Terapia em locais tidos como sagrados pelo poder da natureza ganha adeptos pelo mundo

Sessão de terapia ao ar livre em lugares com a força da Amazônia, Jalapão, Caraíva e Moeda é uma forma de voltar às origens e fluir para o que temos de mais íntimo, que é o nosso inconsciente

por Lilian Monteiro 24/04/2017 13:00
Arquivo Pessoal
Um grupo desembarcou na Amazônia, onde o contato com a floresta, os animais e o rio foi uma experiência riquíssima (foto: Arquivo Pessoal)

Como a natureza influencia na terapia? Quem dá a resposta é a psicoterapeuta Solange Rolla, especialista em constelação familiar, que desenvolve um trabalho associando a terapia com a natureza em locais considerados sagrados pelo poder do meio ambiente. “Estar na natureza é voltar para casa, é entrar em contato com a nossa origem. Afinal, somos todos parte dela. E estar de volta às origens nos convida a relaxar, a diminuir nossas defesas, a nos despir das roupas sociais e a voltar para o campo da nossa intimidade. Assim, fluímos para o que temos de mais íntimo, que é o nosso inconsciente.”

 Nesse ambiente, a psicoterapeuta explica que as pessoas entram em uma dupla imersão, na natureza e no inconsciente, atravessando caminhos, riachos e florestas, e assim vão atravessando medos, frustrações e conflitos interiores, trazendo para a consciência ocasiões/sentimentos até então esquecidos ou nunca sabidos, que a princípio afloram como um obstáculo, uma dor, uma vergonha, uma culpa, uma mágoa, um ódio, uma tristeza, uma impotência. “E então, no colo da mãe natureza, realizamos uma constelação e buscamos força, amor, misericórdia e autoestima. É claro que, como tudo na natureza, esse é um processo que ocorre em uma crescente, a cada encontro aprendemos e descobrimos um pouco mais sobre nós, a cada mergulho um novo fruto, uma nova flor desabrocha na nossa vida”, diz.

Solange Rolla conta que a terapia na natureza surgiu de maneira inesperada. “Em uma viagem de lazer com um grupo de amigas na Serra do Cipó, enquanto caminhávamos às margens do rio uma amiga me apresentou uma forte questão, como se o barulho das águas e a correnteza despertassem nela o desejo de liberar o que tanto a incomodava. Foi naquele momento que fiz minha primeira constelação na natureza. Percebi o quanto as pessoas se liberavam mais e se conectavam mais com seus sentimentos. O resultado foi surpreendente, simples e muito forte.”

A partir daí, Solange passou a trabalhar também além das quatro paredes e em contato com a natureza. Começou a formar grupos conciliando o descanso da viagem, usufruindo o potencial turístico, associado aos movimentos terapêuticos das constelações. As primeiras experiências foram no Sítio Sertãozinho, na Serra da Moeda, e continuam até hoje devido aos benefícios alcançados e relatados. “Assim, ampliamos a experiência para outros destinos. Em 2014, fizemos o primeiro grupo fora de Minas Gerais, fomos para Caraíva, praia no Sul da Bahia. Foi tão encantador que dali mesmo já saímos com a ideia de um novo grupo, que ocorreu em Sergipe, em 2015, em uma praia de Aracaju, e nos Cânions do Rio São Francisco. No ano passado, fomos para as maravilhosas águas do deserto do Jalapão, em Tocantins, no coração do Brasil.” Nessas viagens, ela conta que muitos maridos, mulheres e amigos decidem acompanhar o grupo com o intuito de passear. “O que favorecia momentos de lazer, marcados por alegria e descontração. No entanto, nos momentos de constelação vinham os choros necessários para deixar sair as dores. Com todas essas experiências, aprendemos a cuidar das nossas dores, estar em contato com elas e ao mesmo tempo usufruir das maravilhas da natureza, da vida, dos amigos, da família, da boa comida e da alegria.”

AMAZÔNIA


Depois do Jalapão, Solange formou um grupo que desembarcou na Amazônia. “Um lugar sonhado por muitos, a selva amazônica com inúmeras outras riquezas, a floresta, os animais, o rio. O que nos fez ver que a expressão ‘mãe natureza’ faz todo o sentido. O resultado foi além do esperado. Em 5 de junho, vamos para Cuiabá iniciar nova jornada para mais um espetáculo da natureza: mergulhar nas águas de Nobres, Bom Jardim (MT).” Ela enfatiza que “fazer o movimento de cuidar das nossas dores e dificuldades não significa que é preciso ficar mergulhado na tristeza, na angústia. Significa que posso viver minhas dores e ao mesmo tempo viver bons momentos e alegrias. Além disso, fazemos novos e especiais amigos, pois fazer uma jornada dessa em grupo cria uma sintonia de alma que permanece”.

Arquivo Pessoal
No ano passado, o grupo participou da constelação no deserto do Jalapão, em Tocantins, coração do Brasil (foto: Arquivo Pessoal)

E quais seriam os resultados da terapia associada à natureza? Solange enfatiza que a integração com a natureza nos faz sentir melhor, pode reduzir o estresse. “O cheiro da mata, o barulho das águas de uma cachoeira, o canto dos pássaros, a busca perfeita pelo equilíbrio entre o corpo e a mente. Inclusive, cientistas de diversos países — como Holanda, Reino Unido e Japão — perceberam que, ao entrar em contato com o verde, o corpo logo responde, de forma sutil, com pressão mais baixa e maiores níveis de glóbulos brancos (responsáveis pelas defesas do organismo). Mas os pesquisadores admitem que os efeitos são sutis, e que, dependem da personalidade de cada um. Já fiz constelação dentro do rio, nos pés de uma árvore imponente que parecia nos abraçar, na cabana de uma tribo indígena, enfim, em locais que nos inspiram e que despertam no ser humano o desejo de ser uma pessoa melhor.”

Solange Rolla afirma que, assim como todo processo terapêutico, a constelação na natureza é aberta a todo público. Além disso, é possível fazer essas viagens com familiares (marido, esposa, irmãos, filhos) sem que eles tenham que participar das constelações. O que muitas vezes é uma forma de agregar interesses diferentes em uma só oportunidade. São requisitos gostar de estar em contato com a natureza e de viajar.

DEPOIMENTOS
• Cibele de Menezes Mascarenhas, de 56 anos, assistente social


“O contato com a natureza faz com que a nossa energia seja mais pura, nos desperta de maneira diferente. Ceio que conseguimos entrar mais em sintonia com os nossos sentimentos, o que contribuiu para o nosso autoconhecimento, nos ajudando assim a lidar com nossas dificuldades, traumas e medos. Sempre busquei me conhecer um pouco mais, saindo do campo racional e intelectual, pois somos muito mais que apenas razão e teorias e acredito que a constelação na natureza traz efeitos mais plenos como resultado de uma terapia. Tanto no Jalapão como na Amazônia, percebi que minha entrega foi maior, assim como a minha busca pelo autoconhecimento e meu aprendizado sobre mim mesma. Sobre como lidar com as surpresas que a vida nos apresenta, sem se preocupar com o julgamento das pessoas. Estou mais tranquila, menos ansiosa, enfim, sendo mais feliz. Além disso, consequentemente, conhecemos outras pessoas, compartilhamos experiências, muitas vezes comuns, e até mesmo formamos um ciclo de amigos. Sinto que evoluí nessa caminhada, para enfrentar melhor os desafios da vida, com muito mais serenidade e amorosidade.”

• Iara Marques, de 57 anos, engenheira eletricista

“A constelação na natureza é uma forma de terapia diferenciada, que quebra a rotina e nos permite desligar completamente dos afazeres e dos compromissos que sempre circundam nossa mente e nosso dia a dia. Estamos entregues àquele momento de forma única e em um local de uma beleza natural que nos transforma, nos move. Para mim, esta é uma proposta inovadora, uma oportunidade de resgatar nosso contato com a natureza e de associar fatores que só nos fazem bem. Acredito que nos sentimos mais livres, com a mente mais aberta e com mais disposição para fazer com que as energias possam fluir, sem interferências ou até mesmo ruídos urbanos. Muitas vezes esquecemos que fazemos parte da natureza devido à nossa rotina e a vida sempre atribulada. O fato de estarmos em contato diretamente nos faz relembrar as nossas origens. Nos desvinculamos da nossa rotina e nos entregamos ao processo de forma mais plena, além das quatro paredes.”