Amor tempos digitais: conheça os prós e os contras

Se a web revolucionou o mundo, com as relações não seria diferente. Namorar ou paquerar na era virtual exige uma etiqueta própria, que envolve muitas facilidades, mas pode também provocar ciladas

por Gláucia Chaves 11/06/2017 06:50

Carlos Vieira/CB/D.A Press
Graças à internet, Átila Arantes e Mariane Weizenmann estão juntos: casal se conheceu no extinto Orkut, há 10 anos (foto: Carlos Vieira/CB/D.A Press)

É só o crush ficar on-line que o coração começa a bater mais forte. Todos os dias, a rotina inclui um passeio por todas as redes sociais da pessoa amada – a famosa “stalkeada”. O sonho de quem paquera pela internet não é só ter um relacionamento, mas ser “shippado” pelos amigos. A internet mudar a forma de paquerar não seria uma exceção.

Não é de hoje que os solteiros buscam na internet uma forma de conhecer alguém especial. Dos tempos do bate-papo até os modernos aplicativos de encontros, a web é uma ferramenta que pode não só facilitar a vida dos tímidos, como ajudar a encontrar pessoas com gostos parecidos, aumentando as chances de o romance vingar. Para os neurotransmissores, a fase da conquista é extremamente benéfica, graças à ação da dopamina e da ocitocina, responsáveis pela motivação, confiança e criação de laços afetivos, segundo a psicóloga Lia Clerot.

Naturalmente, a rede também tem seus lados pouco positivos. Ciúme em excesso, obsessão, distanciamento físico do par, tudo isso entra na lista de possíveis efeitos colaterais da vida amorosa on-line. “O uso das redes sociais é benéfico porque acaba aproximando pessoas que estão longe e faz com que o seu círculo social aumente. Contudo, acho que é preciso ter cautela na utilização, como tudo na vida”, reforça a psicóloga. “É muito comum ver casais sentados em um restaurante, os dois com celulares em punho e sem trocar uma palavra sequer. Nesse caso, os resultados podem ser desastrosos.”

Às vésperas do Dia dos Namorados, o Bem Viver tenta entender como funciona a conquista em tempos de conectividade – como a rede tem influenciado o ciúme, o namoro e o caminho até a cara-metade?

PAPEL DE CUPIDO

 

Em algumas histórias, o mundo virtual pode fazer papel de cupido e proporcionar o que não seria possível na vida real. Muitas vezes, as rotinas vividas e os lugares frequentados podem dificultar o encontro de alguém que poderia ser especial. No caso de Mariane Weizenmann, de 24 anos, e Átila Arantes, de 29, a rede social proporcionou, há 10 anos, que os dois se conhecessem por acaso, em uma brincadeira feita quando uma amiga de Mariane visitou a página de Átila no extinto Orkut.

“O Orkut, na época, ajudava no monitoramento. Podíamos ver quem havia visitado nossa página e checar o perfil dessa pessoa. Foi em uma dessas que conheci a Mariane”, lembra-se Átila. O dentista conta que uma amiga da namorada visitou sua página na rede social e, ao começar a conversar com ela na própria página, Mariane entrou na brincadeira. “Tínhamos costume de entrar no perfil de quem tinha nos visitado e mandar uma mensagem no painel de atividades. Foi em uma conversa dessas que a Mariane apareceu e começou a conversar também.”

A partir daí, Átila e Mariane começaram a se interessar um pelo outro. “Eu estava na 8ª série. Conversávamos muito pelo Orkut e ele acabou pedindo meu telefone. Depois, descobrimos que frequentávamos vários lugares em comum, mas nunca havíamos nos esbarrado”, comenta Mariane. Para ela, a rede social ajudou os dois a se conhecerem um pouco mais e a perder a timidez. “Eu participava de mais de 500 comunidades. Ele olhou cada uma para me conhecer melhor. Quando nos encontramos pela primeira vez, ele levou um presente com várias coisas de que eu gostava.” Depois da primeira interação na rede social, o casal demorou uma semana para se encontrar. “Eu a estudei. Sabia tudo do que ela gostava e comecei a usar isso para agradá-la. Foi bom porque já tinha meio caminho andado”, brinca Átila.

