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Exposições em Congonhas e BH mostram fotos do Jubileu de Bom Jesus de Matosinhos na cidade histórica

Imagens foram feitas pelo fotógrafo francês Marcel Gautherot e há 70 anos atrás

Eduardo Tristão Girão

O Jubileu de Bom Jesus de Matosinhos de Congonhas é a maior peregrinação religiosa de Minas Gerais, atraindo cerca de 200 mil visitantes e romeiros ao longo de pouco mais de uma semana, sempre em setembro.

Registro da romaria no Jubileu do Santuário do Bom Jesus de Matosinhos, em Congonhas, na década de 1950 - Foto: Marcel Gautherot/Divulgação 

Uma demonstração emocionante de como a fé continua a mobilizar pessoas – nesse caso, há mais de dois séculos. Não por acaso, tal expressividade ganhou a atenção do fotógrafo francês Marcel Gautherot (1910-1996), que, 70 anos atrás, fez mais de mil imagens a respeito, incluindo registros da arquitetura histórica da cidade.

Coincidentemente, duas exposições focadas no artista, ambas com esse recorte e fotos do Instituto Moreira Salles (IMS, que detém seu acervo completo), chegam a espaços importantes do estado.

 

A primeira delas, no Museu de Congonhas, reúne cerca de 30 fotos e espaço com projeção que usa a tecnologia paralaxe, dando ao visitante a sensação de imersão nas cenas. Já a segunda, na CâmaraSete, espaço belo-horizontino dedicado à fotografia, conta com 39 imagens, um terço delas jamais exibido.

Gautherot estudou arquitetura, mas largou o curso para se tornar fotógrafo. Veio morar no Brasil em 1940: viajou o país registrando paisagens diversas, documentou a construção de Brasília a convite de Oscar Niemeyer, foi repórter da revista O Cruzeiro e colaborou com o Itamaraty, os Correios, Roberto Burle Marx (seus projetos de paisagismo foram clicados pelo francês) e o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (atual Iphan).

 

Quando visitou Congonhas, nos anos 1940, percebeu que precisaria de tempo.


“As pessoas passavam por Congonhas e não tinham ideia do porquê de a cidade ser considerada patrimônio cultural mundial pela Unesco. O Museu de Congonhas mostra o que está por trás do Santuário de Bom Jesus de Matosinhos e as imagens do Gautherot traduzem isso. Ele mostra essa esperança, essa fé que move montanhas.

É um fotógrafo impressionante e a cidade o impressionou muito. Tanto que essas fotos representam a maior parte do acervo dele e o IMS editou um livro sobre Congonhas”, diz Sérgio Rodrigo Reis, diretor do museu e curador da exposição, aberta até dezembro.

Paralelamente, conta Reis, a fotógrafa Eliane Gouvea recebeu do museu a encomenda de ir para as ruas durante o jubileu, que termina domingo, e refazer a experiência que Gautherot teve nas ruas de Congonhas, no meio da multidão, décadas atrás.

 

“As expressões das pessoas são as mesmas daquela época. A gente vê que a fé e devoção que movem as pessoas são as mesmas até hoje. Elas continuam visitando a cidade num momento de extrema aflição, recorrem ao sagrado e vão lá pagar a promessa”, diz ele. As novas fotos têm alimentado o site do museu, bem como os perfis da instituição no Facebook e Instagram.

Meio antropólogo, meio repórter “Gautherot tinha olhar aguçado para o cotidiano, com formas bem organizadas e preocupação com a luz e o momento, o que é influência do fotógrafo Henri Cartier-Bresson.

 

A gente entra numa atmosfera de décadas atrás, vê como as pessoas se vestiam, como se comportavam em grupo. O trabalho resistiu pela sua qualidade estética, pois um simples documento não resistiria”, analisa o fotógrafo Eugênio Sávio, curador da exposição na CâmaraSete, em BH, ao lado de Cristiano Mascaro.

 

A mesma mostra integrou, em março, a programação do Festival de Fotografia de Tiradentes, evento do qual Sávio é organizador.

Os dois viajaram até o IMS, no Rio de Janeiro, onde tiveram acesso à obra completa do fotógrafo francês, o que inclui, além de 25 mil negativos, as provas de contato dele (impressão de várias fotos em tamanho menor, juntas numa mesma folha, para facilitar a seleção).

 

“Nessas provas, temos o pensamento do fotógrafo. Ele as fazia organizadas, já editadas, cortando e envelopando os negativos um por um. Ele dava uma certa editada, sem colocar tudo. Aliás, ele passou uns 10 anos organizando o acervo dele”, conta Sávio.

Para o curador, trata-se de um olhar ainda atual e que segue como influencia para as novas gerações de fotógrafos.

“Ele era documentarista, bressoniano, o que vale para hoje. Ainda é um trabalho importante. Ele fazia uma abordagem geral dos acontecimentos, com multidão, detalhe de um personagem, entorno do acontecimento. Uma visão meio de antropólogo, meio de repórter”, analisa.

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