João Carlos Choairy, de 81 anos, é de São Bento, interior do Maranhão, e vive em Belo Horizonte desde 1952. Cresceu ouvindo música flamenca e Jacob do Bandolim. Jovem, foi morar com a madrinha em São Luís, a capital maranhense.
Há alguns anos, ao descobrir um luthier que fazia cavaquinhos, Choary não teve dúvidas: comprou quatro instrumentos pagando em dólar. Um deles era para ele, outro deu para o amigo Waldir Silva. “Como o dele não era uma Brastemp e solos com tampo de pinho sueco ficam melhores, achei que Waldir gostaria de um instrumento melhor.” Mas o novo cavaquinho de Waldir Silva acabou sendo roubado. E Choary deu ao mineiro um segundo cavaquinho. “Fui movido por amizade. Éramos irmãos”, diz, lembrando que tocaram juntos por muitos anos.
Com o tempo, doou instrumentos para cinco músicos que admirava. Por diversos motivos, como explica, sendo o mais comum o caso de músicos humildes e talentosos. Houve vezes em que ele ouviu o músico tocando e gostou tanto que decidiu por uma frase clássica para a ocasião: pode ficar com o cavaquinho. “Deixa os meninos tocarem num instrumento bom. Tenho outros”, afirma, com gentileza e generosidade.
SORRISO “Todos a quem doei um cavaquinho estão fazendo bom uso dele”, observa, satisfeito. Se ouve que o músico prefere o instrumento que ganhou dele, fica mais feliz ainda. “Não quero nada em troca. Só o sorriso, que quase chega às orelhas, me basta. O moço lá de cima tem de dado saúde sem pedir nada em troca. Então, agradeço a Deus e a Nossa Senhora por terem me dado a chance de ajudar os músicos.” Mas ele faz uma ressalva: “A meninada é muito do rock. Temos de incentivá-los a conhecer e tocar a nossa música mais autêntica, que é o chorinho”, acrescenta o fundador do grupo de seresta Canta Brasil.
O fotógrafo Miguel Aun é respeitado pelos trabalhos que faz, como algumas imagens antológicas de Minas Gerais, como também pela generosidade. Já emprestou equipamentos a colegas, sempre estimulou mais conhecimento da fotografia, cedeu fotos suas para catálogos e publicações, causas ecológicas e culturais, jovens artistas etc.
“Aparecia também na loja muita gente chata, como em qualquer festa. Mas eles ajudam a desmanchar bolinhos e panelinhas”, brinca Miguel Aun. “Sempre tinha alguém interessado em troca de conhecimento, querendo saber mais sobre técnica, tecnologia e arte fotográfica. É muito bom colaborar para o crescimento profissional de uma pessoa”, afirma. Houve dias, recorda, em que ele tinha de trabalhar, saía e deixava o pessoal conversando em seu estúdio.
“É da minha índole ser assim, gosto de gente e de bom astral”, afirma, contando que herdou este perfil do pai, Elias Aun, que criou, em 1935, a Foto Elias (que funcionou até 1995), a primeira a fazer revelação de fotos coloridas na cidade.
“É muito bom ajudar os colegas. Não há motivo para ficar escondendo conhecimento e, podendo, deixar de ajudar a quem quer melhorar na profissão”, afirma Aun. “A melhor opção de vida, não tem jeito, é ter amigos. Eles são essenciais. Fazem a diferença”, diz Aun. Ter bons amigos, enfatiza, faz bem até ao ego, enquanto ter inimigos não acrescenta nada.
Amílcar estendia as mãos
No depoimento a seguir, a galerista Beatriz Lemos de Sá revela o perfil generoso e solidário de Amílcar de Castro (1920-2002), uma faceta do artista pouco divulgada. “Amílcar de Castro foi homem generoso. Se via amigos, artistas, funcionários dele em dificuldade, prontificava-se a ajudar. Doava esculturas, o que quer dizer trabalhos de valor alto, para ajudá-los a pagar despesas, eventos de caridade, colaborar na criação e manutenção de galerias. Incentivou, ainda, colecionadores importantes a comprar obras de artistas que admirava.
Não dava ajuda apenas material. Ensinava as técnicas que conhecia, com conselhos e conversas, mantinha diálogo com alunos que admirava, mesmo depois de formados. Influenciava a postura deles, defendendo que deviam ser fiéis ao que acreditam, sem fazer concessões ao mercado.
Só ouvi-lo já era um estímulo. Foi um homem preocupado com o social, que não gostava de ser chamado de mestre nem de ser considerado superior a ninguém, que passava a impressão de uma constante vontade de ser extremamente justo com quem precisava ou merecia. Isso sem ficar alardeando que tinha essa postura. Comportar-se assim era do temperamento dele. Talvez isso se deva ao fato de ser filho de juiz, de ser formado em direito e das leituras filosóficas dele.”