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Videoinstalação no Inhotim convida espectadores a gravar depoimentos para integrar narrativa

Artista Christiane Jatahy insere depoimentos ao lado de filmes já editados nos quais personagens reais narram sua experiência de superação

Pedro Galvão
Cena da obra #florestaqueanda.doc, que se inspira em 'Macbeth' e encerra trilogia composta por Julia (2011) e 'E se elas fossem para Moscou?'(2014) - Foto: ALINE MACEDO/DIVULGAÇÃO

Em Macbeth, de Shakespeare, uma profecia dá conta de que o inimigo só seria vencido quando a floresta de Birnam se movesse até as alturas do Monte Dunsinane. Sob essa inspiração, Christiane Jatahy criou o projeto A floresta que anda, que propõe uma mistura de linguagens artísticas, com cinema e performance se intercalando no mesmo espaço, para fazer uma espécie de releitura da temática shakespeariana que fala sobre cobiça e poder. Um dos frutos da iniciativa concebida no ano passado pela dramaturga é a videoinstalação #florestaqueanda.doc, que estará no Espaço Igrejinha do Inhotim, em Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, hoje.

O ponto central de #florestaqueanda.doc é discutir o cenário político, social e econômico em que estamos inseridos, mostrando como esse sistema é capaz de atravessar e desconstruir nossas vidas. “É um desdobramento de uma pesquisa documental que comecei em 2013, em que falei com várias pessoas ao redor do mundo sobre a ideia de deslocamento. A videoinstalação de A floresta que anda é uma continuidade disso. Escolho pessoas jovens que tiveram sua vida atropelada por esse sistema político, econômico e social e mostro suas experiências”, afirma a artista.

Quem entrar na galeria reservada à obra encontrará quatro telões. Em cada um deles será exibido em looping um documentário, em forma de entrevista. Há um refugiado da República Democrática do Congo que testemunhou o assassinato da família, em consequência da disputa política no país e tenta reconstruir a vida em São Paulo.
Há um jovem que passou sete meses no presídio Bangu 1 por participar das manifestações de junho de 2013 no Rio de Janeiro. Há a sobrinha do pedreiro Amarildo, morto pela Polícia Militar carioca na favela da Rocinha em 2013, mas dado como desaparecido pela própria instituição. E há um refugiado da Síria preso e torturado depois de fazer denúncias contra o governo nas redes sociais. “São histórias de pessoas que se posicionam contra um sistema e são violentadas por ele”, define Jatahy.

A princípio, parece que o trabalho se resume ao cinema documental, mas não. Na entrada do espaço, a própria diretora aguarda o público com uma câmera nas mãos, e convida as pessoas a gravar depoimentos, à semelhança dos personagens dos filmes em exibição. A diferença é que os espectadores vão interpretar relatos alheios, que serão transmitidos ao vivo no interior da galeria, junto aos vídeos anteriormente preparados.

REALIDADE E FICÇÃO


“Essa interferência provoca uma mistura de realidade e ficção, o público vira ator e, quando sai do espaço interno para o externo, encontra aquela pessoa que viu na tela, confundindo o ficcional e o real e criando um grande coletivo de transformação”, diz a diretora.

A floresta que anda conclui a trilogia iniciada com Julia (2011) e que seguiu com E se elas fossem para Moscou? (2014). A autora deixa claro que não se trata de um espetáculo propriamente dito. A ideia é explorar as intertextualidades e os limites entre performance, teatro e cinema. No projeto que deu origem à videoinstalação, há uma atriz presente entre o público e as telas, desenvolvendo uma performance que trabalha de forma mais evidente o texto de Macbeth. A instalação que o Inhotim abriga é definida por Jatahy como uma “versão de galeria” da obra, onde a parte performática fica por conta do público exclusivamente.

#florestaqueanda.doc estreou no Rio de Janeiro em 2015, e já circulou por outras capitais brasileiras e cidades do exterior. Passar por Minas, especificamente pelo Inhotim, deixa Christiane Jatahy com boas expectativas em torno do resultado. “São duas coisas importantes – estar em Minas e no Inhotim, que é um espaço de transversalidade de artes e interação. Ali as pessoas são acostumadas a interagir com as obras.
É um espaço propício e lindo, estaremos misturados com artistas que admiro. Em Minas, sempre saio feliz com meus espetáculos, porque é um público interessado, que valoriza a arte. Além disso, o mineiro gosta de uma prosa, gosta de colocar seus pensamentos e suas ideias. Por isso espero uma contribuição muito boa com histórias que atravessam essa região.”

#florestaqueanda.doc

Videoinstalação de Christiane Jatahy. Sessões às 11h, 12h, 13h, 14h, 15h e 16h. No Inhotim – Espaço Igrejinha (Rua B, 20, Centro, Brumadinho). Entrada franca..