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Cidade natal de Guimarães Rosa promove a 28ª edição da Semana Roseana

O evento acontece em Cordisburgo, na Região Central de Minas, para celebrar os 60 anos da obra maior de Guimarães Rosa

Mariana Moreira
- Foto: Beto Magalhães/EM/D.A Press - 24/05/04
Sessenta anos depois, a recepção de Grande sertão: veredas é a mesma? “Com o correr do tempo, toda obra pode ter outra leitura, tanto por parte do leitor quanto da crítica”, afirma a professora de literatura da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Eneida Maria de Souza. Leu pela primeira vez a obra máxima de João Guimarães Rosa 40 anos atrás. O impacto foi enorme. Várias leituras depois, o encantamento permanece. “Na primeira vez, a linguagem, que era totalmente nova para mim, me fascinou.” À medida que foi relendo o romance, se interessou pelas intrigas da trama. Mas é a peculiaridade da linguagem, tantas décadas mais tarde, que faz com que ela considere o livro insuperável.

Com a efeméride do romance – que em maio completou seis décadas de publicação –, Grande sertão vai nortear boa parte da programação da Semana Roseana. A 28ª edição do evento em Cordisburgo tem início amanhã. Até sábado, a cidade natal do escritor recebe estudiosos, artistas, professores, escritores, estudantes e, principalmente, interessados em sua literatura para uma imersão em sua obra.

Eneida Maria de Souza e Walnice Nogueira Galvão, professora da Universidade de São Paulo (USP) e uma autoridade no romance roseano (é autora de As formas do falso: um estudo sobre a ambiguidade no Grande sertão: veredas) ministram palestra, na quinta-feira, sobre o livro.
Grande sertão é ainda pauta de narração de estórias (com o Grupo Miguilim), caminhada literária (uma delas, com o grupo Caminhos do Sertão, leva o título de Os amores de Riobaldo), exposições (Ave, sertão, de Dilce Laranjeira, e Acervo disseminado – Potes do sertão, de Inês Antonini e Liliane Dardot), oficina e performance.

Detentor do acervo do escritor e de sua segunda mulher, Aracy de Carvalho, o Instituto de Estudos Brasileiros (IEB-USP) celebra, no evento, parceria com a Secretaria de Estado de Cultura com a doação dos arquivos digitalizados e impressos (em edição fac-similar) das cadernetas de viagem de Guimarães Rosa. As anotações do escritor, transcritas em livro, foram realizadas durante a célebre viagem, em maio de 1952, pelo sertão mineiro ao lado de um grupo de vaqueiros. Tal imersão seria a fonte para Grande sertão e Corpo de baile, publicados quatro anos mais tarde.

Criada pela Academia Cordisburguense de Letras, a Semana Roseana foi ganhando, ao longo do tempo, novos parceiros e públicos. Hoje uma realização da Secretaria de Estado da Cultura, com a Superintendência de Museus, Prefeitura de Cordisburgo e o Museu Casa Guimarães Rosa, o evento reúne, a cada ano, entre 4 mil e 5 mil pessoas.

Espaço central do evento, o museu-casa (onde o escritor nasceu e viveu sua infância) conta com acervo de 700 documentos. Mas, para boa parte do público que o visita, o interesse está em objetos que pertenceram a Rosa. “Na parte central está a sala Corpo de Baile, onde fica sua máquina de escrever. Há a reconstituição de seu diploma de posse na Academia Brasileira de Letras, bem como a espada que acompanhava o fardão”, comenta Ronaldo Alves de Oliveira, que coordena o museu desde 2006. Inaugurado em 1974, o Museu Casa Guimarães Rosa recebe, anualmente, 30 mil visitantes.

Nas pegadas do mestre

Durante a Semana Roseana também será apresentado ao público o projeto Cartografia Roseana: Guimarães Rosa, sob a perspectiva da preservação, salvaguarda cultural e inclusão produtiva. Iniciativa de professores do Instituto de Geociências da UFMG, tem como foco os municípios de Cordisburgo e Morro da Garça. Distante 130 quilômetros de Cordisburgo, foi visitada por Guimarães Rosa quando era não mais do que uma vila. Virou cenário do conto O recado do Morro (de Corpo de baile).

O projeto vai mapear o patrimônio material e imaterial do sertão presente na literatura roseana. O objetivo é criar uma rota cultural nas duas localidades. “Queremos fortalecer essa rota nos dois municípios, onde diversas ações culturais e turísticas são realizadas, como a Semana de Cultura, as Caminhadas Ecoliterárias, os Caminhos do Rosa, além da Semana Roseana.
Temos um território que se especializa no segmento de turismo literário com qualidade de excelência em suas apresentações e realizações que merece e necessita ser divulgado e apoiado”, comenta uma das coordenadoras do projeto, Diomira Maria Faria, professora de turismo da UFMG.

Além da apresentação do projeto, os envolvidos na Cartografia Roseana (que reúne tanto professores quanto alunos da UFMG) vão, a partir de amanhã, fazer uma pesquisa para conhecer o perfil do visitante da Semana Roseana. Ainda estão programadas visitas às comunidades de Lagoa Bonita (Cordisburgo) e Campo Alegre (Morro da Garça). “A ideia é conversar com as pessoas, conhecer seus saberes e fazeres e, muito importante no contexto de nossa metodologia de trabalho, realizar uma oficina com os jovens das escolas rurais para construirmos juntos a cartografia”, acrescenta Diomira.

Até agora já foi realizado levantamento sobre o patrimônio dos dois municípios. Com um grupo de estudantes, os responsáveis pelo projeto foram em maio aos locais para entrevistar lideranças locais. “O patrimônio material foi devidamente georreferenciado, etapa fundamental para elaborar uma cartografia”, finaliza Diomira.


28ª SEMANA ROSEANA
De amanhã a sábado, em Cordisburgo.
Veja a programação completa em www.cordisburgo.mg.gov.br.