Orégano é um ótimo conservante para alimentos

Pesquisadora testa ação de diversas ervas que têm capacidade antioxidante com o intuito de usá-las para preservar características dos alimentos. Estudo foi feito em produtos à base de carne de carneiro

por Eduardo Tristão Girão 21/05/2016 08:38
Rafaella Fernandes/Divulgação
Hambúrgueres de cordeiro foram conservados com o extrato de orégano, sendo avaliados os aspectos físico-químicos, sensoriais e microbiológicos (foto: Rafaella Fernandes/Divulgação)
O orégano que o brasileiro conhece tornou-se sinônimo tão automático daquelas folhinhas secas, lacradas num envelope, para pôr na pizza, que é difícil pensar em outra aplicação para esta erva. Pois a pesquisadora Rafaella de Paula Paseto Fernandes, da Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos da Universidade de São Paulo (FZEA/USP), em Pirassununga, fez dele tema de sua tese de doutorado e descobriu que seu extrato natural tem propriedades antioxidantes quando usado em produtos à base de carne de carneiro. O orégano substituiria, portanto, os tão criticados conservantes artificiais.

“A pesquisa foi motivada pela maior preocupação do consumidor com sua saúde e, consequentemente, a procura por uma dieta mais saudável, com menor teor de aditivos sintéticos. Realmente, hoje existe uma grande tendência por alimentos mais saudáveis, além de maior exigência por melhor qualidade, tanto nutricional quanto sensorial”, diz Rafaella. Parte da pesquisa dela foi publicada no início deste ano nas revistas internacionais Food Control e Journal of Food Science and Technology.

A primeira etapa consistiu na avaliação da capacidade antioxidante dos extratos de 13 espécies vegetais, aplicados a hambúrguer congelado e linguiça cozida, ambos feitos com carne de carneiro. As amostras foram comparadas a outras tratadas sem antioxidante (controle) e com antioxidante sintético (eritorbato de sódio ou BHT). Esses produtos foram avaliados durante armazenamento, respectivamente de 120, 135 e 200 dias, a partir de análises físico-químicas, sensoriais e microbiológicas.

Orégano, manjerona, melissa e alecrim foram os extratos selecionados por sua capacidade antioxidante e por não ter comprometido a aceitação sensorial em relação ao eritorbato de sódio. Os produtos cárneos tratados com extratos naturais apresentaram efeitos antioxidantes equivalentes em relação aos que tiveram acréscimo de antioxidantes sintéticos. Não foi comprometida a maioria dos parâmetros físico-químicos, microbiológicos e sensoriais dos produtos analisados.

Arquivo pessoal
Motivação do estudo de Rafaella Fernandes foi a crescente preocupação das pessoas com a alimentação saudável, livre de aditivos sintéticos (foto: Arquivo pessoal)

DESAFIO
Na pesquisa, Rafaella aponta o extrato de orégano como alternativa viável aos conservantes sintéticos, além de destacar a vantagem de ser um produto mais saudável. Entretanto, apesar de outros extratos já estarem disponíveis para utilização em alimentos, nenhuma empresa ou entidade demonstrou interesse pelo experimento dela até o momento.

“A maior dificuldade seria a produção em escala industrial. O extrato é obtido por método convencional de extração, a partir de trituração, agitação, centrifugação, filtração, concentração, liofilização e ressuspensão em água. São várias etapas com temperatura, tempo e pressão controlados que devem ser seguidos para que se tenha a mesma eficiência. Qualquer alteração nos parâmetros pode reduzir a atividade dos compostos e, neste caso, é imprescindível que o desempenho dos extratos seja periodicamente comprovado”, diz ela.

Intitulado “Uso de extratos antioxidantes naturais obtidos de ervas aromáticas na elaboração de produtos à base de carne ovina”, o estudo foi iniciado em 2011 e concluído no ano passado, com orientação da professora Mariza Pires de Melo e corientação do professor Marco Antonio Trindade, ambos da FZEA. Teve financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

Rafaella Fernandes/Divulgação
Extratos naturais de ervas produzidos em laboratório: foram testados, além do orégano, a manjerona, a melissa e o alecrim (foto: Rafaella Fernandes/Divulgação)


MAIOR APROVEITAMENTO E RENTABILIDADE NO SETOR

Para o hambúrguer, a pesquisadora Rafaella Fernandes elegeu a carne de cordeiro e para a linguiça, a de ovelha. A escolha dos cortes ovinos, explica ela, deve-se sobretudo ao fato de seu consumo no país ainda ser baixo. “Além do incentivo ao maior consumo, o intuito é aumentar a rentabilidade no setor e também demonstrar a possibilidade de um maior aproveitamento da carcaça, a partir do uso de cortes que não são comercializados in natura pelo fato de não apresentarem características qualitativas desejáveis como de cortes nobres e animais jovens”, completa.

Foram utilizados cortes de pescoço e retalhos de desossa de cordeiros e cortes de ovelhas de descarte para a elaboração dos produtos cárneos. “O aproveitamento da carcaça desta espécie animal infelizmente ainda é bastante limitado”, acrescenta. As carnes citadas têm baixo valor comercial, de maneira que a utilização de um extrato natural como o do orégano tem como objetivo viabilizar a destinação delas por meio do apelo da alimentação saudável.

Sobre a utilização desse tipo de extrato em carnes de outras espécies animais, Rafaella esclarece que ainda não foram feitos testes nesse sentido. “Provavelmente, teriam um comportamento diferente devido à composição química e, principalmente, ao perfil de ácidos graxos. Apesar das variações quanto ao grau e tempo para ocorrência da rancificação, acredito que, mesmo assim, seriam obtidos resultados equivalentes ao antioxidante sintético”, avalia.

Conserva e tempera
Além da função oxidante, o extrato de orégano testado pela pesquisadora Rafaella Fernandes, de quebra, condimentou os produtos cárneos que levou para o laboratório. “Erva antiga e bastante conhecida, o orégano não pode faltar na cozinha. Neste estudo, a erva deu sabor e aroma diferenciados. Acredito que esse extrato possa apresentar intensidade variável, dependendo da matriz alimentícia em que é aplicado”, diz ela.