou comprou um vídeo dele para levar para a França. Tal interesse vem pela qualidade da obra, mas também para suprir uma lacuna no que se refere a criações dos anos 1970, observa Lázaro, prevendo para Ivens a mesma celebração que ocorreu em torno de Hélio Oiticica, Lygia Clark e, mais recentemente, Lygia Pape.


Wilson Lázaro, que morou por três anos no primeiro pavimento da casa de Ivens Machado, não esconde o carinho pelo amigo. “Uma coisa me marcou: em qualquer lugar, ele via coisas que podiam ser arte, transformava tudo em arte. Ivens fazia tudo com intensidade, paixão e tesão”, acrescenta. “Foi um homem que viveu bem e intensamente, inclusive os dramas dele”, revela. Suas esculturas têm como motivo o enfrentamento de medos, incertezas, fantasmas e preconceitos.

A venda de obras do artista tem o objetivo de arrecadar recursos para cuidar do acervo dele, sob responsabilidade da designer Mônica Grandchamp, por decisão da família. O projeto é criar o Instituto Ivens Machado, que administraria tanto a obra do catarinense quanto a de outros autores com perfil parecido com o dele.

TODOS POR UM


Obras de Ivens Machado, Ernesto Neto, Marcone Moreira, Rodrigo Cass, Mauro Restiffe e Lucas Simões.
Periscópio Arte Contemporânea – Avenida Álvares Cabral, 534, Centro, (31) 3567-0881. Aberta de segunda a sexta-feira, das 10h às 19h, e sábado, das 10h às 14h. Até 28 de janeiro.

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Do ferro ao vidro


Nascido em Florianópolis, Ivens Machado se mudou, ainda jovem, para o Rio de Janeiro. Estudou gravura na Escolinha de Arte do Brasil e foi aluno da artista plástica Anna Bella Geiger. Na década de 1970, criou desenhos fazendo interferências sobre folhas pautadas ou quadriculadas. Uma característica de suas esculturas, além da concepção que sintetiza balanço poético e crítico, é o uso de ferro, concreto, argila e cacos de vidro. “Ivens valoriza o fazer artístico. É quase artesão, mas com toda a sofisticação do artista”, explica o curador Wilson Lazaro. Ivens Machado assina uma imagem antológica, reproduzida nos mais diversos contextos: o mapa do Brasil feito de cimento e cacos de vidro..