O casal acredita que não teria se conhecido sem o contato com a internet. “Pela diferença de idade, nossas vidas e rotinas eram um pouco diferentes. Um encontro seria difícil. Acho que o Orkut nos uniu”, diz Átila. Para Mariane, ter o contato com a rede social antes do primeiro encontro foi essencial para criar confiança. “Quando nos encontramos, a conversa fluía, porque sabíamos que um tinha interesse pelo outro. Já nos conhecíamos um pouco.”

 


Ciúme de você

Marcelo Ferreira/CB/D.A Press
Noivos, Junior Souza e Geyza Silva optaram por excluir as contas individuais das redes sociais e criaram uma conjunta: "Ciúme não passa aqui", diz ela (foto: Marcelo Ferreira/CB/D.A Press)

Para evitar possíveis problemas causados por conta das redes sociais, o casal Geyza Silva, de 23 anos, e Junior Souza, de 21, optou pelo uso de uma conta conjunta no Instagram. Desde a primeira semana de namoro, os dois excluíram todas as contas individuais que tinham e criaram uma única para o casal na rede social. Hoje, noivos, os dois acreditam que a iniciativa contribuiu para a durabilidade do relacionamento.

“Tomamos essa decisão baseados em experiências passadas, que acabaram sendo desagradáveis. Temos o mesmo estilo de vida e os mesmos gostos, então, não vejo problema nesse compartilhamento”, diz Junior. A conta foi criada, inicialmente, para que ele tivesse visibilidade nas competições de fisiculturismo, mas, depois de um tempo, tomou um rumo diferente. No Instagram, o casal posta fotos contando o dia a dia, as idas à academia e as declarações de amor. “Nós dois temos a senha e, normalmente, postamos quando estamos juntos”, comenta Geyza.

Para o casal, essa é uma boa forma de interação entre si e com os amigos. “Acaba que sabemos quem nos segue e que as curtidas são para os dois”, diz o noivo. Eles garantem que não sentem falta da individualidade. “Eu brinco que, se estamos juntos até hoje, é porque temos essa conta. Ciúme não passa aqui”, fala Geyza. Para Junior, o ciúme e o monitoramento são coisas que podem ser evitadas no comportamento do dia a dia. “Nossas ações e a forma como lidamos com as coisas têm muita importância.”

CRISE DE INSEGURANÇA O ciúme entre casais não é algo necessariamente novo, mas a internet trouxe formas diferentes de experimentar o sentimento. A insegurança, para a psicóloga Lia Clerot, é a mãe do controle. “O parceiro que é inseguro acaba tendo sérios problemas de autoestima e isso, muitas vezes, precisa de ajuda profissional já que a pessoa, geralmente, não enxerga o próprio problema”, alerta. “Ao tentar atingir estereótipos muitas vezes inatingíveis que se vê nas redes sociais, as pessoas podem acabar tendo uma insatisfação crônica, por não ter a vida perfeita, o que, para o ciumento, pode desencadear em uma crise de insegurança e autoestima.”

Mario Louzã, psiquiatra e membro filiado do Instituto de Psicanálise da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, acredita que o acordo entre o casal é o ponto de partida para um relacionamento saudável. Se bem firmada na vida real, a combinação tende a se expandir com segurança no mundo virtual, segundo Louzã, mesmo com as tentações da internet. 

Mas e o perfil de casal é uma alternativa à possessividade excessiva? Para Louzã, pode ser uma aliança, “que representa, ao mesmo tempo, o compromisso entre ambos e que também ‘avisa’ que tal pessoa está comprometida”. Já o psicólogo Vladimir Melo, especialista em terapia conjugal e familiar, não vê o perfil conjunto como uma forma efetiva de diminuir o ciúme. “Em primeiro lugar, isso demonstra a falta de confiança entre os dois. E reforça a ideia de controle de um sobre o outro, o que pode se tornar um problema maior na relação.”

Para o psicólogo, casais que aderem ao perfil duplo tendem a começar a exercer ainda mais controle sobre o(a) outro(a), o que pode ser um impeditivo para a individualidade. “Com isso, essa dinâmica acaba sufocando ambos os cônjuges e criando clima de desgaste.”

* Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte