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BH vai receber Mondrian e o movimento De Stijl, nascido nos Países Baixos após a Primeira Guerra

Artista propunha a criação de uma nova cultura unindo arte, arquitetura e design

Walter Sebastião
A Primeira Guerra Mundial (1914-1918) deixou profundas marcas em todo o mundo e, em especial, no território europeu.
As divergências sobre o direito de exploração das colônias vão arrastar todos os países para o conflito. Generalizadas, as batalhas destroem campos agrícolas, indústrias e, estima-se, deixam 10 milhões de mortos. Pesando neste último aspecto e ampliando a letalidade do confrontos, está o desenvolvimento da industria bélica – o lança-chamas e a granada “estreiam” nessa guerra. “Foi a primeira fez que a humanidade perdeu a razão”, observa Pieter Tjabbes, um dos três curadores (os outros são Benno Tempel e Hans Janssen) da mostra Mondrian e o movimento De Stijl, que vai ser apresentada no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) de Belo Horizonte, de 20 de julho a 26 de setembro.

Pieter Tjabbes recorda a guerra para explicar que o conflito teve impacto e provocou reflexões éticas e morais para a vida cultural e artística. Os dadaístas, exemplifica, vão defender que a sociedade que gerou e promoveu tal tragédia não pode abrigar arte. E, com palavras e atos, propuseram a destruição completa de todos os conceitos que fundamentaram sociedade fratricida.

Os alinhados ao movimento De Stijl (O Estilo), tema da exposição, vão argumentar a favor de perspectiva diferente: “A solução era oferecer à humanidade instrumentos para construir um mundo distinto daquele que levou à catástrofe. Não bastava apenas uma nova arte, mas era necessário criar uma nova cultura”, explica Tjabbes.
“Eles  propuseram uma linguagem, que chamam de neoplasticismo, destituída de tudo que fosse supérfluo, que procurava ficar o mais próximo possível do que era essencial”, continua Tjabbes.

Construídos com linhas horizontais e verticais, espaços abertos, assimetrias, cores primárias (vermelho, amarelo e azul) e não cores (preto, branco e cinza) chapadas, os trabalhos buscam comunicação clara, organizada e universal. São as criações movidas por essa mirada e o impacto delas e das ideias que carregam na história da arte, explica o curador, que vão estar na mostra. São pinturas, mobiliário, projetos gráficos e arquitetônicos e fotos criados por articulação de artistas, arquitetos e designers que, entre 1917 e 1928, propuseram a construção de um novo mundo.

“A intenção era criar uma linguagem que todas as artes poderiam utilizar, cercando o ser humano, por todos os lados, de um novo modo de pensar”, explica o curador. “Como profetas, os integrantes do movimento passaram a difundir sua proposta”, conta, recordando que se trata de uma utopia que entre suas referências tem, inclusive, doutrinas religiosas (a teosofia). “De Stijl desde o início atraiu mentes abertas”, frisa o curador. Lembra, por exemplo, que, desde o início da empreitada, a turma cultivou diálogo intenso da arte com a arquitetura e o design. O nome da revista De Stijl, observa Tjabbes, não quer dizer um, mas “o” estilo. Ou seja: para o neoplasticismo, não haveria outro caminho além do proposto por eles.

MONDRIAN

Piet Mondrian (1872-1944) foi criador do termo neoplasticismo e fundador do De Stijl, em que foi particularmente ativo entre 1917 e 1928. Integra-se ao movimento em 1917, já então artista consagrado. Ele chega à abstração depois de caminhada simplificando cada vez mais a figuração, em busca de concentração nos valores estruturais da linguagem plástica. Ao final da vida, vai romper com o movimento, quando Theo van Doesburg (1883-1931), o principal ativista e articulador do grupo, admite o uso de diagonais, já que considerava as linhas retas essenciais à proposta.

“As obras de Mondrian têm, até hoje, um frescor que outras peças históricas não têm. Ele tem boas pinturas em todos os momentos de sua carreira”, observa Pieter Tjabbes. Mondrian e o movimento De Stijl traz 30 pinturas do artista pontuando todas a fases de sua carreira, vindas do Museu Municipal de Haia.
É a maior de Mondrian já realizada no Brasil. A onipresente referência à visualidade da fase abstrata do mestre holandês, para o curador, tem explicação: “Talvez eles tenham chegado mesmo a uma linguagem universal”, suspeita. O curador avisa que está na exposição outro representante ilustre do movimento: o designer (“e de fato um marceneiro”) Gerrit Rietveld (1888-1964).

A exposição, conta Tjabbes, não foi fácil de organizar, já que, por serem peça frágeis, as instituições não gostam de ceder as obras. Se existiu desconfiança do circuito internacional de arte com relação à capacidade de o Brasil receber exposições históricas, devido às condições precárias das instituições, hoje a questão está superada . O curador foi um dos organizadores da mostra A magia de Escher, que fez sucesso no Brasil, incluindo Belo Horizonte. “O público brasileiro tem menos informação sobre arte, mas tem entusiasmo maior. É mais aberto do que o público europeu, que, por já ter visto muita coisa, é muito blasé”, compara. Considera que o Brasil merece, mas ainda não recebeu, exposição ampla dedicada à pop art..