As autoras, convidadas pelo Espaço Literário do Itaú Cultural, para participar do debate cujo tema seria “De onde escrevo”. Bastaram as primeiras perguntas para a temática se transformar, positivamente. Representatividade de raça, feminismo e diversidade de gênero, em especial a ausência destes assuntos na programação oficial dominaram as cerca de duas horas de conversa na charmosa casa no centro de Paraty.
Uma saia justa para o curador do evento, Paulo Werneck, que estava na sala e, visivelmente constrangido com as críticas, assumiu o erro. “Meu lugar de fala aqui é complicado. Estamos aqui para ouvir. Dialogar mas reconhecemos esta falha”, disse antes de pedir ajuda às autoras na indicação de escritores negros para estarem no radar da organização da Flip.
A Flip 2016 tem sido chamada de “Arraiá da Branquidade”.
“O que se percebe é que sempre nos é dado uma cidadania lúdica. Dar visibilidade a cantores e atletas negros é estar no lugar comum. Queremos ver pessoas negras colocadas como intelectuais, professores, escritores. Essa cidadania lúdica não nos interessa”, protestou.
A fala da professora, que este ano lança o livro Histórias de leves enganos e parecenças, foi apoiada pelas companheiras de mesa. Ana Maria Gonçalves destacou que os negros estão ausentes não apenas da programação oficial, mas também nas plateias. “Enquanto não pensar em como atrair públicos diversificado não sairemos deste lugar”.
A escritora paraibana Maria Valéria Rezende, que é branca, reforçou a fala das colegas. Ela destacou a cristalização de práticas sociais que ainda reforçam o racismo e chamou a atenção para a desordem que enfrentamos. “Está tudo muito perturbado.
Vivemos um momento de tudo fora de lugar. Temos que estar alerta para quando organizarmos, não colocarmos nos mesmos lugares”, disse como uma cobrança de mudança social.
“A questão racial do Brasil não é para o negro resolver: é para o brasileiro”, sustentou Conceição Evaristo. Para ela, o crescimento do debate em torno do tema revela momento importante da nossa história. “Talvez estejamos perdendo um pouco do nosso cinismo. Perdemos o medo de colocar o dedo na ferida”, completou.
A repórter viajou a convite do Itaú Cultural.